O Estado de S. Paulo

Nomes de esmaltes

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No mês passado, fiz uma pesquisa para o The New York Times sobre nomes de esmaltes e constatei que o ápice da criativida­de humana não está mais sendo empregado em áreas como a literatura e a música, mas no batismo de tons de verniz para decorar as unhas.

Diante de uma nova cor, as empresas nunca recorrem ao Pantone ou código hexadecima­l – “achei divino aquele vermelho #ff001E” –, mas a epítetos mais poéticos como “Renda”, “Algodão Doce” ou “Pétala Branca”. Por alguma razão, isso rapi- damente desandou para nomes bizarros como “Risoto de Mandioquin­ha” (um laranja com tom de mostarda), “Pantalona de Chita” (vermelho rosado) e “Manjar de Tapioca” (nude).

Os nomes que mais me irritam trazem um leve tom condescend­ente junto com o fundo perolado. “Bom Dia com Amor”, da Colorama, é um deles, bem como “Encontro Delícia”, “Quem Nunca?” e “Ai, Amiga!”.

Lá fora, temos uma tonelada de nomes exóticos como “Fiji Weejee Fawn” (algo como Bege Fiji Ouija), “Seychelles Seashells” (Conchas de Seychelles) e “Up the Amazon Without a Paddle” (Rio Amazonas Acima Sem um Remo). Até aí, tudo bem. Mas logo a marca americana OPI achou que era uma boa ideia lançar a cor “Kiss Me, I’m Brazilian” (Me Beije, Sou Brasileira), a despeito de ser um tanto ofensiva.

Hoje em dia não há nenhum pudor em dar nomes misóginos aos vidros de esmalte. A grife Sephora by OPI tem uma coleção inteira que eu chamo de “Tons Chauvinist­as de Inverno”: inclui uma cor de maravilha chamada “Lost Without My GPS” (Perdida Sem Meu GPS) e um preto vivo de nome “What’s a Tire Jack?” (O Que É um Pneu, Jack?). A marca também é responsáve­l por “How Many Carats” (Quantos Quilates?), “I’m With Brad” (Estou com o Brad) e “Never Enough Shoes” (Nunca Há Sapatos o Bastante).

Mas eles não estão sozinhos: a marca Essie lançou “No Pre-Nup” (Sem Acordo Pré-Nupcial), “Where’s My Chauffeur” (Onde Está Meu Motorista), “Trophy Wife” e “Show Me the Ring” (Me Mostre a Aliança). A empresa China Glaze vende as cores “Man Hunt”, “Limbo Bimbo” (algo como Vadia do Limbo) e “Marry a Millionair­e” (Casese com um Milionário). A marca Debor a h L i p p mann t e m “B e f o r e He Cheats” (Antes Que Ele Traia). Uma das cores mais populares da OPI é um tom de vermelho-rubi que eles intitulara­m “I’m Not Really a Waitress” (Não Sou Exatamente uma Garçonete). E a Spoiled tem um esmalte chamado “Daddy’s Credit Card” (O Cartão de Crédito do Papai).

O Brasil não fica para trás: nós temos as cores “Deixa Beijar”, “Nunca Fui Santa”, “Me Belisca!”, “Fiu Fiu”, “Ô Meu Santo Antônio”, “Boneca de Luxo” e “Amante”, entre outros.

Como se não bastasse, no ano retrasado, a Risqué decidiu contribuir ainda mais para o movimento global antifemini­sta dos nomes de esmaltes com a coleção: “Homens Que Amamos”. O intuito era celebrar os grandes atos de nossos heroicos namorados e maridos. Há um tom laranja vivo chamado “André Fez o Jantar”, um roxo de nome “Leo mandou flores”, um cinza-escuro chamado “Zeca Chamou Para Sair” e um prateado de nome “Guto Fez o Pedido!!” (com dois pontos de exclamação). O slogan da coleção é: “O assunto número um das nossas conversas”, claro, os homens, “em seis cores que vão dar o que falar”.

É claro que tamanha criativida­de nos incentivou a sugerir para a marca uma nova coleção temática, chamada: “Arco-Íris da Repressão”. Tem o “Neblina de Lacrimogên­eo”, um branco cremoso com toques de esfumaçado; o “Pimenta Nos Olhos dos Outros”, um vermelho que dispensa explicaçõe­s; o “Noite dos Mascarados”, preto com brilho; o “Roxo de Cassetete”, que com o tempo muda de cor e fica esverdeado; e o “Constituiç­ão Brasileira”, que sai com qualquer chuvinha.

Alguns exemplos: Quantos Quilates?, Nunca Há Sapatos o Bastante, Me Mostre a Aliança

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