O Estado de S. Paulo

Mulher de Lula morre aos 66 anos em São Paulo

Primeira-dama estava internada desde a semana passada, quando foi vítima de um AVC; velório ocorre hoje em São Bernardo do Campo

- Vera Rosa Ricardo Galhardo

A primeira-dama Marisa Letícia Lula da Silva, de 66 anos, morreu às 18h57 de ontem no Hospital Sírio-Libanês, em São Paulo. A mulher do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva estava internada desde o dia 24, após sofrer um Acidente Vascular Cerebral (AVC).

O corpo de Marisa Letícia será velado a partir das 9 horas de hoje, no Sindicato dos Metalúrgic­os do ABC – local onde ela conheceu Lula, na década de 1970, em São Bernardo do Campo –, e cremado às 15 horas, no cemitério Jardim da Colina.

Desde quarta-feira, o estado de saúde de Marisa era considerad­o irreversív­el. Às 12h05 de ontem, médicos realizaram a primeira bateria de exames que indicavam sua morte cerebral. A partir de então, Lula – que nos últimos dias recebeu dezenas de visitas – ficou na companhia dos filhos, noras, netos e amigos mais próximos, entre eles a presidente afastada Dilma Rousseff. A família autorizou a doação dos órgãos.

Marisa Letícia sempre exerceu forte influência sobre Lula, com quem foi casada durante quase 43 anos. No Palácio do Planalto, quando ele tinha uma dúvida sobre qualquer assunto, ouvia a opinião de Marisa.

Discreta, mas dona de personalid­ade forte, a ex-primeira dama tentou o quanto pôde impedir que conversas sobre política invadissem os fins de semana com o marido, filhos e netos. Não era obedecida à risca, mas, teimosa, batia o pé até o fim.

“Proíbo mesmo. E também filtro ligações telefônica­s. Notícia ruim, à noite, fica para o dia seguinte”, dizia ela, conhecida por não ter “papas” na língua.

As notícias ruins, porém, começaram a se avolumar após a deflagraçã­o da Operação Lava Jato, em 2014. Lula virou réu em cinco ações penais, três das quais ligadas à Lava Jato. Em setembro do ano passado, o juiz Sérgio Moro aceitou uma denúncia contra Marisa, mas argumentou haver “dúvidas relevantes” sobre o envolvimen­to dela no “esquema criminoso” da Petrobrás.

Um mês antes, em agosto, a primeira-dama já havia sido indiciada pela Polícia Federal, ao la- do de Lula, no caso que investigou a propriedad­e de um triplex, no Guarujá. O imóvel recebeu reformas da OAS, acusada de participar da corrupção na Petrobrás.

As denúncias, no entanto, não pararam aí. Em laudo, a PF afirmou que Lula e a mulher também orientaram reformas de mais de R$ 1 milhão, pagas por empreiteir­as, no sítio de Atibaia (SP). O casal sempre negou a propriedad­e do imóvel.

Amigos relatam que, nos últimos dias, Marisa não escondia o nervosismo. Temia a prisão de Lula e de seus filhos Fábio Luiz e Luiz Cláudio. “Você dorme e não sabe o que vai acontecer no outro dia”, afirmava.

Marisa descobriu um aneurisma no cérebro em 2006. Fazia exames de rotina, mas, recentemen­te, descuidou-se da saúde. Fumava muito e levava vida sedentária, fato que lhe rendeu várias broncas de Lula, adepto dos exercícios físicos. Galega. O ex-presidente costumava dizer que a companheir­a de toda a vida tinha sido “pai e mãe” de seus quatro filhos. Chamada por Lula de “galega”, Marisa – neta de italianos – afirmava que eram cinco, já que o marido parecia uma “criança”.

Nos anos de chumbo, ela não se importava em ver sua casa transforma­da numa espécie de sucursal do Sindicato dos Metalúrgic­os de São Bernardo, que o marido presidiu. A política, ali, era a extensão da rotina familiar.

Foi Marisa quem costurou a primeira bandeira do PT, em fevereiro de 1980. “Eu tinha guardado um tecido vermelho, italiano. Costurei a estrela branca no fundo vermelho. Ficou lindo.” Eram tempos em que o PT engatinhav­a, sem escândalos, como porta-voz de dias melhores.

No primeiro mandato de Lula, Marisa mandou plantar sálvias vermelhas, desenhando a estrela do PT, nos jardins do Palácio da Alvorada e na Granja do Torto. A atitude foi definida pela oposição como “símbolo do aparelhame­nto do Estado”.

A portas fechadas, a ex-primeira-dama não escondia a contraried­ade com Dilma, sobretudo quando a então presidente lançou a candidatur­a à reeleição, em 2014. Além disso, responsabi­lizava Dilma por grande parte da desgraça que se abateu sobre o marido, o PT e sua família.

Lula e Marisa se conheceram no Sindicato dos Metalúrgic­os. Os dois eram viúvos. A mulher dele tinha morrido no parto, junto com o filho. O marido dela havia sido assassinad­o quando fazia corrida de táxi. Marisa estava grávida na época da tragédia.

A história dos dois chegou ao cinema. Lula “enrolou” o quanto pode para carimbar uma papelada levada por ela ao sindicato, necessária para receber uma pensão. Fez de tudo para ver Marisa de novo até aparecer na casa dela, a bordo de um Volkswagen TL azul turquesa. Sete meses depois, estavam casados.

A mulher que aos 9 anos foi babá e dos 13 aos 21 embalou bombons na fábrica de chocolates Dulcora também trabalhou como funcionári­a na rede municipal de ensino, mas deixou tudo para cuidar dos filhos. Queria ser professora. Chegou a primeira-dama da República.

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LEONARDO BENASSATTO/FUTURA PRESS-15/8/2016
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