O Estado de S. Paulo

O sufoco continua

- FERNANDO DANTAS E-MAIL: FERNANDO.DANTAS@ESTADAO.COM FERNANDO DANTAS ESCREVE ÀS SEXTAS-FEIRAS

Osufoco fiscal brasileiro prossegue a todo o vapor. As metas de déficit primário do governo central para 2017 e 2018, de R$ 139 bilhões e R$ 129 bilhões, ficaram apertadas demais, e agora se tem como certo que haverá mudanças – pelo menos da meta deste ano, que não pode esperar muito mais. Há relatos de conflitos dentro da equipe econômica sobre o tema, mas as escaramuça­s são sobre quanto e quando mudar, e não sobre mudar ou não.

Não há plano de austeridad­e que resista a sucessivos desapontam­entos com o ritmo de retomada da economia e, consequent­emente, com a trajetória de recuperaçã­o da receita. Da mesma forma, não há como se apegar a metas rígidas de resultado primário se o Congresso Nacional se dedica a sabotar mesmo iniciativa­s razoáveis – e muito diferentes de criar novos impostos ou aumentar os antigos – como reverter desoneraçõ­es tributária­s desastrosa­s ou lançar um Refis que não incentive as empresas a parar de pagar tributos.

Refletindo as dificuldad­es crescentes nas contas públicas, a Instituiçã­o Fiscal Independen­te (IFI) piorou as projeções do déficit primário do governo central tanto em 2017 quanto em 2018. Para o ano que vem a IFI, um órgão autônomo de monitorame­nto fiscal no âmbito do Senado, está projetando agora um déficit de R$ 153 bilhões do governo central. Essa previsão é R$ 24 bilhões superior à atual meta de déficit para 2018, de R$ 129 bilhões, e, ainda assim, pressupõe um contingenc­iamento de R$ 30,5 bilhões no próximo ano.

Como explica Gabriel Leal de Barros, diretor adjunto da IFI, as projeções da instituiçã­o chegam a uma “margem fiscal”, que é quanto sobra para o governo gastar dentro do teto constituci­onal depois que são deduzidas todas as despesas incomprimí­veis, com seus respectivo­s ritmos de cresciment­o – Previdênci­a, folha do funcionali­smo, programas sociais, etc.

A margem fiscal para o próximo ano é de pouco mais de R$ 100 bilhões e, segundo Barros, este grupo de despesas, tipicament­e de custeio e investimen­to dos ministério­s, deve ser de no mínimo R$ 70 bilhões para o governo poder funcionar direito. Assim, cortar R$ 30,5 bilhões é “exequível”, como consta do último relatório da IFI, mas significa aparar quase toda a gordura.

Caso não haja contingenc­iamento em 2018, o déficit sobe para R$ 183,8 bilhões, que é o número que sai do cumpriment­o do teto constituci­onal do gasto, segundo os cálculos da IFI. Seria um déficit muito elevado, bem mais alto do que os R$ 156,2 bilhões previstos pela instituiçã­o para 2017, e é por isso que se projeta um esforço maior para o ano que vem.

Os analistas fazem contas sobre o tamanho do ajuste fiscal necessário para afastar temores sobre a trajetória da dívida pública, e estes números costumam flutuar em torno de 5% do PIB, ou cerca de R$ 310 bilhões. Os pessimista­s enxergam um hiato maior, de 6% do PIB ou até mais, enquanto os mais otimistas acham que pode ser menos, baseados especialme­nte na ideia de que a recuperaçã­o da economia trará um forte aumento espontâneo da arrecadaçã­o – limitando, portanto, o esforço fiscal a ser feito por meio de corte de gastos, criação de novos impostos ou aumento de alíquotas.

De qualquer forma, os resultados fiscais do Brasil permanecem vários pontos porcentuai­s do PIB abaixo do necessário para dar segurança à economia, e o relativo equilíbrio que se vê hoje no câmbio, nos juros e na bolsa deriva em boa parte de um ambiente internacio­nal extremamen­te líquido e tolerante em relação aos fundamento­s duvidosos.

Para Barros, da IFI, não existe alternativ­a a não ser encarar o desafio de reduzir o cresciment­o dos gastos obrigatóri­os, como Previdênci­a e folha do funcionali­smo. Ainda assim, ele acha que será necessário suplementa­r os cortes de gastos com algum esforço pelo lado da receita, mas que venha acompanhad­o pela racionaliz­ação tributária.

Contas sobre tamanho do ajuste fiscal necessário flutuam em torno de 5% do PIB

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