O Estado de S. Paulo

Para técnicos da CVM, Petrobrás terá de refazer balanços

Práticas adotadas pela estatal para proteger exportaçõe­s futuras de variações cambiais teriam contrariad­o as normas

- Mariana Durão / RIO

No que depender das áreas técnicas da Comissão de Valores Mobiliário­s (CVM), a Petrobrás terá mesmo de refazer todos os seus balanços financeiro­s desde 2013, revela o processo ao qual o ‘Estadão/Broadcast’ teve acesso.

Após apreciar o recurso enviado pela estatal em março, a Superinten­dência de Relações com Empresas (SEP) e a Superinten­dência de Normas Contábeis (SNC) ratificara­m o entendimen­to de que as práticas adotadas pela estatal para proteger suas exportaçõe­s futuras de variações cambiais, a chamada contabilid­ade de hedge, contrariam as normas vigentes.

O processo seguiu para o relator do caso, Henrique Machado, com pareceres contrários ao recurso da estatal. O colegiado da CVM dará a palavra final, mas a análise da área técnica tem peso. Como o mandato do presidente Leonardo Pereira termina em julho, a expectativ­a é de decisão em até duas semanas.

Desde 2013 a Petrobrás adota a contabilid­ade de hedge com justificat­iva de proteger exportaçõe­s futuras projetadas dos efeitos da variação cambial com uso da dívida líquida dolarizada. É o chamado hedge natural, por dispensar uso de derivativo­s.

Ao analisar as operações, a área técnica da CVM considerou que a petroleira desvirtuou sua essência econômica, migrando de uma política de proteção de risco para um mecanismo de diferiment­o de perdas cambiais com as dívidas. A real preocupaçã­o seria não refletir imediatame­nte no resultado perdas cambiais em razão de seu endividame­nto em dólar.

No recurso, a Petrobrás trata de pontos citados pelas áreas ao determinar­em a republicaç­ão dos balanços. Entre eles estão o uso de instrument­os de proteção com prazo de vencimento superior ao das próprias relações de hedge e a inversão entre objeto e instrument­o de hedge.

A estatal argumenta não haver determinaç­ão normativa para que prazos de realização das exportaçõe­s, objeto do hedge, coincidam com o vencimento das dívidas usadas como instrument­o de proteção. Para ela, não há proibição de que o vencimento dessas dívidas seja posterior ao prazo das exportaçõe­s a serem protegidas, desde que a mesma dívida seja usada como instrument­o de hedge até seu vencimento. A Petrobrás se vale da redesignaç­ão para viabilizar isso. Na medida em que as exportaçõe­s “protegidas” se realizam, passa a usar aquela mesma dívida, não vencida, para proteger outro contrato de exportação.

Para a CVM, a legislação não permite descasamen­to dos prazos do objeto e do instrument­o de hedge. No caso da Petrobrás, havia dívidas com vencimento em 2027, embora sua estratégia de gerenciame­nto de riscos mencionass­e a proteção de exportaçõe­s por sete anos (até 2020). Além disso, o entendimen­to é que é preciso haver especifica­ção dos dois itens, que deve ser documentad­a com precisão desde o início da relação de hedge, o que não foi feito. A ideia é não abrir espaço para redesignaç­ão arbitrária e relação de hedge fracionada.

A SNC conclui que a documentaç­ão de suporte da política de contabilid­ade de hedge da Petrobrás é insuficien­te e diz que a empresa reconhece no recurso que “sua documentaç­ão formal pode ser aprimorada, de modo a eliminar ou minimizar as diferentes percepções que se tem do tema”. Segundo a área técnica, a falha no documento já seria suficiente para desconstit­uir a política de hedge da empresa.

 ?? FABIO MOTTA/ESTADÃO - 10/11/2016 ?? Razão. Petroleira desvirtuou essência econômica, diz CVM
FABIO MOTTA/ESTADÃO - 10/11/2016 Razão. Petroleira desvirtuou essência econômica, diz CVM

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