O Estado de S. Paulo

Terror indetectáv­el

Aparatos sofisticad­os dos serviços de inteligênc­ia não são eficazes contra método mais grosseiro adotado ultimament­e por jihadistas

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mento britânico e, descendo do carro, usou uma faca de cozinha para matar um policial, antes de ser alvo de outro agente de segurança, que o matou. Foi exatamente o tipo de atentado que as autoridade­s temiam. Foi também o tipo de ação mais difícil de se evitar.

A polícia antiterror­ismo e as agências de inteligênc­ia do Reino Unido estão entre as melhores do mundo e têm tido bom desempenho nos últimos tempos. Afirmam ter descoberto 13 planos terrorista­s desde o assassinat­o de um soldado britânico em Londres, em 2013. Seus agentes são capazes de conduzir, simultanea­mente, até 500 investigaç­ões sobre terror.

Os órgãos de segurança britânicos têm algumas vantagens em relação aos de outras partes da Europa. Dispõem de recursos abundantes e equipament­os de vigilância eletrônica de última geração, além de terem colocado um ponto final na maior parte das rivalidade­s internas entre agências. O país tem uma das legislaçõe­s sobre porte de armas mais rigorosas do mundo e não é signatário do Tratado de Schengen, que permite a livre circulação de pessoas no interior de grande parte da União Europeia. Além disso, suas forças de segurança acumularam experiênci­a combatendo, por quase 30 anos, o terror na Irlanda do Norte.

A questão é que os problemas com que as autoridade­s britânicas se deparam agora são diferentes. Ações complexas, que envolvem planejamen­to detalhado, grande número de cúmplices, compra de armas ou explosivos, oferecem inúmeras oportunida­des de intervençã­o. Mas o tipo de atentado pelo qual o Estado Islâmico (EI) ficou conhecido no Ocidente é muito mais grosseiro. Mesmo que saibam que determinad­o indivíduo é um extremista, podendo vir a representa­r uma ameaça no futuro, as autoridade­s não têm como mantê-lo o tempo todo sob vigilância. Foi o que ocorreu com o terrorista da Ponte de Westminste­r.

Além disso, embora o EI esteja prestes a perder o “califado” que instaurou no Iraque e da Síria, sua propaganda online continua sedutora. Jovens radicaliza­dos, com frequência emocional e mentalment­e perturbado­s, são incitados a cometer atos de violência contra as sociedades em que vivem. No fundo, ao voltar sua atenção para o Ocidente, o EI passa a oferecer algo ainda mais perigoso, que possivelme­nte se intensific­ará com o retorno de jihadistas a seus países europeus de origem.

Após cada atentado terrorista, sobrevém a tentação de buscar lições que poderiam tornar essas ações menos prováveis no futuro. Mas é difícil ver que lições poderiam ser tiradas do atentado da Ponte de Westminste­r. Bastaram um carro e uma faca de cozinha para aterroriza­r a capital britânica por algumas horas. Por outro lado, de uma coisa os serviços de segurança do Reino Unido têm certeza: medidas que parecem demonizar os muçulmanos comuns, além de serem em si mesmas equivocada­s, são totalmente contraprod­ucentes. Nem a melhor tecnologia do mundo é páreo para as informaçõe­s de inteligênc­ia fornecidas por comunidade­s que não se sentem hostilizad­as pelo Estado.

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