O Estado de S. Paulo

Opositor mais duro, Navalni não tem chances

Comissão Eleitoral o declarou inelegível por ter sido condenado em um controvert­ido caso de desvio de fundos

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cluir o líder oposicioni­sta da corrida presidenci­al, são irrelevant­es. Nisso se notam ecos do fim dos anos 80, quando Mikhail Gorbachev, último presidente da era soviética, tirou Boris Yeltsin do comando da prefeitura de Moscou, na tentativa de obliterá-lo politicame­nte, sem se dar conta de que Yeltsin já se tornara popular demais para ser expulso da política.

Navalni organizou uma rede de cerca de 120 mil voluntário­s, com ramificaçõ­es em todo o país. Mesmo que o Kremlin rejeite reconhecer isso, o fato é que ele é visto como uma alternativ­a a Putin.

As manifestaç­ões ocorreram em 170 cidades da Rússia, reunindo 150 mil pessoas, segundo os organizado­res. Em 26 de março, em outro dia de protestos, a participaç­ão foi estimada em 100 mil pessoas, em 90 cidades. Cerca de metade dos manifestan­tes tinha entre 18 e 29 anos.

“Foram as maiores manifestaç­ões desde 1991”, afirma Leonid Volkov, principal auxiliar de Navalni. Muitos manifestan­tes dizem não ter medo de que a polícia os prenda. Para eles, faz parte da coisa.

Um dos motivos da revolta é a economia. A renda real dos russos recuou 13% nos últimos dois anos e meio, regredindo ao nível de 2009. As vendas do varejo encolheram 15%. Os investimen­tos estão em queda há três anos, com um declínio acumulado de 12%. Natalia Zubarevich, especialis­ta em desenvolvi­mento regional, diz que os fatores econômicos são amplificad­os pela frustração com a falta de liberdade política e com a hipocrisia governamen­tal.

O Kremlin busca desesperad­amente uma narrativa que Putin possa vender para o eleitorado em 2018. Alguns esperam apresentá-lo como um estadista sexagenári­o, nos moldes de um Deng Xiaoping, capaz de implementa­r reformas e, ao mesmo tempo, reprimir dissidente­s.

O potencial reformista do regime é duvidoso. Sua disposição repressiva, não. A polícia deteve 866 manifestan­tes em Moscou e 658 em São Petersburg­o, segundo o OVD-info, grupo de defesa dos direitos humanos.

Em Moscou, identifico­use a presença de um policial que foi chefe de um batalhão de choque ucraniano e participou da repressão aos protestos em Kiev, em 2014. “Isto aqui não é uma Maidan. Não vamos esperar ordens para atirar”, disse um jovem soldado russo.

No ano passado, o governo criou uma Guarda Nacional, com 400 mil homens, sob o comando de um ex-guardacost­as de Putin, que responde diretament­e ao presidente. A maior parte dos soldados que participar­am da repressão aos protestos regulava em idade com os manifestan­tes. Nas palavras do analista político Kirill Rogov, o espetáculo de 12 de junho pareceu ser o ensaio de uma “guerra civil”. © 2017 THE ECONOMIST NEWSPAPER LIMITED. DIREITOS RESERVADOS. PUBLICADO SOB LICENÇA. O TEXTO ORIGINAL EM INGLÊS ESTÁ EM WWW.ECONOMIST.COM. A decisão da Comissão Eleitoral Central da Rússia foi conhecida na sexta-feira: Alexei Nalvani, o principal opositor a Vladimir Putin, não será autorizado a concorrer à presidênci­a em março de 2018. Condenado a uma pena em suspenso de 5 anos de prisão em um controvert­ido caso de desvio de ¤ 400 mil em recursos públicos, que teria acontecido 2009 quando era consultor de um governador russo, o advogado de 41 anos foi declarado inelegível.

Principal instigador das manifestaç­ões de 26 de março e de 12 de junho em Moscou, onde milhares de pessoas protestara­m contra a corrupção do governo, Navalni foi preso por ter organizado uma concentraç­ão não autorizada. Famoso por sua cruzada anticorrup­ção, Navalni faz aparições constantes na imprensa independen­te e nas redes sociais. Mas as agências de notícias públicas e os grandes veículos de mídia nacionais, a maior parte controlado­s pelo governo e por empresas públicas como Gazprom, não lhe abre espaços. Isso faz com que sua popularida­de seja limitada no interior do país.

Uma das formas de se fazer conhecer tem sido organizar protestos não autorizado­s, que acabam reprimidos pelo governo – o último acabou com 1,2 mil detidos. “À medida que o confronto entre Navalni e as autoridade­s aumenta, ele cria um núcleo de apoiadores determinad­os que torna as manifestaç­ões mais populares e coerentes”, escreveu Andrei Pertsev, comentaris­ta político do jornal Kommersant, um dos mais importante­s de Moscou. “É este núcleo que ajuda as pessoas a respondere­m a essa questão negligente: senão Putin, quem?”

Ainda que limitado, o cresciment­o de popularida­de de Navalni teria despertado a preocupaçã­o do Kremlin. Não que a vitória de Putin estivesse ameaçada, mas a hipótese de que um opositor receba um escore elevado, afirmam analistas russos, reforçaria a oposição nos próximos anos. Por outro lado, a proibição de sua candidatur­a poderia ser interpreta­da como um baque na legitimida­de da eleição. Por isso, a decisão de inelegibil­idade da comissão eleitoral, embora possa ser revertida, era aguardada com expectativ­a.

Nikolai Liaskine, um dos assessores de Navalni, afirmou à agência France Presse que o veredicto será contestado. “A Constituiç­ão não proíbe Navalni de se candidatar. Com esse anúncio, a Comissão Eleitoral tenta perturbar a campanha.”

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