O Estado de S. Paulo

O caso capixaba

- SUELY CALDAS

Quando o governo federal aceitou renegociar as dívidas dos Estados com a União, um único governador se rebelou e rejeitou o socorro financeiro. “Essa renegociaç­ão não resolve o quadro dramático que estamos vivendo. O que resolve é uma agenda estruturan­te, que cuide das questões fiscais para retomar a confiança e os investimen­tos. Foi isso que defendi na reunião”, declarou Paulo Hartung, do Espírito Santo, ao sair do encontro do ministro da Fazenda com governador­es em junho de 2016. Alguns falidos (com a corda no pescoço, salários atrasados e protestos de rua) governador­es reagiram com ira à franqueza do capixaba. Hoje Hartung evita conflitos com eles, mas continua defendendo o aperto fiscal. Se houver renegociaç­ão, diz ele, tem de haver contrapart­idas: “É inaceitáve­l dar mais dinheiro a quem não quer se organizar”.

Por que um governador que em 2016 viu desabar 21,2% da receita de impostos, apenas com royalties de petróleo e a paralisaçã­o da Samarco, além de enfrentar os efeitos da pior recessão da história, rejeita a ideia de não pagar uma dívida valiosa e poder usar o dinheiro como quiser? Simplesmen­te porque Hartung está com as contas em dia e não se beneficia das regras da renegociaç­ão.

Ele informa que, apesar das perdas com royalties e com a Samarco, a receita tributária total caiu só 9,3% (de R$ 7,239 bilhões para R$ 6,566 bilhões), e ainda assim foi possível amortizar R$ 610 milhões da dívida do Estado. Hoje a dívida líquida está em R$ 3,138 bilhões e equivale a 48% de um ano de arrecadaçã­o, marca rara em nossa cam- baleante Federação. Milagre? “Controlamo­s o custeio da máquina com muito rigor, a folha de pagamento não cresceu, não tive dúvida em cortar investimen­tos em rodovias e obras de infraestru­tura, dispensamo­s 4 mil funcionári­os comissiona­dos, listamos prioridade­s e o que podia foi cortado. É sim- ples, é gestão. Só não conseguimo­s segurar despesas com a Previdênci­a, ninguém vai aguentar o tranco da Previdênci­a sem uma reforma, é urgente aprovála”, afirma.

Ao chegar ao governo, em 2015, Paulo Hartung encontrou um déficit fiscal primário de R$ 1,456 bilhão. Mesmo com a receita em queda, conseguiu virar o jogo rápido e encerrou o ano com um superávit de R$ 174 milhões, que cresceu para R$ 316,6 milhões em 2016, compatível com o tamanho da dívida. Mas acumula um déficit previdenci­ário de R$ 1,767 bilhão e a folha de funcionári­os é tão inchada quanto a maioria dos Estados: são 60 mil ativos e 33 mil aposentado­s. Sergipe, Estado um pouco menor, tem 35 mil servidores em atividade e 30 mil inativos. Em compensaçã­o, segundo o IBGE, a renda per capita capixaba (R$ 1.074,00) é a oitava maior entre os 27 Estados, enquanto a de Sergipe é de R$ 782,00.

Paulo Hartung confessa que recorre à renúncia fiscal, um dos erros mais presentes nas desastrada­s gestões do Rio de Janeiro, Minas Gerais e Rio Grande do Sul, algumas negociadas em troca de propina. O ex-governador Sérgio Cabral, preso e acusado de lavar dinheiro com joias e diamantes, isentou em R$ 230 milhões as joalherias. “Quer inves- tir no Espírito Santo? Venha e terá incentivo fiscal. Mas não é pela cara do freguês, não, é setorial, com regras e critérios, não tenho preconceit­o em conceder incentivos, se é para impulsiona­r o desenvolvi­mento do Estado”, explica.

Um erro aqui, outro acerto ali, o fato é que o Espírito Santo provou que, mesmo na crise e com o País na pior recessão da história, é possível administra­r o dinheiro público com equilíbrio, cortando excessos (espalhados pela gestão pública) e priorizand­o os gastos na área social. E o eleitor sabe reconhecer: segundo o Instituto Futura, entre abril e julho do ano passado a avaliação ótimo e bom do governo capixaba subiu de 29,8% para 40,3%.

O ES provou que, mesmo na crise, é possível administra­r o dinheiro público com equilíbrio

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