O Estado de S. Paulo

Negócio expõe fraqueza do futebol nacional

Valor pago pelo PSG por Neymar é superior às receitas e investimen­tos somados dos 27 maiores clubes do Brasil

- Almir Leite

Mesmo que possa ser considerad­a “um ponto fora da curva’’, a transferên­cia de Neymar acaba expondo mais uma vez a abissal distância econômica entre o futebol brasileiro e o europeu. O valor da multa rescisória do craque, pago pelo PSG para tirá-lo do Barcelona, é apenas 5% menor do que o investimen­to feito pelos 27 principais clubes do País, juntos, durante todo o ano de 2016. E supera em 57 % o que esses mesmos clubes receberam com a venda de atletas.

Os números da goleada sofrida pelo futebol brasileiro em uma só jogada fazem parte de um estudo comparativ­o realizado pelo Itaú BBA a que o Estado teve acesso com exclusivid­ade. O trabalho tomou por base o euro a R$ 3,69, cotação do dia da concretiza­ção da transferên­cia de Neymar. Dessa maneira, os ¤ 222 milhões representa­riam R$ 820 milhões.

Com essa base, o trabalho constatou que o valor da venda do atacante é mais do que o dobro das entradas de quatro dos cinco clubes com maiores receitas no ano passado (leia arte ao lado). Também supera em 49% o que as 27 agremiaçõe­s obtiveram com publicidad­e, entre outras “desvantage­ns’’.

O problema, no caso, não é o valor de Neymar, mas a constataçã­o que os clubes brasileiro­s poderiam estar numa situação melhor se soubessem explorar melhor o mercado do futebol.

“A despeito de ter muito jogador vendido, de ter qualidade, nossa indústria (do futebol) ainda é muito incipiente’’, diz César Grafietti, superinten­dente de crédito do Itaú BBA, responsáve­l pelo estudo.

De acordo com ele, mesmo consideran­do-se as diferenças entre a realidade brasileira e a dos grandes centros europeus, uma forma de fortalecer os clubes nacionais é tornar a gestão mais profission­al. “Se os clubes fossem mais profission­alizados, e isso conseguiss­e gerar mais receitas, buscando maximizar suas marcas, melhorando o relacionam­ento com o mercado, talvez tivesse maior entrada de investidor­es, maior apelo de marketing. Isso poderia ajudar a mudar o patamar do futebol’’, defende Grafietti.

Mesmo assim, seria quase impossível um time do Brasil ter um reforço como Neymar ou mesmo Philippe Coutinho, por quem o Liverpool acaba de recusa oferta de ¤ 100 milhões feita pelo Barcelona. Mas, com receitas maiores, teria mais facilidade para manter jogadores no País por mais tempo, contratar atletas de maior qualidade, o que iria melhorar qualidade do espetáculo e gerar mais receita.

O executivo ressalta, porém, que os indicadore­s melhoraram, mesmo com a crise por que passa o País. Diz que, apesar da queda de 4% do PIB por ano, nos dois últimos anos, as receitas do futebol cresceram 20% por período. “Mas crescemos de maneira muito mais lenta do que os europeus. Falta profission­alismo para transforma­r essa indústria, que é muito mambembe, numa indústria robusta. Por isso estamos tão distante de uma realidade internacio­nal.’’

César Grafietti

SUP. DE CRÉDITO ITAÚ BBA “Nossa indústria (do futebol) ainda é muito incipiente, a despeito de ter qualidade’’

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