A paz na Colômbia
Acerimônia na qual o governo colombiano, dirigentes das Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (Farc) e o representante da Organização das Nações Unidas (ONU) celebraram a completa deposição das armas do grupo guerrilheiro, que por mais de meio século atormentou a população, foi considerada pelo presidente Juan Manuel Santos “um símbolo do novo país que queremos ser”. Há, de fato, muito simbolismo no ato realizado na terça-feira passada na cidade de Mesetas, no centro da Colômbia.
Para alguns, com a entrega das armas, as Farc deixam de existir como o grupo guerrilheiro de inspiração marxista que se valeu do narcotráfico e da violência – sequestros, assassinatos, emboscadas estavam entre suas ações mais frequentes – para manter a Colômbia sob permanente tensão e insegurança. O ato representa também uma vitória política de Santos, que desde 2012 vinha procurando uma solução pacífica que pusesse fim à sangrenta trajetória que as Farc vinham percorrendo desde 1964, o que seu antecessor Álvaro Uribe procurou fazer com o emprego da força militar.
O ato marcou o fim do processo, iniciado em março, de entrega das armas dos 7 mil membros das Farc. As armas foram trocadas por palavras, disseram o presidente colombiano e o líder das Farc, Rodrigo Londoño, o Timochenko. Desarmados, os antigos guerrilheiros agora deverão buscar o retorno à vida social e política convencional da qual estiveram afastados por tanto tempo.
Prevê-se que não será uma reintegração fácil em muitos casos. No interior da Colômbia, nas regiões mais afetadas pela longa atuação da narcoguerrilha, parte da população duvida da sinceridade dos antigos combatentes que declararam sua intenção de abandonar as atividades ilegais, especialmente o narcotráfico.
Não será fácil esquecer os mais de 50 anos de guerra, que causou mais de 220 mil mortes, o desaparecimento de 45 mil pessoas e a expulsão de 6,9 milhões de colombianos de suas casas. Além disso, as Farc sequestram pessoas para arrecadar dinheiro necessário para sustentar suas atividades criminosas. Nesse período, a guerrilha tornou-se responsável por mais da metade do tráfico de drogas na Colômbia.
Entre antigos guerrilheiros, há queixas quanto ao descumprimento das promessas feitas pelo governo para facilitar seu retorno às atividades normais, como a oferta de casas de alvenaria com água corrente e luz elétrica.
Essas incertezas e dúvidas não tornam menos importante o acordo de paz que o presidente Juan Manuel Santos conseguiu negociar. Houve dificuldades ao longo das discussões, como a resistência do expresidente Uribe e seus partidários aos termos que Santos vinha negociando com dirigentes das Farc.
A versão do acordo assinada em junho do ano passado em Havana, com a presença do então secretário-geral da ONU, Ban Ki-moon, e revisada alguns meses depois para a eliminação das pendências, acabou sendo rejeitada pela população no plebiscito realizado em outubro. O governo de Santos e dirigentes das Farc retomaram as negociações e concluíram novo acordo, incluindo parte das objeções que afloraram no plebiscito. Foram estabelecidas novas condições para o julgamento dos criminosos da guerrilha, mas foi mantida a possibilidade de ingresso dos não condenados na vida política.
A entrega das armas pelos antigos guerrilheiros abre o caminho para que eles criem um partido para disputar as eleições. Um projeto de lei assegura que, nas duas próximas eleições, esse partido terá um número mínimo de assentos no Senado e na Câmara de Representantes. Os antigos guerrilheiros que se enriqueceram com o narcotráfico, porém, não serão anistiados. Ainda está em discussão a criação da Jurisdição Especial para a Paz, tribunal que terá a incumbência de julgar ex-guerrilheiros acusados de crimes de lesa-humanidade.
Novas decisões terão de ser tomadas num ambiente político cada vez mais marcado pela campanha pré-eleitoral, na qual a oposição ligada ao ex-presidente Uribe ganha força.