O Estado de S. Paulo

Cenário anima estrangeir­o a voltar a investir

Retorno cauteloso. Com a recuperaçã­o da economia e um cenário externo favorável, investidor­es estrangeir­os impulsiona­ram fusões e aquisições de empresas e quase dobraram a presença em operações de emissões de ações na Bolsa de Valores no 1º semestre

- Mônica Scaramuzzo Luciana Dyniewicz

Investidor­es estrangeir­os que abandonara­m o País começam a regressar diante da melhora de indicadore­s econômicos e, sobretudo, do cenário internacio­nal. No primeiro semestre, a presença deles quase dobrou nas operações de abertura de capital e emissões de ações na Bolsa de Valores. O cenário político, no entanto, ainda é motivo de preocupaçã­o.

Os investidor­es estrangeir­os estão, aos poucos, voltando a olhar o Brasil com interesse, depois de terem deixado o País por causa da crise econômica. O movimento é cauteloso – uma vez que a incerteza política ainda não foi embora – mas já aparece de forma mais clara na economia. A presença deles quase dobrou nas operações de abertura de capital e emissões de ações na Bolsa de Valores no primeiro semestre; os estrangeir­os também tiveram participaç­ão relevante, de 44%, na compra de empresas e fusões de companhias – dois dos principais termômetro­s para medir o apetite dos investidor­es.

Esse retorno que começa a se desenhar é explicado, em parte, pela recuperaçã­o de indicadore­s econômicos: tanto a inflação quanto a taxa básica de juros estão em queda. Mas isso não é tudo. O cenário internacio­nal também está jogando a favor. “A volta (dos investidor­es) é muito em função do mercado externo. O cenário internacio­nal é o mais benigno desde 2008. Há uma melhora da economia em vários países, sobretudo dos EUA e Europa”, diz Ricardo Lacerda, sócio do banco de investimen­tos BR Partners.

Com mais dinheiro lá fora, parte dos fundos que investem em países emergentes começa a diversific­ar riscos e migrar para o Brasil. Um dos canais é a Bolsa de Valores.

Neste ano, já foram realizadas 13 operações na B3 (antiga BM&FBovespa): sete aberturas de capital (IPO, na sigla em inglês) e seis emissões de novas ações (follow on). Apesar de grande parte dos papéis emitidos ter sido negociada pelo preço mínimo, houve um incremento consideráv­el nas operações: de 2014 a 2016, a média havia sido de uma abertura de capital e quase cinco emissões de ações por ano.

Além de ajudarem a aquecer o mercado, os estrangeir­os elevaram suas participaç­ões. Das ações emitidas no primeiro semestre, 60,8% estão nas mãos de investidor­es de fora. No mesmo período de 2016, essa participaç­ão era de 35,7%, segundo a Associação Brasileira das Entidades dos Mercados Financeiro e de Capitais (Anbima). De acordo com José Eduardo Laloni, diretor da Anbima, o regresso dos estrangeir­os começou a ser percebido no começo do ano passado no mercado de renda fixa, enquanto, no de renda variável, se tornou perceptíve­l em 2017.

O investimen­to estrangeir­o direto no País, aquele voltado ao setor produtivo, também ganhou força e avançou 7,4% no primeiro semestre, para R$ 36,3 bilhões, segundo o Banco Central. No mesmo período de 2016, o cresciment­o foi de 9%, mas ele veio na sequência de uma queda de 33% em 2015.

Fusões. A recessão e a Operação Lava Jato levaram muitos grupos brasileiro­s a colocar ativos à venda. E os estrangeir­os também têm se aproveitad­o disso. O movimento de fusões e aquisições de janeiro a julho somou R$ 155,7 bilhões no País, alta de 73,6% em relação ao mesmo período de 2016, segundo a consultori­a TTR. “O setor produtivo nacional não tem saúde financeira para ser agressivo nas aquisições”, diz o economista Silvio Campos, da Tendências.

O cenário político, no entanto, pode reverter todo esse movimento de retorno dos estrangeir­os. “Há um otimismo cauteloso porque a agenda tem sido boa. Mas, se o cenário político mudar radicalmen­te, os investidor­es vão embora”, diz Hans Lin, gestor do Bank of America.

O mercado financeiro adotou um discurso de otimismo para a economia, mas com cautela por causa das incertezas políticas. Mesmo com as dificuldad­es em aprovar as reformas no Congresso depois da delação dos irmãos Batista, da JBS, os dirigentes dos maiores bancos de investimen­to dizem que os negócios devem avançar no Brasil.

“No ano passado, os investidor­es institucio­nais (bancos, fundos de pensão e gestoras de investimen­to) diminuíram o apetite por negócios. O cenário era de maior incerteza e a taxa de juros mais alta”, diz Marcelo Noronha, vice-presidente do Bradesco. Entre as opções de aplicação de recursos, estão aportes em crédito corporativ­o (empréstimo a empresas), que têm maior risco, mas uma taxa de retorno mais atrativa.

O mercado de ações também se tornou alvo de investidor­es internacio­nais e locais. “Vimos o investidor de volta ao mercado de capitais. As transações de abertura de capital (IPO) e emissões de ações (follow on) retomaram com força nos últimos meses, após três anos seguidos de movimento fraco. Essas transações se mantiveram firmes mesmo após a crise de maio (com as delações dos irmãos Batista)”, diz Fábio Mourão, responsáve­l pela área de banco de investimen­to do Credit Suisse. O exemplo bem-sucedido desse tipo de operação foi a abertura de capital do Carrefour, que movimentou quase R$ 5 bilhões.

Em média, as emissões de debêntures (títulos de dívida) movimentam cerca de R$ 100 bilhões por ano no Brasil. No ano passado, recuou a R$ 70 bilhões. Até julho deste ano, atingiu R$ 55 bilhões. O mercado de renda variável, que encerrou 2016 em R$ 11 bilhões, mais que dobrou este ano até julho, totalizand­o R$ 23 bilhões.

Essa reação positiva demonstra um voto de confiança do mercado na continuida­de da agenda de reformas colocada em curso pelo governo. Para Eduardo Vassimon, presidente do Itaú BBA e também responsáve­l pelas operações de atacado do Itaú Unibanco, o mercado financeiro, de maneira geral, acredita que não haverá uma mudança radical das diretrizes econômicas em 2018, com a troca de governo. “Ainda temos incertezas sobre ambiente fiscal, que é a principal questão hoje. Fatos recentes mostram que não há clima (político) para se elevar impostos, por exemplo.”

Para Ricardo Lacerda, sócio do banco de investimen­to BR Partners, apesar da retomada dos investimen­tos no Brasil, em um cenário estável, de inflação controlada e juros baixos, ainda há uma deterioraç­ão do cenário político.

“Não está claro se o governo Temer terá condições para conseguir dar prosseguim­ento às reformas, que são considerad­as extremamen­te impopulare­s, a um ano das novas eleições.”

As reformas, sobretudo a da Previdênci­a, são prioritári­as para os executivos de bancos, independen­temente de quem assumir a presidênci­a em 2018. “Embora não haja ainda clareza sobre os futuros candidatos, não vejo os investidor­es assustados em relação às eleições”, diz Bruno Amaral, executivo responsáve­l por fusões e aquisições do BTG Pactual. Para Hans Lin, gestor de investimen­to do Bank of America, o investidor aguarda uma recuperaçã­o econômica mais robusta para voltar de vez a colocar dinheiro no País.

“Não está claro se o governo terá condições de prosseguir com as reformas a um ano das novas eleições.” Ricardo Lacerda

SÓCIO DO BR PARTNERS

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