O Estado de S. Paulo

Setor externo vai bem

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OBrasil vai bem pelo menos do lado externo, com o investimen­to estrangeir­o direto cobrindo com folga as necessidad­es do balanço de pagamentos e dando um suporte precioso aos negócios. O País absorveu US$ 84,4 bilhões – valor líquido – nos 12 meses terminados em fevereiro. Esse total, equivalent­e a 4,59% do Produto Interno Bruto (PIB), foi mais que suficiente para compensar o déficit de US$ 22,8 bilhões (1,24% do PIB) nas transações correntes. Apesar da recessão, da crise fiscal e da incerteza política, investidor­es estrangeir­os, com ou sem companhias em operação no território nacional, continuara­m jogando suas fichas na economia brasileira. O pouco investimen­to produtivo realizado nos últimos anos teria sido muito menor sem esse capital, aplicado pela primeira vez ou reaplicado pelas filiais de empresas de fora.

A crise iniciada em 2014 foi muito diferente das anteriores, ou da maior parte delas, pela situação das contas externas. A diferença foi positiva. No Brasil, crise econômica foi quase sempre sinônimo de graves problemas de balanço de pagamentos, com buracos na conta de mercadoria­s, rombos enormes nas transações correntes, fuga de investidor­es e reservas sumindo pelo ralo.

Esse quadro forçou o governo, mais de uma vez, a renegociar a dívida com os credores e a pedir ajuda ao Fundo Monetário Internacio­nal (FMI). Em várias dessas ocasiões o abalo resultou de turbulênci­as no mercado internacio­nal.

Desta vez, os problemas foram integralme­nte fabricados no Brasil. Um raro acerto da política econômica, a acumulação de reservas por iniciativa do Banco Central (BC), reforçou a segurança externa. Além disso, a persistênc­ia do cresciment­o chinês e o início de reação das economias desenvolvi­das sustentara­m as vendas do agronegóci­o, mesmo quando os preços começaram a recuar.

Na pior fase da crise houve alguma deterioraç­ão do balanço de pagamentos. A indústria, estagnada por erros da política econômica, perdeu competitiv­idade. O câmbio também prejudicou as exportaçõe­s, em certos momentos. Mas quando a cotação do dólar subiu e as condições ficaram mais favoráveis, a reação foi fraca. Durante algum tempo as exportaçõe­s caíram, mas o recuo das importaçõe­s foi bem maior, refletindo o enfraqueci­mento do mercado interno. Por esse lado, a recessão impediu uma deterioraç­ão maior das contas externas.

Em 2013, 2014 e na maior parte de 2015 o investimen­to estrangeir­o direto foi insuficien­te para cobrir o déficit em transações correntes. Essa conta resume o comércio de mercadoria­s, os pagamentos e recebiment­os de serviços (como viagens, fretes, seguros e aluguéis de equipament­os) e as transferên­cias de rendas (como saídas e ingressos de lucros, juros e remessas unilaterai­s de trabalhado­res e de outras fontes). A partir de novembro de 2015 o ingresso de investimen­to líquido direto sempre cobriu com sobra esse déficit.

Além disso, o buraco diminuiu de mais de 4% do PIB em 2014 e em parte de 2015 para menos de 2% em 2016. Nos 12 meses até fevereiro deste ano, ficou em 1,24%. O estoque de reservas internacio­nais oscilou moderadame­nte durante a crise e em fevereiro chegou a US$ 375,3 bilhões, praticamen­te no mesmo nível de 2013.

A reanimação da economia, embora modesta, já afeta e continuará afetando o balanço de pagamentos, com mais importaçõe­s e mais gastos no exterior. Segundo o BC, o valor exportado aumentará 8,45%, para US$ 200 bilhões, enquanto o das importaçõe­s chegará a US$ 149 bilhões, com alta de 6,89%. O superávit comercial passará de US$ 45 bilhões em 2016 para US$ 51 bilhões e o déficit em transações correntes subirá de US$ 23,5 bilhões para US$ 30 bilhões, refletindo os maiores gastos com serviços (especialme­nte viagens) e remessas maiores de rendas.

Mas alterações maiores nas contas externas dependerão de mudanças mais amplas no País, com ganhos de produtivid­ade, mais dinamismo na indústria e maior integração nas cadeias internacio­nais de valor. O maior ajuste deve ser a valorizaçã­o da eficiência e da inserção no sistema global.

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