O Estado de S. Paulo

Haddad desvincula R$ 315 milhões em receitas para fechar a gestão ‘no azul’

Do montante tirado das funções originais, o maior valor diz respeito ao Fundo Municipal de Desenvolvi­mento de Trânsito. Para especialis­tas, manobra é juridicame­nte questionáv­el; Prefeitura diz que utilizará apenas juros dos recursos de fundos

- Adriana Ferraz

O prefeito Fernando Haddad (PT) desvinculo­u R$ 315 milhões de fundos municipais e contas abastecida­s com a venda de títulos imobiliári­os para socorrer o caixa geral da Prefeitura e fechar o ano “no azul”. Oficializa­da em decreto, após autorizaçã­o concedida pelo Senado, a medida tem criado questionam­entos jurídicos por envolver recursos de capital carimbados, como de operações urbanas. A gestão defende a medida.

Do montante desvincula­do das funções originais, o maior valor diz respeito ao Fundo Municipal de Desenvolvi­mento de Trânsito (FMDT), que perdeu R$ 223 milhões. Em segundo lugar, com um total de R$ 41,8 milhões, estão as contas das Operações Urbanas Água Espraiada, Faria Lima e Centro. Desde 14 de outubro, toda essa verba pode ser utilizada para financiar obras, custear equipament­os públicos, como escolas e postos de saúde, ou mesmo subsidiar a tarifa de ônibus.

Operações urbanas são projetos de revitaliza­ção de território aprovados pela Câmara. Elas determinam que os recur- sos arrecadado­s com a venda de títulos imobiliári­os (Cepacs) devem ser investidos no perímetro afetado. “Não podem, desta forma, ser desvincula­das mediante decreto, até porque não são receitas correntes. Isso pode ser questionad­o no ponto de vista legal”, diz o advogado Adib Kassouf Sad, presidente da Comissão de Direito Administra­tivo da OAB-SP.

A Secretaria Municipal de Finanças afirma que os R$ 41,8 milhões citados são resultado de rendimento financeiro. A pasta diz não ter mexido na receita original dos recursos, o que não prejudica, na sua análise, a execução das obras previstas nas operações urbanas.

PEC. A autorizaçã­o para a Prefeitura desvincula­r parte das receitas correntes – Saúde e Educação não entram na regra – se deu em 8 de setembro, quando o Senado aprovou uma Propos- ta de Emenda à Constituiç­ão (PEC) para permitir à União usar livremente até 30% de sua arrecadaçã­o nos próximos sete anos. O aval foi estendido a Estados e municípios.

O artigo da PEC que trata dos municípios determina que as receitas a serem desvincula­das sejam relativas a impostos, taxas e multas. Para o advogado Floriano Azevedo Marques, especialis­ta em Direito Público, o decreto de Haddad é ilegal. “A PEC só torna possível a desvincula­ção. Ela não é automática nem para receitas geradas de operações urbanas nem para alguns tipos de fundos municipais, como aqueles que são constituíd­os legalmente.”

A gestão Haddad afirma que a legislação que estabelece­u a DRU é federal, cabendo ao município regulament­ar os termos. “É importante observar que não foi o decreto municipal nem a portaria 279/2016 que desvincula­ram as referidas receitas, mas a Constituiç­ão, cabendo o decreto e a portaria tão só trazer as regras para a operaciona­lização”. Ainda segundo a Prefeitura, apenas valores dos juros dos recursos de fundos serão transferid­os, descontada a correção monetária.

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MARCIO FERNANDES/ESTADÃO
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