Justiça poderá usar WhatsApp em intimação
Conselho autoriza utilização de aplicativo ao julgar iniciativa de juiz de comarca goiana
Uma iniciativa do juizado Civil e Criminal da Comarca de Piracanjuba, município goiano com menos de 30 mil habitantes, em breve deve repercutir sobre a vida de milhões de usuários do WhatsApp.
O Conselho Nacional de Justiça (CNJ) aprovou por unanimidade o uso do aplicativo de troca de mensagens como ferramenta para intimações em todo o Judiciário em um processo que questionava o uso do WhatsApp na comarca goiana. Na cidade, as intimações às partes demoravam mais de cem dias e agora podem ser enviadas em tempo real pelo aplicativo a todos que concordarem com seu uso.
O juiz que tomou a iniciativa em Piracanjuba é Gabriel Consigliero Lessa, de 33 anos, que está na magistratura desde os 24 e passou por seis comarcas antes de se instalar no município, há quatro anos. “É preciso que os juízes novos sejam menos conservadores”, disse ao Estado.
Titular do juizado, o magistrado baixou uma portaria em conjunto com a seccional local da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), em março de 2015. Por cerca de oito meses, após reuniões com a sociedade local, conseguiu a adesão de mais 300 pessoas que concordavam com o sistema de intimações.
Uma das características da comarca, aponta Lessa, é o fato de muitos moradores trabalharem em outras cidades, tornando muito difícil, lenta e cara a localização das partes intimadas pelos oficiais de Justiça. Embora nunca questionada por nenhuma parte intimada, nem por defensores ou pelo Ministério Público, a portaria foi combatida pelo próprio Judiciário, com sua revogação determinada pela Corregedoria-Geral do Tribunal de Justiça de Goiás, que proibiu o uso do aplicativo poucos meses após iniciado o trabalho.
O argumento contrário focou na falta de regulamentação para a utilização do WhatsApp, pertencente a uma empresa estrangeira (Facebook), como meio de agilizar atos judiciais. Também foram citadas redução da força de trabalho no TJ-GO e ausência de sanções processuais nos casos em que a intimação não for atendida. Lessa, cuja iniciativa foi destaque no Prêmio Innovare de 2015, recorreu junto à Corregedoria e, tendo o pedido negado, protocolou no CNJ um Procedimento de Controle Administrativo (PCA), contestando a decisão.
Além de acelerar o rito administrativo para cumprir cada intimação, que exige número de oficiais de Justiça geralmente insuficiente nas comarcas, o juiz enfatiza que o processo sai mais barato aos cofres públicos, contabilizando menos viagens, menor número de papéis impressos e de pessoas necessárias para garantir uma intimação. Lessa estima que, em média, no Brasil, cada intimação custe mais de R$ 100. “Se um juiz como eu pode fazer mil intimações por semana, de quanto seria a economia se muitas delas fossem pelo aplicativo?”
Simplicidade. A conselheira Daldice Santana, relatora do processo no CNJ, apontou que a medida do juiz goiano reforça o microssistema dos Juizados Especiais, orientados pelos critérios da oralidade, simplicidade e informalidade. Segundo divulgou o CNJ, a relatora considerou que a portaria preocupou-se em detalhar toda a dinâmica para o uso do aplicativo, estabelecendo regras e penalidades para o caso de descumprimento “e não extrapolou os limites regulamentares, pois apenas previu o uso de uma ferramenta de comunicação de atos processuais, entre tantas outras possíveis”.
Da decisão do CNJ cabe recurso diretamente ao Supremo Tribunal Federal (STF).