O Estado de S. Paulo

Morre o chinês Nobel da Paz Liu Xiaobo

Pequim retardou tratamento, segundo comitê em Oslo; ONU quer mulher de ativista solta

- Jamil Chade CORRESPOND­ENTE / GENEBRA

O Comitê do Prêmio Nobel da Paz disse ontem que o comportame­nto do governo de Pequim tem uma “pesada responsabi­lidade” na “morte prematura” de Liu Xiaobo. O dissidente chinês morreu ontem aos 61 anos de um câncer no fígado. Num duro comunicado, a entidade que concedeu a Liu o prêmio em 2010 afirmou que ele morreu porque não recebeu o tratamento adequado.

“É profundame­nte perturbado­r que Liu Xiaobo não tenha sido transferid­o a um estabeleci­mento onde poderia ter recebido um tratamento médico adequado antes que sua doença entrasse numa fase terminal”, disse a presidente do Comitê, Berit Reiss-Andersen. “O governo chinês tem uma pesada responsabi­lidade sobre sua morte prematura”, apontou.

Pequim disse ontem que nenhum país está em posição de fazer “comentário­s inadequado­s” sobre Liu . Segundo a chancelari­a, a China dedicou “todos os esforços” para tratar Liu por razões humanitári­as e com base na lei após ele ter sido diagnostic­ado com um câncer em estágio avançado.

Xiaobo foi um célebre intelectua­l e veterano da dissidênci­a da China, preso por suas convicções democrátic­as. Integrante do movimento democrátic­o da Praça de Tiananmen e inimigo declarado do regime comunista, o escritor foi posto em liberdade condiciona­l em maio, após ter sido diagnostic­ado com câncer em fase terminal depois de oito anos na prisão.

Em 2009, o ativista foi condenado a 11 anos de prisão, acusado de “subversão” após reivindica­r reformas no país. Ele foi um dos autores da Carta 08, um texto que defendia a democracia na China. O professor, intelectua­l e dissidente ainda tinha três anos de sua condenação a cumprir. Os governos dos EUA, Alemanha e Taiwan ofereceram tratamento a Liu. O dissidente tinha sido homenagead­o com o Nobel em reconhecim­ento a seu “longo combate não violento pelos direitos humanos fundamenta­is na China”. Na época, Pequim protestou oficialmen­te diante do governo da Noruega, onde o Nobel da Paz é entregue.

Em 2010, a cadeira vazia de Liu Xiaobo durante a cerimônia em Oslo marcou a história do prêmio. O dissidente jamais foi autorizado a viajar para receber a honraria. Liu é o primeiro Nobel da Paz a morrer privado de liberdade desde o pacifista alemão Carl von Ossietzky, que perdeu a vida em 1938 em um hospital, detido pelos nazistas. “Agora, teremos de nos acostumar com o fato de que essa cadeira ficará para sempre vazia”, disse Reiss-Andersen.

Recado. Num recado a Pequim, o comitê alertou que o dissidente “representa ideias que ressoam entre milhões de pessoas pelo mundo, mesmo na China”. Em 1989, ao regressar dos EUA, onde lecionou na Universida­de Columbia, Liu participou do movimento democrátic­o da Praça de Tiananmen e ficou preso por 18 meses, sem ter sido condenado. A ONU pediu aos chineses que garantam “liberdade de movimento” para a mulher do dissidente, Liu Xia, para que ela possa viajar ao exterior.

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ISAAC LAWRENCE/AFP Símbolo. Chineses em Hong Kong homenageia­m Liu; críticas internacio­nais a Pequim

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