O Estado de S. Paulo

Fim do foro privilegia­do passa no Senado em 1ª votação

Legislativ­o. Votação antecipa julgamento do Supremo sobre o tema; proposta, aprovada por unanimidad­e em plenário, pode afetar cerca de 35 mil autoridade­s no País

- Julia Lindner Erich Decat / BRASÍLIA

O Senado aprovou, por 75 a 0, proposta de emenda à Constituiç­ão que acaba com o foro privilegia­do de autoridade­s para crime comum, com exceção dos presidente­s da República, da Câmara, do Senado e do Supremo Tribunal Federal. A votação se antecipou a julgamento do STF que poderia restringir casos de políticos na Corte. A proposta dos senadores é mais radical, pois acaba com o foro de praticamen­te todas as autoridade­s, incluindo do Judiciário. O projeto será votado em segundo turno no Senado e seguirá para a Câmara.

O Senado aprovou ontem, em primeiro turno, proposta de e menda à Constituiç­ão (PEC) que extingue o foro privilegia­do por crimes comuns para todas as autoridade­s, com exceção dos chefes dos Três Poderes – os presidente­s da República, da Câmara, do Senado e do Supremo Tribunal Federal (STF). A texto contou com 75 votos a favor e nenhum contra.

A votação no Senado antecipou um julgamento no STF, marcado para o fim de maio, que poderia restringir os casos envolvendo políticos que hoje são julgados pela Corte. Segundo o relator da proposta, senador Randolfe Rodrigues (RedeAP), cerca de 35 mil pessoas possuem foro privilegia­do nos tribunais do País, incluindo governador­es, desembarga­dores e conselheir­os de tribunais de contas. Com o fim do foro, todos passariam a ser julgados na primeira instância da Justiça.

Por se tratar de uma PEC, o projeto ainda terá de ser votado em segundo turno no plenário do Senado antes de ser encaminhad­o para a Câmara. A previsão é de que isso ocorra apenas no mês que vem.

Se promulgada, a PEC terá impacto direto nas investigaç­ões da Operação Lava Jato. À exceção dos chefes dos Três Poderes, todos os políticos investigad­os no STF passarão a ter seus processos tocados por juízes de primeira instância (mais informaçõe­s na pág. A5).

“O foro por prerrogati­va de função, o chamado foro privilegia­do no Brasil, que contempla quase 35 mil autoridade­s, da forma como está, estabelece dois tipos de cidadãos em nosso País. Um cidadão de uma casta privilegia­da, que tem uma espécie de tribunal especial, e outros, que são julgados por qualquer juiz ou tribunal”, disse Randolfe em discurso no plenário.

Votação. A votação do texto na Comissão de Constituiç­ão e Justiça (CCJ) não estava prevista na sessão de ontem, mas foi incluída de última hora após acordo entre o presidente do Senado, Eunício Oliveira (PMDBCE), e líderes partidário­s.

Ao se antecipar ao Supremo e votar a PEC a toque de caixa, os senadores também tiveram como objetivo evitar que o Supremo legisle sobre tema que, por princípio, deveria ser debatido pelo Congresso.

A proposta original, de autoria do senador Alvaro Dias (Rede-PR), não admitia exceções. Após acordo, porém, o relator, Randolfe, acatou uma emenda do senador Ricardo Ferraço (PSDB-ES), que estabelece que os chefes dos Três Poderes continuam sendo julgados pela Suprema Corte mesmo em caso

Eunício Oliveira (PMDB-CE)

de infrações penais comuns.

Em casos de crime de responsabi­lidade, a legislação continua como está: ministros de Estado, comandante­s da Marinha, do Exército e da Aeronáutic­a, membros dos Tribunais Superiores e do Tribunal de Contas da União e chefes de missão diplomátic­a de caráter permanente continuam com foro privilegia­do. Já em casos de crime responsabi­lidade contra as demais autoridade­s, como o presidente da República, o julgamento cabe ao Congresso Nacional.

“Quando Montesquie­u ( filósofo, político e escritor francês dos séculos 17 e 18) pensou o sistema de pesos e contrapeso­s foi porque ele se convenceu de que o homem tende a abusar da autoridade. Por isso, é muito importante a presença de todos aqui, no plenário”, afirmou o líder do PMDB, senador Renan Calheiros (AL), ao recomendar que a bancada do partido votasse a favor da proposta.

‘Sessão histórica’. Após declarar o resultado, o presidente do Senado, Eunício Oli vei r a (PMDB-CE), considerou como histórica a sessão que aprovou o primeiro turno da PEC do fim do foro e a atualizaçã­o das regras de abuso de autoridade.

“Acabamos com o foro dito privilegia­do não para os 600 parlamenta­res e ministros, mas para todas as 35 mil pessoas que detêm direito a essa prerrogati­va de função. Do vereador ao membro do Conselho Nacional de Justiça”, afirmou Eunício.

“Ao mesmo tempo regulamos o combate de abuso de autoridade­s. Uma excrescênc­ia que afeta o cidadão diariament­e, a chamada carteirada na fila de cinema; a prisão injusta, dos maus tratos nas prisões; nas delegacias”, disse.

“Acabamos com o foro dito privilegia­do não para os 600 parlamenta­res e ministros, mas para 35 mil.”

PRESIDENTE DO SENADO

 ?? DIDA SAMPAIO/ESTADÃO ?? 75 a zero em plenário. Em casos de crime de responsabi­lidade, legislação fica como está
DIDA SAMPAIO/ESTADÃO 75 a zero em plenário. Em casos de crime de responsabi­lidade, legislação fica como está

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