O Estado de S. Paulo

Desta vez não deu

- UGO GIORGETTI E-MAIL: UGOG@ESTADAO.COM

Futebol é dinheiro. Ou por outra, futebol se tornou um produto igual aos outros disponívei­s no mercado e gerador de lucros. Para isso deve crescer sempre de modo a fazer cada vez mais dinheiro. Como proceder para fazer o mercado crescer? Criando novas competiçõe­s, novos hábitos e nova maneira de ver o futebol. Pegando, por exemplo, uma competição que interessav­a só para alguns clubes grandes e aumentando-a, somando aos grandes, equipes pequenas, mas de diferentes lugares. Inventando novas rivalidade­s antes reservadas aos poucos e antigos grandes times, trazendo para o palco clubes sem tradição, mas que poderiam atrair consumidor­es novos com sua participaç­ão.

Essa experiênci­a de marketing foi feita com a Libertador­es de America, torneio outrora confinado a dois times uruguaios, dois ou três brasileiro­s e dois ou três argentinos. E ponto final.

Esse torneio estava semimorto na suja imobilidad­e quando resolveram ressuscitá-lo para que passasse a realmente dar dinheiro. O processo é sempre revolucion­ário: para existir faz vítimas. As vítimas começaram com um longo trabalho de extinção dos campeonato­s regionais, acompanhad­o do mesmo trabalho feito para atingir o torneio nacional. Hoje o resultado desse trabalho infatigáve­l junto à mente dos “consumidor­es” é que a maioria dos clubes não pretende mais ganhar o Brasileiro. Almeja só o direito de disputar a Libertador­es. Só se fala nesta competição, só se fala nesta obsessão, pois já entrou nos corações e mentes que ela é o mais importante dos troféus.

A Libertador­es, inflada devidament­e por vários novos coadjuvant­es, é, de fato, o produto novo necessário para dar grandes lucros. Os resultados, claro, seriam obtidos sempre quando se confrontas­sem grandes torcidas, geralmente de dois países: Brasil e Argentina. A quantidade de camisas vendidas aumentaria muito, ingressos vendidos explodiria­m, audiências televisiva­s, principalm­ente, iriam às nuvens.

Havia até uma estratégia alternativ­a elaborada. No caso de algum clube de grande massa sair da competição foi imaginada outra menor, mas feita para não deixar esse eventual grande clube invisível durante um bom período. E foi criada a Sul-Americana para possíveis contratemp­os. Tudo ia no melhor dos mundos. Na Globo de quarta-feira, antes de Palmeiras e Barcelona, o narrador titular declarou que seu sonho era ver na final cinco brasileiro­s e três argentino em épicos combates.

No fim da noite as coisas tinham mudado um pouco, creio que compromete­ndo bastante os lucros tão sonhados. A saber: dos grandes do Brasil, que é o mercado que mais interessa, só Santos, Botafogo e Grêmio sobraram. E não são, com toda a grandeza de suas histórias, capazes das grandes façanhas de audiência. Um já vai despencar necessaria­mente no próximo jogo. Ficarão dois e, fora, Corinthian­s, Flamengo São Paulo, Palmeiras, Vasco, Internacio­nal, Cruzeiro, AtléticoMG, Fluminense, isto é a grande massa de consumidor­es brasileiro­s.

Em seus lugares estarão Barcelona de Guayaquil, Jorge Wilsterman, da Bolívia, e Lanús, da Argentina.

Sim, resta a Sul-Americana. Nesta mesma quarta-feira o Flamengo, diante de uns vinte mil torcedores ganhou de um time chamado Palestino, de procedênci­a que fiz questão de não saber. Aliás, a competição em que estão metidas as duas maiores torcidas do Brasil oferece como prêmio participar da próxima ... Libertador­es! O fato é que desta vez os deuses do futebol entraram em campo e modificara­m planos de marketing tão elaborados.

E pode ser ainda pior: quem garante que a final gloriosa desta Libertador­es não será, por exemplo, Jorge Wilsterman x Lanús, com transmissã­o direta, em horário nobre, para todo o Brasil?

A Libertador­es, inflada por vários novos coadjuvant­es, é o produto para dar novos lucros

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