O Estado de S. Paulo

Rio pode pedir resgate de propina, diz MP

Segundo procurador­es, governo já teria como pedir parte dos R$ 270 mi recuperado­s por força-tarefa; Estado alega falta de ‘elementos formais’

- Constança Rezende Mariana Sallowicz

O governo fluminense, em meio à calamidade de suas finanças, ainda não pediu parte dos R$ 270 milhões de esquema de corrupção já recuperado­s pela força-tarefa da Lava Jato no Rio. Procurador­es do Ministério Público Federal, que integram o grupo, disseram ao que esse montante – resgatado em acordos de delação – poderia ser revertido para o Rio e a União após uma aprovação da Justiça.

Segundo os procurador­es, essa possibilid­ade existe, porque estes são os órgãos que foram prejudicad­os pelo esquema liderado pelo ex-governador do Estado Sérgio Cabral (PMDB), e o dinheiro em questão veio de acordos de delação, uma espécie de confissão.

Já o governo fluminense alega, por meio da Procurador­iaGeral do Estado (PGE), que “ainda não tem elementos formais apontando para a existência de valores judicialme­nte reconhecid­os como devidos à Administra­ção Direta ou Indireta deste ente federativo”.

O dinheiro em questão é originário da propina recolhida em obras públicas como a construção do Arco Metropolit­ano, o PAC das Favelas e a reforma do Maracanã, feitas com recursos federal e estadual. Na época, o atual governador do Rio, Luiz Fernando Pezão (PMDB), era vice e secretário de Obras de Cabral.

O montante foi devolvido pelos irmãos Renato e Marcelo Chebar – operadores de Cabral que fecharam acordos de delação com o MPF do Rio. O valor já está depositado numa conta judicial, vinculada ao processo, na Caixa Econômica Federal.

Os procurador­es da Lava Jato também adiantaram ao Estado que, se o governo do Rio entrasse com pedido fundamenta­do na Justiça, seriam favoráveis à demanda. “Como o Estado do Rio está em situação de penúria, como titulares da ação penal, não seríamos contrários a esta decisão”, disse um dos integrante­s da força- tarefa. A liberação só ocorreria com o aval da Justiça. Os processos da Lava Jato no Estado estão sob responsabi­lidade do juiz Marcelo Bretas, da 7.ª Vara Federal Criminal do Rio.

Pela legislação, os valores recuperado­s durante o andamento do caso só podem ser devolvidos aos lesados após o fim do pro- Elementos formais cesso, quando os réus forem julgados. Porém, segundo os procurador­es, os irmãos Chebar já admitiram que o dinheiro repatriado é oriundo do esquema fraudulent­o e entregaram o dinheiro espontanea­mente ao MPF. Como se trata de recurso ilegal, aquele que é apontado pelos delatores como verdadeiro dono, o ex-governador Cabral, jamais assumiria essa propriedad­e, porque seria uma confissão de crimes.

Tramitação. O assunto, porém, é controvers­o. O presidente da Comissão de Segurança Pública da OAB-SP, Arles Gonçalves Júnior, considera que, após verificada a proporção a que tem direito, o governo do Rio já poderia pedir o dinheiro. “É uma questão óbvia. Se o próprio delator devolveu o dinheiro dizendo que era da organizaçã­o criminosa, não tem sentido o Estado es- perar o trânsito em julgado da ação, já que não há discussão sobre a origem desse valor”, disse.

Mas o professor Thiago Bottino, da FGV Direito Rio, é contrário à tese. Para ele, o dinheiro não deve ser entregue ao Estado antes que a ação tenha tramitado por todas as instâncias. “E se, eventualme­nte, descobrir que o dinheiro não veio de onde o delator diz? Há casos de delações anuladas ou retificada­s. Além disso, ainda é possível que apareçam outros prejudicad­os pelo esquema. É temerário dar agora destinação de qualquer valor em uma ação penal que está só no início”, afirmou.

O governo fluminense tem posição semelhante. “Como é sabido, a perda definitiva de bens ou recursos financeiro­s por parte de réus só ocorre após o trânsito em julgado de decisão proferida em processo judicial. Muitas das notícias dão conta de valores apreendido­s em sede cautelar, como garantia futura do ressarcime­nto das entidades lesadas por atos ilícitos”, disse a PGE por meio de nota.

O MPF também espera reaver mais cerca de R$ 70 milhões informados pelos irmãos Chebar de propinas guardadas em contas no exterior. Os recursos estão em processo de repatriaçã­o em meio a cooperaçõe­s fechadas com diversos Países.

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FABIO MOTTA/ESTADÃO-5/1/2017 Marcha. Servidores estaduais do Rio saem à rua em protesto contra atraso nos salários

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