O Estado de S. Paulo

Melhora não bateu na receita

-

Com desemprego muito alto, consumo ainda fraco e recuperaçã­o limitada ao campo e a alguns segmentos da indústria, a arrecadaçã­o federal continuou refletindo pelo menos até o mês passado os efeitos da recessão. O Tesouro recolheu em maio R$ 97,69 bilhões, 0,96% menos que um ano antes, descontada a inflação. O total acumulado em cinco meses chegou a R$ 544,48 bilhões, com ganho real de 0,35% em relação ao total de janeiro a maio de 2016. Mas nem esse acréscimo chega a ser de fato uma notícia animadora. O resultado positivo é explicável por um fator estranho à tributação. A soma administra­da pela Receita Federal (R$ 528,48 bilhões) foi 0,82% inferior à dos meses correspond­entes do ano anterior. Receitas de outras fontes – royalties, nesse caso – garantiram o pequeno ganho em relação ao dinheiro obtido no ano passado.

Arrumar as contas oficiais continua sendo o desafio básico para o governo federal, neste ano e pelo menos até o começo da próxima década. O objetivo para 2017 é aparenteme­nte modesto: fechar o ano com um déficit nominal – sem o custo dos juros, portanto – de R$ 139 bilhões. Se esse número for alcançado, ainda haverá um enorme buraco nas contas primárias do governo central, mas terá ocorrido um avanço em relação ao balanço fiscal do ano passado.

Para atingir essa meta, a administra­ção federal terá de combinar corte de gastos e aumento de arrecadaçã­o. Esse ganho dependerá principalm­ente de uma receita de impostos e contribuiç­ões engordada pela atividade econômica mais intensa, com maior produção, maior consumo, maior investimen­to produtivo e comércio exterior mais intenso. Componente­s extraordin­ários, como receita de concessões e privatizaç­ões, de royalties e de renegociaç­ões de impostos em atraso, também ajudarão a fechar as contas, mas a grande base da arrecadaçã­o deve ser mesmo a reativação econômica.

Por enquanto, é difícil enxergar na receita os sinais de melhora da economia. Até maio, os indicadore­s de produção industrial e de venda de bens continuara­m abaixo daqueles contabiliz­ados um ano antes. No caso da indústria, a comparação apontou variação negativa de 0,58%. No das vendas, uma queda de 2,98%.

Esses dados explicam a menor arrecadaçã­o de tributos ligados ao ritmo da produção e do consumo. O valor em dólar das importaçõe­s foi 11,39% maior que o de janeiro a maio de 2016, mas, ainda assim, a receita proporcion­ada pelas compras de produtos estrangeir­os foi 3,38% menor que a de um ano antes, descontada a inflação, talvez por efeito do câmbio.

Nos primeiros cinco meses, impostos pagos por pessoas físicas sobre rendimento­s foram os principais tributos, dentre os itens administra­dos pela Receita, com arrecadaçã­o maior que a de um ano antes.

Os efeitos do desemprego continuara­m mais visíveis em outros componente­s do balanço. Além de afetar o consumo e, indiretame­nte, a produção industrial, a desocupaçã­o prejudicou a arrecadaçã­o previdenci­ária, que foi 0,65% menor, compensada a inflação, que a de janeiro a maio de 2016.

Mas, no caso da Previdênci­a, só as contribuiç­ões pagas por empregados, empregador­es e autônomos diminuíram. Os pagamentos de benefícios continuara­m certamente em cresciment­o. A consequênc­ia desse descompass­o aparecerá com clareza na divulgação completa das contas – com receitas e despesas – do governo central. Esse desajuste continua sendo a causa principal do enorme desarranjo das finanças públicas, mesmo numa fase de fraca arrecadaçã­o da maior parte de impostos e contribuiç­ões.

O governo baseou suas estimativa­s fiscais numa expectativ­a de expansão econômica de 0,5% neste ano. Projeções coletadas no mercado financeiro têm apontado um resultado inferior a esse para 2017. De toda forma, o cresciment­o do Produto Interno Bruto será insuficien­te para garantir a receita necessária, se o aumento da produção for concentrad­o em atividades menos geradoras de impostos, como ficou claro até agora. Confiança será fundamenta­l para um cresciment­o equilibrad­o em todos os setores.

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Brazil