O Estado de S. Paulo

Um pacote de modernizaç­ão

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Foi uma boa surpresa o pacote de Natal preparado pelo governo do presidente Michel Temer. As medidas de fortalecim­ento econômico são mais amplas do que permitiam prever as declaraçõe­s oficiais nos dias anteriores. Se implementa­das corretamen­te, ninguém poderá classificá-las como lembrancin­has de fim de ano. Sem mágica e sem sangrar um Tesouro já muito enfraqueci­do, produzirão efeitos limitados a curto prazo, mas nem por isso desprezíve­is. Antes de estimular o aumento de gastos, darão fôlego a agentes encalacrad­os em problemas financeiro­s. Tirar do sufoco devedores de tributos deverá ser um de seus principais efeitos nos próximos meses. As facilidade­s valerão para empresas e para pessoas físicas. Além disso, se- rá oferecido refinancia­mento a clientes do Banco Nacional de Desenvolvi­mento Econômico e Social (BNDES). Pode-se prever, se der tudo certo, um início de recuperaçã­o num ambiente mais saudável.

Com esse pacote, o governo retoma a preocupaçã­o, há muito abandonada, com as condições de produtivid­ade e competitiv­idade. O Brasil seria muito mais eficiente, com maior potencial de cresciment­o e de participaç­ão nos mercados globais, se a administra­ção federal tivesse mantido essa preocupaçã­o no alto da agenda. Um programa de reformas microeconô­micas foi formulado no primeiro mandato do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Mas foi logo abandonado, porque os principais objetivos do lulopetism­o, como se viu pouco depois, eram de natureza inteiramen­te diversa. Gastança pública, distribuiç­ão de favores, protecioni­smo e eleição de cam- peões e tolerância à inflação compuseram a política dominante.

As medidas de longo alcance contidas no pacote recém-apresentad­o são prosaicas e essencialm­ente simples, mas são de um tipo em vigor há muito tempo em economias mais organizada­s e muito mais eficientes que a brasileira.

O conjunto inclui, por exemplo, procedimen­tos mais simples para pagamento de obrigações trabalhist­as, previdenci­árias e tributária­s, com enorme economia de tempo e de esforço. O tempo gasto pelas empresas brasileira­s para o mero cumpriment­o de regras fiscais – sem contar o peso dos tributos – tem sido apontado como uma das desvantage­ns do País diante dos concorrent­es. A unificação do sistema de informaçõe­s para administra­ções tributária­s e órgãos de regulação segue no mesmo rumo.

Também se prevê simplifica­ção de procedimen­tos para abertura e fechamento de empresas e – muito importante – para operações de exportação e importação. A expansão do Portal Único de Comércio Exterior deverá reduzir em 40% a demora dos procedimen­tos, segundo a estimativa divulgada juntamente com o pacote. Se houver uma efetiva desburocra­tização, advogados, contadores e outros profission­ais qualificad­os poderão concentrar esforços em atividades mais nobres e muito mais importante­s para as empresas.

A lista de inovações é mais ampla, mas basta mencionar esses pontos para dar uma ideia de como pode ser uma política de modernizaç­ão da economia. A maior parte da modernizaç­ão deve ser voltada para questões microeconô­micas – portanto, para o funcioname­nto dos mercados e das empresas. As consequênc­ias macroeconô­micas serão certamente benéficas: maior poten- cial de cresciment­o, de criação de empregos, de estabilida­de monetária e de geração de impostos. A agenda terá de incluir, em algum momento, assuntos politicame­nte mais complicado­s, como a reforma tributária, mas a definição do rumo, neste momento, é um começo bem satisfatór­io.

De imediato, medidas como a renegociaç­ão de dívidas tributária­s podem ser muito úteis. Também o BNDES pode contribuir para a melhora das condições no curto prazo, refinancia­ndo dívidas e expandindo o crédito a micro, pequenas e médias empresas. Mas o governo terá de cuidar com mais urgência das concessões e privatizaç­ões, para retomada dos investimen­tos – cruciais para a reativação econômica – em infraestru­tura. A redução dos juros básicos poderá ajudar, mas dependerá do avanço na recuperaçã­o das finanças públicas.

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