O Estado de S. Paulo

‘De nada adianta a Lava Jato sem punir políticos’

Para o delegado que participou do início das as investigaç­ões, falta estrutura para o Supremo julgar alvos com foro

- Ricardo Brandt

Em sua mais difícil fase, a Operação Lava Jato perdeu nesta semana o delegado da Polícia Federal que iniciou, em 2013, as investigaç­ões de lavagem de dinheiro que revelaram o escândalo na Petrobrás. Aos 39 anos, Márcio Adriano Anselmo está de mudança para Vitória, onde vai assumir a Corregedor­ia da PF no Espírito Santo.

Na quinta-feira, foi publicada a ordem de remoção de Anselmo, que deixa a equipe da Lava Jato, em Curitiba, depois de três anos de investigaç­ões ostensivas e 38 operações deflagrada­s. “De nada adiantará a Operação Lava Jato se os políticos envolvidos não forem punidos”, disse ao Estado. Abaixo, os principais trechos da entrevista:

A Lava Jato completa três anos de fase ostensiva. Há o que comemorar? Certamente. A Lava Jato é reconhecid­a nacional e internacio­nalmente como a maior operação de combate à corrupção da história.

A Lava Jato está acabando? Acredito que não. Creio que o trabalho da primeira instância, ao menos no Paraná, está próximo da sua conclusão, mas ainda há uma imensidão de trabalho nas investigaç­ões que envolvem autoridade­s com prerrogati­va de foro, bem como vários trabalhos em andamento em outros Estados, muitos deles “filhotes” da Lava Jato.

O Supremo Tribunal Federal recebeu a maior carga de pedi- dos de investigaç­ão da Procurador­ia-Geral da República contra alvos com foro privilegia­do da Lava Jato. A Corte está preparada para julgar esses processos? Não, de forma alguma. O Supremo não tem estrutura, seja para a fase de investigaç­ão ou para a fase das ações penais. Veja o tempo que a pauta do STF ficou trancada para o julgamento do mensalão, que era um único processo. Quase todos os casos de ações penais que lá tramitam acabam prescreven­do. O problema é estrutural. Tudo no Brasil termina no STF e isso precisa ser revisto. A quantidade de autoridade­s no Brasil com foro por prerrogati­va colabora com esse estado de caos e funciona como garantia de impunidade.

A punição de políticos que participar­am do esquema de corrupção na Petrobrás é essencial para que a Lava Jato seja efetiva? De nada adiantará a operação se os políticos envolvidos não forem punidos. Os demais envolvidos, como corruptore­s, agentes públicos e operadores financeiro­s, sempre atuaram na certeza de serem blindados.

Uma anistia geral para os alvos políticos não poderia representa­r um retrocesso? Uma anistia dessa forma, como já foi cogitado, seria o fim da Lava Jato. Seria a prova irrefutáve­l de que o crime compensa no Brasil.

O sr. deixa a equipe da Lava Jato com um pedido feito um ano atrás, em que se declarou esgotado. Seu estresse e cansaço têm relação com pressões sofridas? Poucos conhecem o ritmo de trabalho da equipe da Lava Jato, seja na PF, Receita, Ministério Público Federal ou Justiça Federal. Antes da deflagraçã­o da primeira fase, por falta de pessoal, levava trabalho todo dia para casa para garantir o cumpriment­o dos prazos rígidos. Cuidava do monitorame­nto de mais de uma dezena de e-mails. O cansaço físico e mental é inevitável.

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GERALDO BUBNIAK / ESTADÃO Nova etapa. Anselmo vai assumir Corregedor­ia da PF

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