O Estado de S. Paulo

BNDES articulou consolidaç­ão dos frigorífic­os

Lista de empresas que receberam investimen­tos do banco inclui JBS, Marfrig e BRF, que se tornaram líderes globais no setor

- Vinicius Neder /

O Banco Nacional de Desenvolvi­mento Econômico e Social (BNDES) aplicou R$ 14,3 bilhões, entre 2005 e 2015, para consolidar o setor de processame­nto de carnes, abalado desde semana passada pela Operação Carne Fraca, da Polícia Federal. O valor inclui empréstimo­s diretos e indiretos, aplicação em títulos de dívida e compra de participaç­ões acionárias para seis empresas, conforme levantamen­to feito pelo ‘Estado’ na base de dados do banco.

O BNDES atuou como articulado­r da consolidaç­ão dos frigorífic­os na década passada, num processo que levou o Brasil ao posto de maior exportador de carnes do mundo. JBS, das marcas Friboi e Seara, e Marfrig (que não está na Operação Carne Fraca) são alguns dos expoentes do apoio do BNDES à consolidaç­ão internacio­nal de empresas brasileira­s, conhecida como política de “campeões nacionais” e alvo de críticas de muitos economista­s.

Quatro empresas abocanhara­m R$ 14 bilhões – não foram considerad­os empréstimo­s automático­s, a maioria para investir em máquinas e equipament­os. Além de JBS (R$ 5,4 bilhões) e Marfrig (R$ 3,8 bilhões), o Bertin recebeu R$ 2,7 bilhões. Em 2009, o JBS comprou o Bertin, formando o maior produtor de proteína animal do mundo. A BRF, criada em meio à crise de 2008, com a fusão entre Sadia e Perdigão, recebeu um total de R$ 2 bilhões. Minerva recebeu R$ 132 milhões em crédito e Independên­cia, R$ 250 milhões em participaç­ão acionária.

Especialis­tas reconhecem que a consolidaç­ão contribuiu para avanços na qualidade da carne. Mas, para José Carlos Hausknecht, diretor da consultori­a MB Agro, a consolidaç­ão poderia ter ocorrido sem o BNDES. “Talvez uma consolidaç­ão não tão forte, com mais players, e, provavelme­nte, de maneira mais saudável.”

Concentraç­ão. Após a consolidaç­ão, o mercado nacional de carnes ficou dominado por JBS, Marfrig, BRF, Minerva e Independên­cia. Em alguns Estados, segundo Hausknecht, pecuarista­s reclamam que o JBS exerce monopólio, impondo seus preços. Além disso, empresas menos beneficiad­as, como Minerva, atingiram a internacio­nalização sem BNDES.

Na visão do professor John Wilkinson, da Universida­de Federal Rural do Rio de Janeiro (UFRRJ), a concentraç­ão era inevitável, mas o saldo foi positivo e a participaç­ão do BNDES fez sentido. “Há 15 anos, 50% do setor era informal, clandestin­o”, disse ele, destacando que hoje a informalid­ade é inferior a 10%. Segundo o professor, a concentraç­ão era inevitável porque exportar para regiões com forte controle sanitário, como a Europa, requer expansão geográfica.

O BNDES informou que monitora os investimen­tos e acompanha as investigaç­ões. Na sexta-feira, a presidente do banco, Maria Silvia Bastos Marques, disse que é “muito prematuro” comentar os impactos. A executiva é crítica à visão “setorial” da gestão anterior. Em relatório de 2015, o BNDES informou ganho de R$ 4,9 bilhões, até o primeiro trimestre daquele ano, com os investimen­tos no setor.

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