O Estado de S. Paulo

Grunge inRio

Vinda de museu de Seattle, exposição traz memorabili­a que narra a breve carreira do Nirvana

- Roberta Pennafort /

No dia 6 de janeiro de 1990, um Kurt Cobain de 22 anos, recémchega­do de shows pela Berlim do muro recém-derrubado, deu entrevista a uma emissora de TV de Seattle na condição de aspirante a estrela do rock. Disse não saber explicar por que a chuvosa cidade do noroeste norteameri­cano se tornara cenário fértil para o grunge que iria soar mundo afora a partir do ano seguinte, com o estouro do disco

Nevermind. “Não sei, é o acaso, sorte. É louco termos tantas bandas no lugar certo”, declarou o vocalista e guitarrist­a do Nirvana, em imagens que nunca iriam ao ar.

O programa acabou tendo a exibição cancelada à época, e a raridade só veio a público quando da montagem da exposição

Nirvana: Taking Punk to the Masses pelo Museum of Pop Culture, de Seattle, em 2011. Pela primeira vez, a mostra, já vista por mais de 3 milhões de pessoas, deixou o moderníssi­mo prédio projetado por Frank Gehry para a centenária construção que abriga o Museu Histórico Nacional, no Rio, com seus 200 itens, entre instrument­os (das marcas mais baratas, compradas em lojas de departamen­to no início da carreira, às Fenders preferidas de Kurt, sendo sete delas parcialmen­te destruídas em seus arroubos roqueiros), fotos, desenhos, discos e roupas dos integrante­s da banda. A mostra foi aberta na quinta, 22.

É um conjunto que move os fãs e aguça a curiosidad­e de quem só conhece o Nirvana de

Smells Like Teen Spirit, Come As You Are e Lithium – os três hits, aliás, ecoam numa sala interativa, onde os visitantes podem cantar e bater cabeça diante de uma câmera. “Queria atrair tanto o grande fã quanto quem não entende nada de Nirvana nem de punk-rock”, explica o curador do museu e da mostra, Jacob McMurray.

“Eu achava que ficaria um ano em cartaz, mas foi um sucesso e o museu se tornou um lugar de peregrinaç­ão. Na época do aniversári­o de Kurt e de sua morte, vemos pessoas circulando nas galerias só por causa dele, com jaquetas com seu rosto, vestidas como ele se vestia. A história do Nirvana em geral é associada a suicídio (de Kurt) e abuso de drogas, mas vale a pena apresentá-la como algo inspirador para jovens músicos: esses eram garotos que não precisaram ir a Los Angeles ou Nova York para se tornar a banda mais famosa do planeta.”

A ilustração de um casal de punks feita por Kurt adolescent­e, na escola, acompanhad­a de fotos dele na sala de aula, tirando meleca do nariz; a primeira guitarra destruída por ele no palco, em outubro de 1988, num show para 50 pessoas num dormitório de universida­de, quan- do não havia dinheiro sequer para o pagar o aluguel, que dirá para comprar um novo instrument­o; o primeiro pôster de show, do mesmo ano, desenho dele também; letras manuscrita­s numa folha de caderno, de composiçõe­s que entraram no LP de estreia, Bleach; os setlists dos shows no finado Hollywood Rock, no Rio e em São Paulo, em janeiro de 1993, escritos à mão pelo baterista Dave Grohl, e também a da última apresentaç­ão, em março de 1994, em Munique; o primeiro contrato assinado com a gravadora Sub Pop, em 1990, no valor de US$ 600 – são alguns momentos de destaque na narrativa dos seis anos de vida do Nirvana.

Com mais de 130 mil itens sobre música popular, o museu tem a maior coleção de memora- bilia do Nirvana. Para esta mostra, repleta de fotos icônicas dos músicos no palco, com seus jeans e tênis surrados e camisas de flanela, foram selecionad­as peças do acervo pessoal do baixista Krist Novoselic, de sua exmulher, Shelli Hyrkas, entre outras pessoas, além de objetos adquiridos em leilões.

Em cartaz no Rio até agosto, a exposição – que na sequência vai para o Lounge Bienal, no Ibirapuera –, em sua porção final oferece um painel dos 21 discos de formação de Krist Novoselic – clássicos do Black Sabbath, The Stooges... – e, na sessão interativa, um painel que reproduz a piscina da foto da capa de Nevermind, a nota de US$ 1 à frente.

A exposição é patrocinad­a pela Samsung, com recursos obtidos via Lei Rouanet. Uma parte do que é exibido em Seattle não veio (os donos dos objetos temeram a viagem, apesar do seguro). Um norte que a curadoria seguiu foi a pergunta: o que exatamente, em Seattle, propiciou o surgimento não só do Nirvana, mas de gigantes como Soundgarde­n, Alice in Chains e Pearl Jam? “Numa cidade chuvosa e fria, faz sentido as pessoas passarem a maior parte do tempo entocadas, fazendo música e bebendo cerveja”, tenta responder McMurray.

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FOTOS FABIO MOTTA/ESTADÃO ‘In Utero’. Escultura de anjo da cenografia da última turnê, abreviada pelo suicídio de Kurt, em 1994
 ??  ?? Público no Rio. Antes de vir ao País, mostra já foi visitada por mais de 3 milhões de pessoas
Público no Rio. Antes de vir ao País, mostra já foi visitada por mais de 3 milhões de pessoas
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A primeira. Guitarra de Kurt

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