Brasil e OCDE – a inflexão necessária
Otema da adesão do Brasil à Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) ganhou, nos últimos meses, crescente e justificada relevância na agenda da política externa brasileira e da política de comércio exterior. A reflexão brasileira sobre o tema não é nova. Em 1992 missão diplomática à OCDE examinou durante uma semana o funcionamento de suas várias instâncias e a relevância da organização para o Brasil.
O histórico de nosso relacionamento com a OCDE revela a criação, em 1998, de um programa direcionado ao Brasil e, a partir de 2007, a promoção pela organização do “engajamento ampliado” com um grupo selecionado de países – Brasil, China, Índia, Indonésia e África do Sul – com vista a possível acessão. Esses cinco países receberam em 2012 o status de “parceiro-chave” (key-partner), equivalente a uma pré-qualificação para o processo de acessão.
Em 3 de julho de 2015 foi assinado o acordo de cooperação, bem como um programa de trabalho específico até 2017, com previsão de um conjunto de ações, tais como visitas de funcionários de alto nível; estudos conjuntos; avaliação de políticas setoriais e nacionais; intercâmbio de informações e troca de dados estatísticos; colaboração entre especialistas e funcionários do Brasil e da organização, por meio de missões, cessão temporária ou empréstimo de integrantes do quadro funcional da OCDE, bem como de autoridades e especialistas brasileiros.
O Brasil é o país não membro que participa do maior número de instâncias da organização, tendo já aderido a 31 instrumentos legais da OCDE. O atual processo de reforma das políticas públicas em curso no Brasil motivou uma ação interministerial com o objetivo de imprimir mais celeridade à avaliação da adesão à OCDE.
Diante desse quadro, uma primeira pergunta seria: qual a relevância para o Brasil da adesão à OCDE?
Superado o contexto da guerra fria e do conflito Norte-Sul, a partir dos anos 1990 prevaleceu crescente liberalização comercial e globalização dos mercados, fenômenos marcados pela proliferação de acordos de livre-comércio e pela ampliação das cadeias globais de valor. Os destinos da economia internacional, moldados pela emergência dos chamados novos temas – sustentabilidade, convergência regulatória em temas tributários, questões laborais, padrões privados – tornam mais relevantes organizações com vocação para o aprimoramento e o desenvolvimento de políticas públicas no sentido mais amplo.
Nesse contexto, a OCDE figura como centro de excelência com capacidade de influenciar diversas áreas, tais como comércio internacional, arranjos regulatórios, combate à corrupção, acordos de tributação, bem como políticas macroeconômicas, trabalhistas, educacionais e ambientais. Importantes arranjos internacionais são tecidos no âmbito da OCDE e a ausência do Brasil o distancia desse processo.
No âmbito da organização são examinadas e debatidas políticas públicas de um conjunto amplo de 35 países-membros, na sua quase totalidade países desenvolvidos.
Entre os ganhos derivados da adesão do Brasil à OCDE destacam-se:
Contribuição à adoção de políticas públicas voltadas para o equilíbrio macroeconômico, a abertura comercial, a justiça social e, para respaldar no plano internacional, a relevância das reformas atualmente em curso no País;
atenuação de efeitos na perda do grau de investimento;
sinalização clara ao mercado e à comunidade internacional do compromisso do Brasil com os princípios de uma economia aberta, previsível, responsável e transparente;
fortalecimento da credibilidade e da propensão ao investimento estrangeiro no Brasil, pois os países desenvolvidos, responsáveis pela quase totalidade desse investimento, tenderão a identificar maior estabilidade na política macroeconômica brasileira;
compreensão maior sobre posicionamentos técnicos brasileiros, uma vez que na condição de membro o Brasil terá oportunidade de debater temas relevantes de políticas públicas num contexto multilateral e de dar visibilidade às suas opções;
aumento significativo do espaço para iniciativas de cooperação triangular entre o Brasil, países em desenvolvimento e membros da OCDE;
ampliação dos benefícios associados a uma inserção internacional mais diversificada, voltada tanto para países em desenvolvimento como para países desenvolvidos;
acesso mais efetivo ao debate sobre fronteira do conhecimento em políticas tecnológicas, econômicas e sociais, já que a OCDE é um locus privilegiado de diálogo sobre políticas públicas;
e sinalização para que parceiros regionais avancem na mesma direção.
Na América Latina, o Chile e o México já são membros plenos da OCDE. A Costa Rica e a Colômbia negociam adesão, a Argentina e o Peru solicitaram a acessão e o Uruguai sonda a possibilidade de aderir.
Embora já participe de várias instâncias da OCDE, a acessão plena simbolizará o compromisso de longo prazo do Brasil com as boas práticas internacionais. Isso contribuirá para a consistência das políticas macroeconômicas e sociais, tornando o País mais imune à deterioração da economia, do tecido social e da estabilidade política. A adesão do País à OCDE poderá significar também inflexão de nossa política externa convergente com as grandes transformações da ordem internacional.
RESPECTIVAMENTE, DIRETOR DE ESTUDOS E RELAÇÕES ECONÔMICAS E POLÍTICAS INTERNACIONAIS DO DINTE/IPEA, PROFESSOR DO INSTITUTO RIO BRANCO/MRE, FOI EMBAIXADOR NO MÉXICO E EM GENEBRA (ONU); COORDENADORA DE ESTUDOS EM RELAÇÕES ECONÔMICAS INTERNACIONAIS DO DINTE/IPEA, FOI SECRETÁRIA EXECUTIVA DA CÂMARA DE COMÉRCIO EXTERIOR (CAMEX); E TÉCNICO DE PLANEJAMENTO E PESQUISA DO IPEA
Adesão simbolizará o compromisso de longo prazo do País com boas práticas internacionais