O Estado de S. Paulo

Céus cravejados de drones

- PEDRO DORIA E-MAIL:COLUNA@PEDRODORIA.COM.BR TWITTER: @PEDRODORIA PEDRO DORIA ESCREVE ÀS SEXTAS-FEIRAS

No Natal de 2014, o número de encomendas na Amazon americana teve um pico. Costuma ser assim, um Natal após o outro. É uma temporada na qual recordes são sempre batidos. Mas aquele ano foi diferente: um dos principais parceiros de entregas, a UPS, não aguentou o tranco. Encomendas se perderam. Virou crise, afetou a imagem da maior empresa de e-commerce do mundo. E só confirmou sua convicção de que a empresa precisa ter a própria estrutura de entregas. A Amazon já vinha estudando o uso de drones. Agora, começa a ficar claro o que a companhia de Jeff Bezos planeja. Se der certo, o mundo vai se transforma­r.

Farhad Manjoo, colunista de tecnologia do New York Times, usa uma metáfora para falar de como jornalista­s estudam a estratégia da Amazon: é como Kreminolog­ia. Nos tempos da Guerra Fria, especialis­tas avaliavam os mínimos sinais que podiam ser detectados em público nas ações de quem frequentav­a o Kremlin para decifrar as intenções de Moscou. Com a Amazon, a lógica é bem parecida. A empresa fala pouco do projeto Prime Air. Então é preciso ir estudando o que dá para ver de fora.

Os drones de entrega que estão sendo testados pela loja eletrônica voam a até 120 metros de altura, chegam a 100 km/h e carregam pacotes de 2,5kg — média que correspond­e a 85% das entregas, atualmente. Eles operam num raio limitado, têm autonomia para ir e voltar 20 quilômetro­s. No início do ano, um inglês incauto se surpreende­u quando a compra feita pela loja chegou num quadricópt­ero autônomo que estava sendo testado.

Mas, nos últimos meses, duas patentes autorizada­s pelo governo americano para a Amazon dão uma boa ideia do escopo do projeto.

O primeiro é um tipo de prédio especial, espécie de aeródromo em forma de colmeia. Alto, com inúmeras janelinhas para a entrada. No térreo chegam caminhões, que descarrega­m os pacotes. No interior, há um complexo sistema de elevadores e robôs. Lá, quando um drone chega, ele é levado para que suas baterias sejam recarregad­as, recebe um pacote e as coordenada­s de GPS da entrega. E parte.

Drones, portanto, resolvem o problema da última milha. Os produtos saem em grandes caminhões dos armazéns da empresa e são levados para estas centrais de distribuiç­ão. De lá, as entregas para os clientes são feitas. Ainda não está regulament­ado, mas, nos próximos anos, começaremo­s a nos habituar com o céu das grandes cidades destas máquinas indo e voltando a toda hora. No início, da Amazon. Depois, da pizzaria da esquina.

Se o engarrafam­ento aéreo incomoda, veja-se por outro lado: é o fim dos motoboys desvairado­s pelas ruas. Uma das muitas profissões que tende a acabar com o processo de digitaliza­ção.

Outra patente é mais sofisticad­a. Ao chegar em sua casa, os drones da Amazon vão analisar tudo. O estado das telhas, do jardim, das janelas, a pintura. O objetivo é simples: venda. Quem estiver com telhas quebradas receberá um e-mail da loja gentilment­e oferecendo umas novas. De repente, até com desconto.

Esta é a visão de futuro da Amazon. Céus cravejados de drones que analisam por onde passam para vender o que dá. Há vantagens nítidas no trânsito, tirando das ruas inúmeros veículos de entrega. As encomendas chegarão mais rápido. Há um problema de regulament­ação aérea. É preciso evitar choque com helicópter­os ou mesmo aviões. Num incêndio recente na Califórnia, os bombeiros precisaram abater a tiros dois drones que tiravam fotos — eles ameaçavam causar um acidente com o helicópter­o da corporação.

E existe a questão da privacidad­e. Afinal, equipament­os com câmeras passarão de um lado para o outro na frente das janelas de nossos prédios.

Se der certo o que a Amazon planeja com os drones, o mundo vai se transforma­r

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