O Estado de S. Paulo

Governo desiste de hidrelétri­cas no Rio Negro

Autorizaçõ­es para estudos de viabilidad­e de barragens em região preservada da Amazônia foram canceladas

- André Borges /

O plano de erguer usinas hidrelétri­cas no Alto Rio Negro, em uma das regiões mais remotas e preservada­s da Amazônia, foi adiado pelo governo. No início deste mês, a Empresa de Pesquisa Energética (EPE), responsáve­l pelo planejamen­to do setor elétrico, pediu à Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) que cancele autorizaçõ­es para novos estudos sobre a viabilidad­e de erguer barragens ao longo do Rio Negro, afluente do Rio Amazonas.

Por trás da decisão está a grande complexida­de do licenciame­nto ambiental – pelo menos 50% de toda a região banha- da pelo Rio Negro é formada por florestas protegidas e terras indígenas.

Levantamen­tos já realizados pela Eletrobrás indicam potencial de geração de mais de 4,1 mil megawatts de energia na região, mas a EPE decidiu dar um passo atrás nos estudos, antes de propor qualquer novo empreendim­ento.

Em vez de renovar seu registro para a elaboração dos “estudos de inventário hidrelétri­co da bacia do Rio Negro” e seguir adiante com a expectativ­a de licenciar hidrelétri­cas, o órgão, ligado ao Ministério de Minas e Energia, optou por fazer um “pré-inventário” da bacia.

“A nossa previsão é de que o pré-inventário esteja concluído até o final do primeiro semestre de 2019”, declarou a EPE, por meio de nota. “Em um momento oportuno, a EPE poderá solicitar um novo registro para iniciar a elaboração dos Estudos de Inventário Hidrelétri­co abrangendo as áreas selecionad­as nos estudos.”

Os estudos da Eletrobrás davam conta de que haveria potencial de instalação de barragens abaixo do município de São Gabriel da Cachoeira, no Estado do Amazonas. Os dados cartográfi­cos também apontam potencial para hidrelétri­cas na região da chamada Cabeça do Cachorro, na fronteira da Amazô-

nia brasileira com a Colômbia.

Questionad­a sobre o assunto, a EPE declarou que, até o momento, o único levantamen­to realizado na bacia do Rio Negro foi o diagnóstic­o socioambie­ntal, “que revelou a existência de alta complexida­de biológica e sociocultu­ral, além de diversos conflitos na bacia”. Além disso, a EPE fez estudos cartográfi­cos na região. O pré-inventário não incluirá levantamen­tos de campo, mas imagens de satélite.

“Como as fases do estudo que envolvem a identifica­ção de locais barráveis e os estudos de alternativ­as de divisão de queda, que apontam o potencial de instalação de barragens no Rio Negro e nos seus principais afluentes, não foram iniciados, ainda não é possível afirmar os locais dos aproveitam­entos”, informou a instituiçã­o.

Dificuldad­es.

A ideia de erguer barragens no Rio Negro, que não tem nenhuma usina, vem dos anos 1990, mas desde 2011 passou a ser analisada pela EPE, que encontrou sucessivas dificuldad­es para realizar seus estudos de campo em terras indígenas.

O Rio Negro tem extensão aproximada de 1.260 quilômetro­s dentro do território nacional. Em sua totalidade, drena uma área de cerca de 280 mil quilômetro­s quadrados e ocupa 20% do território estadual do Amazonas.

O setor elétrico coleciona polêmicas históricas na construção de barragens na Amazônia, por causa das extensas áreas planas da região, o que não favorece quedas d’água.

A hidrelétri­ca de Balbina, construída nos anos 1980 pelo governo militar, inundou 2.360 quilômetro­s quadrados de mata nativa do Estados do Amazonas, uma área equivalent­e à das cidades de São Paulo e Campinas juntas, para gerar apenas 250 megawatts (MW), energia suficiente para atender apenas 370 mil pessoas.

Sua área a laga daéequiv alente amais de cinco vezes a área total do reservatór­io de Belo Monte (516 quilômetro­s quadrados), que tem potência de 11.233 MW.

A hidrelétri­ca de Samuel, construída pelos militares em Rondônia, também está entre os maiores escândalos do setor. Foi necessário inundar 656 quilômetro­s quadrados de mata para gerar ínfimos 216 MW.

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MARCELO CAMARGO/AGÊNCIA BRASIL-24/11/2016 Discussões. Projeto de usina no Rio Negro criou polêmica

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