O Estado de S. Paulo

Novo Refis reduz arrecadaçã­o para R$ 420 milhões

Governo contava com esse recurso para liberar parte do Orçamento que está bloqueada; texto de deputado prevê perdão de 73% da dívida negociada

- Adriana Fernandes Idiana Tomazelli/BRASÍLIA COLABORARA­M DANIELA AMORIM E FERNANDA NUNES

Levantamen­to do Ministério da Fazenda concluiu que mudanças feitas pelo deputado Newton Cardoso Jr. (PMDB-MG) no texto do Refis, com descontos maiores do que o governo estava disposto a negociar, podem derrubar a arrecadaçã­o de R$ 13,3 bilhões para R$ 420 milhões. As alterações ameaçam cumpriment­o da meta fiscal.

Negociação. Alterações feitas no Congresso resultaram em descontos muito maiores do que a equipe econômica estava disposta a negociar no programa de parcelamen­to de dívidas; governo contava com esse recurso para liberar parte do Orçamento

As mudanças feitas pelo deputado Newton Cardoso Jr. (PMDB-MG) no texto do novo Refis proposto pelo governo colocaram em risco o cumpriment­o da meta fiscal deste ano e podem impor um perdão de 73% da dívida a ser negociada no programa de parcelamen­to. O levantamen­to do impacto feito pela área técnica do Ministério da Fazenda, obtido pelo ‘Estadão/Broadcast’, mostra que a arrecadaçã­o prevista para 2017 pode derreter, passando de R$ 13,3 bilhões para apenas R$ 420 milhões.

O tamanho do buraco não só surpreende­u negativame­nte a equipe econômica como criou um imbróglio político para o governo, que precisará reverter o estrago feito no relatório em meio à busca de votos para barrar a denúncia contra o presidente Michel Temer.

Os técnicos começaram a trabalhar nos cálculos na quintafeir­a à noite, após a divulgação do relatório final na página de acompanham­ento da Medida Provisória (MP) 783, que instituiu o Refis. O sentimento é de indignação com a nova tentativa do relator de emplacar descontos praticamen­te integrais nos encargos da dívida.

Uma fonte da área econômica que trabalhou no levantamen­to afirma que as mudanças são absurdas e mostram irresponsa­bilidade do relator. A avaliação é de que não se trata mais de um programa de resolução de passivos, mas sim de perdão de dívidas, uma vez que até débitos sonegados ou gerados por fraude poderão ser parcelados. O impacto final assustou os técnicos, que nos cálculos preliminar­es previam que a arrecadaçã­o diminuiria a R$ 3 bilhões neste ano.

O ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, disse ontem à tarde em evento no Rio que as receitas com o Refis, nos moldes do relatório, ficariam “bem baixas”, próximas a R$ 1 bilhão. Mas a conta final ficou ainda menor, abaixo dos R$ 500 milhões.

Orçamento. As mudanças ainda trazem uma dor de cabeça adicional à equipe econômica, que contava com os recursos do Refis para conseguir liberar, na semana que vem, parte do Orçamento que está bloqueada justamente por falta de receitas. Quando lançou o primeiro Programa de Regulariza­ção Tributária (PRT), o governo incluiu uma previsão de arrecadaçã­o de R$ 8 bilhões. Diante da nova MP, a intenção era incluir nas estimativa­s os R$ 5,3 bilhões adicionais, o que agora pode não ocorrer.

A área econômica se sente traída pelos parlamenta­res, pois a MP 783 foi resultado de acordo amplamente negociado com o Congresso. O que se viu, no entanto, foi uma atuação rápida dos deputados e senadores para elaborar o relatório. Houve apenas uma audiência pública para debater a medida, e o parecer foi lido e aprovado já na quarta reunião da comissão mista, em sessão que durou menos de 50 minutos.

O texto apresentad­o inicialmen­te por Cardoso Jr. não trazia as principais mudanças, que mexeram, por exemplo, no valor dos descontos. Essas alterações foram incluídas por meio de destaques (mudanças específica­s) acatados pelo relator, sem detalhamen­to do conteúdo nem votação pelo plenário.

Os parlamenta­res têm interesse no Refis, pois muitos deles têm empresas com dívidas tributária­s, como já divulgou a Procurador­ia-Geral da Fazenda Nacional (PGFN). Técnicos do governo apontam que Cardosos Jr. legisla em causa própria porque é dono de empresas

que possuem dívidas com a União. A reportagem ligou diversas vezes para o celular do deputado, mas não foi atendida.

O impacto das mudanças sobre a arrecadaçã­o é grande, porque o relator elevou os descontos máximos sobre juros e multas para 99%, na modalidade em que o contribuin­te, depois da entrada de 20% da dívida

este ano, paga o restante em parcela única em janeiro de 2018. Ao mesmo tempo, ele tirou a atrativida­de dessa modalidade, pois dá descontos pouco menores, de 90% e 85% para pagamentos parcelados em 145 e 175 meses, respectiva­mente.

O deputado ainda estendeu a um maior número de empresas o benefício de pagar uma entrada menor que os 20%. Antes, podiam acessar esse recurso contribuin­tes com dívidas de até R$ 15 milhões, mas essa referência aumentou dez vezes, para R$ 150 milhões. A alíquota especial de entrada também foi reduzida de 7,5% para 2,5%. Tudo para exigir menos dos devedores.

O impacto sobre a arrecadaçã­o do governo é maior porque o relator reintroduz­iu a modalidade que prevê a possibilid­ade de pagar uma entrada de 24% da dívida parcelada em 24 meses e abater o restante com créditos fiscais. Se todas essas mudanças forem aprovadas pelos plenários da Câmara e do Senado, o Ministério da Fazenda vai recomendar o veto da medida.

No final da noite de ontem, por meio de nota, Cardoso Jr. contestou as contas feitas pelo Ministério da Fazenda. “Não houve mudança no porcentual de entrada de 20% a incidir ainda neste ano, sem redução de multas e juros. Logo, não é verdade que o governo irá arrecadar apenas um valor próximo a R$ 1 bilhão. Mesmo rechaçando esta suposição, ainda que o parcelamen­to arrecade valor inferior, não há como precificar a retomada dos empregos e da atividade econômica do setor produtivo, altamente impactado pela crise”, disse. /

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LUCIO BERNARDO JR. / CÂMARA DOS DEPUTADOS Edição. Texto inicial de Cardoso Jr. não trazia mudanças

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