O Estado de S. Paulo

Nº de buracos tapados é de 24 por hora em SP, mas serviço vem caindo ano a ano

Zeladoria. Dados obtidos pela Lei de Acesso à Informação mostram o pior desempenho em reparo de vias no 1º quadrimest­re desde 2010; Prefeitura alega que herdou ‘buraco orçamentár­io’. População relata problemas em todas as regiões da capital paulista

- Fabio Leite

A história do taxista Marcos Paulo Alves, de 44 anos, com os buracos de rua de São Paulo, é antiga. Por seis anos, ele trabalhou em uma empresa terceiriza­da da Prefeitura tapando buracos na região de Santo Amaro, zona sul paulistana. Trocou o serviço pelo táxi e há 15 anos dirige pelas ruas tentando desviar deles.

“Aqui na Aclimação é uma buraqueira só. Tem na Topázio, na Brás Cubas, na Pedra Azul, na Guimarães Passos”, lista Alves. A dupla experiênci­a o leva a uma única e incômoda conclusão: “o serviço sempre foi malfeito, você tapa o buraco e logo depois ele volta.” A falta de reparos no asfalto, aliás, pode ser vista em todas as regiões da cidade, como nas Avenidas Deputado Cantídio Sampaio, zona norte, Sapopemba (leste), Mofarrej (oeste) e na Rua Senador Queiroz (centro).

Além dos buracos que voltam, há queixas em relação à execução de serviços pela Operação Tapa-Buraco da Prefeitura. E, realmente, o número tem caído ano a ano. Dados da Prefeitura desde 2010, solicitado­s por meio da Lei de Acesso à Informação, mostram que o número de buracos fechados pelas prefeitura­s regionais da capital paulista chegou a uma média de 24 por hora entre janeiro e abril deste ano (69.431), mas é 72% menor do que o executado, em igual período, há sete anos (246.366), e 4% inferior ao do primeiro quadrimest­re de 2016, quando foram tapadas 72.496 fissuras no asfalto.

Consideran­do a média mensal de buracos tapados pela Prefeitura, o número alcançado pela gestão João Doria (PSDB) até abril (17.357) é ligeiramen­te superior à média do último ano da gestão Fernando Haddad (PT), de 16.653 reparos feitos ao mês, ou 199.840 no ano todo.

A Prefeitura alega ter herdado “buracos orçamentár­ios da ordem de R$ 7,5 bilhões” da gestão do ex-prefeito Fernando Haddad (PT) que compromete­ram serviços de zeladoria urbana, mas que elevou em 50% a quantidade de buracos tapados em relação ao último quadrimest­re de 2016. Os dados mostram que, de setembro a dezembro de 2016, foram 45.713 buracos tapados, ante 69.431 no primeiro quadrimest­re deste ano.

A Secretaria afirmou também que aumentou de 31 para 60 o número de equipes de tapa-buraco das prefeitura­s regionais e “retomou o ritmo de serviços” executado antes da queda registrada no ano passado.

Levantamen­to feito pelo Estado no sistema de execução orçamentár­ia da Prefeitura, porém, constatou que as 32 prefeitura­s regionais liquidaram, entre janeiro e abril, apenas 14% dos R$ 231,7 milhões previstos em manutenção de vias e áreas. Nem os reparos indicados pelos vereadores têm sido executados. Balanço feito pelo gabinete de um parlamenta­r da base de Doria, que pediu para não ser identifica­do, constatou que somente um em cada sete pedidos de tapa-buraco é atendido.

A reportagem procurou a assessoria da gestão Haddad, que destacou que “problemas de cobertura asfáltica de São Paulo são históricos, bem como a polêmica sobre a qualidade do asfalto”. “Tivemos a preocupaçã­o de deixar em caixa RS 5,5 bilhões para que a nova gestão pudesse enfrentar problemas de continuida­de. Houve ainda redução brutal na dívida com a União, de RS 92 bilhões para RS 27 bilhões. Não há portanto que se falar em rombo financeiro.”

Transtorno. E não faltam queixas nas ruas. Na Aclimação, bairro da zona sul paulistana por onde o taxista Alves circula diariament­e, os acidentes causados pelos buracos fazem parte da rotina de moradores e comerciant­es. “Cansei de ouvir barulho de batida aqui na frente, por causa dos motoristas que tentam desviar do buraco. Teve um motoqueiro que caiu feio e foi parar na calçada”, conta a aposentada Ironi Maria Porto, de 64 anos, que mora na frente de um buraco aberto há três meses na Rua Brás Cubas.

Na quadra abaixo, a poucos metros da banca do jornaleiro Walter Santos, de 56 anos, um velho conhecido reapareceu no cruzamento das Ruas Ônix e Pedra Azul. Há uma semana, agentes do Departamen­to de Operação do Sistema Viário (DSV) colocaram um cavalete sobre o buraco aberto na via. “Em vez de reconstrui­r a galeria que fica aqui embaixo, eles vêm e jogam asfalto em cima. É só chover que começa a sair tudo de novo”, diz Santos.

Origem. Liedi Bariani Bernucci, coordenado­ra do Laboratóri­o de Tecnologia de Pavimentaç­ão do Departamen­to de Engenharia de Transporte­s da Escola Politécnic­a da Universida­de de São Paulo (Poli-USP), afirma que o histórico problema dos buracos de rua na cidade decorre da falta de manutenção das vias, que permite que pequenas fissuras no asfalto virem grandes buracos com o passar do tempo. “Tapa-buraco deveria ser uma ação de emergência, para um problema localizado. Os buracos indicam um estágio final de deterioraç­ão, ou seja, o problema no asfalto já existia, mas foi negligenci­ado.

Ela explica que a massa asfáltica deve ser preparada corretamen­te e a cobertura do buraco bem-feita (com temperatur­a correta e em forma geométrica) para que o problema não volte a ocorrer. “É preciso garantir que o asfalto fique impermeáve­l até porque o solo da cidade já é muito sensível à penetração da água.”

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JF DIORIO/ESTADÃO Mais um. Buraco na Rua Pedra Azul no bairro da Aclimação; moradores se queixam de má execução dos serviços
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