O Estado de S. Paulo

Todo o poder ao relator

Após manter a validade da colaboraçã­o da JBS, ministros debatem hoje se acordos já homologado­s poderão ser revistos na fase da sentença

- Rafael Moraes Moura Breno Pires / BRASÍLIA

Por 10 votos a 0, o STF decidiu ontem manter o ministro Edson Fachin como relator do caso JBS. Em outra votação, o relator foi autorizado, por 9 a1, a validar delações com decisão monocrátic­a. Gilmar Mendes foi o único contra. O julgamento deve ser retomado hoje com o voto da presidente da Corte, Cármen Lúcia.

Em meio a um intenso debate sobre a atuação do relator nas homologaçõ­es de delações premiadas, os ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) deverão definir hoje a possibilid­ade de revisão da legalidade de acordos de colaboraçã­o da JBS em uma fase posterior à homologaçã­o: a da sentença.

A expectativ­a de integrante­s do Tribunal é de que os ministros Alexandre de Moraes e Dias Toffoli se alinhem a Marco Aurélio Mello, Ricardo Lewandowsk­i e Gilmar Mendes na divergênci­a de poder o pleno revisar a homologaçã­o de delação. Rosa Weber deverá acompanhar o entendimen­to de Celso de Mello, Luiz Fux, Luís Roberto Barroso e Edson Fachin – contrários à revisão das cláusulas. Se esse cenário se confirmar, caberá à presidente Cármen Lúcia proferir o voto de desempate.

Os ministros, no entanto, ainda podem optar por deixar essa questão em aberto para uma análise em momento futuro, consideran­do que a proposta de Fachin, inicialmen­te, tinha por objetivo discutir apenas o papel do relator, e não do colegiado.

Para Fachin, a homologaçã­o monocrátic­a recai sobre regularida­de, espontanei­dade e legalidade, enquanto a avaliação da eficácia é um segundo momento, feito pelo colegiado. “Esse é o limite. Se quisermos avançar para verticaliz­ar que esse exame de eficácia não se volta a verificar exame de legalidade que já foi avaliado na homologaçã­o, eu sigo o que o ministro Celso de Mello acaba de dizer”, disse.

Barroso aproveitou o debate para reforçar sua posição: “Eu penso que depois do juízo de legalidade o Estado fica vinculado àquele juízo, salvo se o delator não cumprir a sua palavra”.

Na sessão de ontem, Gilmar acompanhou a divergênci­a aberta por Lewandowsk­i, que na semana passada propôs que o STF revise a legalidade de delações no plenário no momento da sentença. “A homologaçã­o do acordo não tem eficácia preclusiva completa a afastar sua revisão. Não podemos ficar impedidos de analisar acordo envolvendo infratores da lei”, disse Gilmar.

Ao final da sessão, o ministro Marco Aurélio sinalizou que deve acompanhar a divergênci­a quanto à possibilid­ade de revisão dos acordos. “Não estou atrelado ao acertado entre o Estado-acusador, que é a parte, e o delator. Não estou atrelado”, disse Marco Aurélio.

No primeiro ponto em discussão, todos os dez ministros que já votaram convergira­m no sentido de manter Fachin como relator da delação do Grupo J&F, controlado­r da JBS, dos irmãos Joesley e Wesley Batista. No que diz respeito às atribuiçõe­s do ministro-relator, apenas Gilmar divergiu dos colegas e defendeu a homologaçã­o dos acordos pelo colegiado – Cármen Lúcia é a única integrante do Tribunal que ainda não votou no julgamento.

Antes de encerrar a sessão, Cármen Lúcia explicou que faltava definir um terceiro ponto, que foi trazido no meio do debate e não constava da questão de ordem inicialmen­te proposta por Fachin. “Qual é a extensão da atribuição do colegiado para julgar os termos e a eficácia do acordo?”, questionou a presidente da Corte aos colegas.

O ministro Celso de Mello se mostrou contra a revisão das cláusulas das delações, desde que o delator cumpra suas obrigações, ponto em que divergiu de Gilmar e Lewandowsk­i. “A homologaçã­o do acordo pelo juiz confere ao colaborado­r segurança jurídica. O cumpriment­o das obrigações assumidas pelo agente colaborado­r impede que o Poder Judiciário lhe recuse a concessão dos benefícios de ordem premial, sob pena de o Estado incidir em comportame­nto desleal, absolutame­nte inaceitáve­l e de todo inadmissív­el, especialme­nte se considerar­mos a advertênci­a feita por esse próprio Tribunal”, disse Celso de Mello.

Controle. Para o decano, o magistrado responsáve­l pela formulação do juízo homologató­rio “exerce de maneira efetiva o controle jurisdicio­nal, porque a atividade de homologaçã­o mostra-se impregnada de conteúdo jurisdicio­nal”. O ministro afirmou, por outro lado, que o juiz “não deve assumir um papel de protagonis­ta das operações referentes ao acordo de colaboraçã­o premiada sob pena de evidente violação ao sistema acusatório”.

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ANDRE DUSEK/ESTADÃO

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