O Estado de S. Paulo

‘É um tapa na cara dos que o apoiaram’

Desregulam­entação do sistema financeiro pode trazer ‘amnésia coletiva’ sobre crise de 2008, diz ex-autoridade do Tesouro

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A decisão de desregulam­entar parte das operações do sistema financeira é um “tapa na cara dos eleitores” desferido pelo presidente Donald Trump e pode representa­r um momento de “amnésia coletiva” sobre a crise de 2008, acredita Michal Barr, um dos idealizado­res da lei Dodd-Frank. “A Dodd-Frank deixou o sistema mais seguro”, afirmou Barr, especialis­ta em regulação financeira, que trabalhava no Departamen­to do Tesouro na época da aprovação da lei, em 2010, e hoje é professor da Universida­de de Michigan.

Qual o potencial impacto da revogação das medidas impostas pela lei Dodd-Frank? A direção que o governo pretende adotar é muito perigosa para os consumidor­es americanos, para os investidor­es e o sistema financeiro como um todo. As mudanças vão desmantela­r a proteção de consumidor­es, afetar a atuação do Escritório de Proteção Financeira do Consumidor e reduzir muitas das medidas que adotamos para tornar o sistema financeiro mais seguro. Será mais fácil para o sistema financeiro assumir riscos como os que levaram à crise de 2008.

Quais são as medidas mais importante­s da Dodd-Frank? Uma das medidas que eles estão atacando é a criação do Escritório de Proteção Financeira do Consumidor, uma entidade federal que protege famílias americanas de abusos do mercado. Eles também estão atacando a possibilid­ade de regul a r o c h a ma d o “s h a d o w banking”, entidades que atuam como bancos mas que não são reguladas como bancos, como bancos de investimen­tos e grandes conglomera­dos de seguros. Outro ponto é a autoridade para liquidar uma instituiçã­o financeira em dificuldad­e.

O governo diz que as regulações representa­m um peso sobre os bancos, que compromete sua capacidade de emprestar. As provisões que eles estão atacando não têm nada a ver com empréstimo­s. Quando adotamos essas reformas, o sistema estava saudável e voltou a emprestar. O que eles falam é o contrário do que ocorreu.

Há o risco de uma nova crise financeira sem a Dodd-Frank? Sim, há um risco significat­ivo de uma amnésia coletiva baixar em Washington e as pessoas esquecerem as consequênc­ias devastador­as da última crise, o que criaria o risco de que ela venha a se repetir.

A Casa Branca também diz que a Dodd-Frank não resolveu um dos principais problemas da crise de 2008, que é a existência de bancos grandes demais para quebrar, os ‘too big to fail’. A Dodd-Frank deixou o sistema mais seguro. As coisas que eles estão tentando fazer agravariam o problema dos ‘too big to fail’.

O teste de estresse dos bancos criado pela Dodd-Frank também está na mira do governo Trump? Os republican­os no Congresso apresentar­am projetos que eliminam os testes de estresse para todos os bancos, com exceção dos maiores.

Durante a campanha, Trump atacou Wall Street e se apresentou como defensor or de pessoas comuns supostamen­te exploradas pela elite financeira. Que mensagem o anúncio de ontem passa para os seus eleitores? É um tapa na cara dos que o apoiaram. É uma mudança que vai prejudicar os consumidor­es americanos, os aposentado­s, os trabalhado­res que estão poupando para sua aposentado­ria, as famílias de veteranos de guerra e jovens que estão preocupado­s com seus débitos estudantis. É uma abordagem totalmente equivocada.

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