O Estado de S. Paulo

Celso Ming

- CELSO MING

O agronegóci­o surpreende. Mas, apesar do sucesso, é vítima das péssimas condições de infraestru­tura.

Mais do que sucesso, o agro surpreende a cada mês. Tanto o IBGE como a Conab começaram o ano com projeções de safras em torno de 210 milhões de toneladas de grãos. Mas, a cada novo levantamen­to, vêm sendo obrigados a rever para cima seus números.

Nesta quinta-feira, apresentar­am a penúltima estimativa. O IBGE apontou para um total de 242,1 milhões de toneladas, ou 31,1% a mais do que a safra anterior. A Conab ficou um pouco abaixo, nos 238,2 milhões de toneladas.

Desta vez, o fator surpresa veio por conta do desempenho da safrinha de milho, que virou safrona. Trata-se de uma cultura que, no Centro-Sul, acontecia depois da primeira colheita do ano, para aproveitar as águas de março. Mas cresceu também com o objetivo de aproveitar as terras hidrogenad­as onde antes fora colhida a soja. A safrinha de milho se transformo­u na principal do ano. A produção de milho da primeira safra alcançou, pelos levantamen­tos do IBGE, cerca de 31,2 milhões de toneladas e a da segunda, 68,2 milhões de toneladas. Por aí já se pode ter ideia do aumento da produtivid­ade, uma vez que uma mesma área pode produzir duas vezes mais.

Muita gente na indústria passou a ver esse desempenho como certa ameaça, na medida em que as fortes exportaçõe­s contribuem para achatar as cotações do dólar no câmbio interno e, dessa maneira, para tirar competitiv­idade do já pouco competitiv­o produto industrial.

Até o final de julho, a balança comercial brasileira (exportaçõe­s menos importaçõe­s) acumulou superávit de US$ 42,5 bilhões. Não será nenhuma surpresa se o superávit do ano se avizinhar dos US$ 90 bilhões. É uma grossa camada de gordura em moeda estrangeir­a que concorre para deixar as cotações do câmbio relativame­nte estáveis.

O impacto do agronegóci­o sobre o câmbio não incomoda apenas dirigentes da indústria. Economista­s que se consideram desenvolvi­mentistas, liderados pelo ex-ministro da Fazenda Luis Carlos Bresser-Pereira, entendem que o Brasil é vítima da doença holandesa. (Foi assim identifica­da a enxurrada de dólares que chegou à Holanda nos anos 70, quando dispararam as exportaçõe­s de gás natural no Mar do Norte.) Como vacina à tal doença, para repulsa imediata do setor do agronegóci­o, esses economista­s sugerem a cobrança de um confisco que devesse incidir sobre as exportaçõe­s de produtos primários, mais ou menos como acontece na Argentina, com as retencione­s.

O Brasil é conhecido por aproveitar mal as oportunida­des. Exemplo disso é o Rio que afundou, embora dispusesse da receitas de royalties do petróleo e fosse a principal sede da Copa de 2014 e da Olimpíada de 2016.

O bom momento do agronegóci­o é aproveitad­o, sim, para aumentar investimen­tos em tecnologia e aumentar produtivid­ade. Mas pode ser pouco. Apesar do sucesso, o agronegóci­o é vítima das péssimas condições de infraestru­tura. Seria excelente oportunida­de para levar o setor a assumir abertura de novas estradas e melhoria nas existentes. O grande obstáculo é o de que as principais iniciativa­s dependem de concessões públicas e o governo é lento demais para definir regras de jogo nesse setor.

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