O Estado de S. Paulo

Seminário comemora 60 anos de Arminio, que agora investiga juros

Economista avalia até aspectos psíquicos ligados à economia do comportame­nto para explicar os juros altos

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Juros baixos no mundo, altos no Brasil. Populismo, eficiência e justiça. Esses foram alguns dos temas com que Arminio Fraga foi brindado no seminário de comemoraçã­o dos seus 60 anos, realizado no dia 31 de julho na Casa das Garças, think tank ligado ao Departamen­to de Economia da PUC-Rio.

O evento teve participan­tes de renome global, como Stanley Fischer, vice-presidente do Federal Reserve (Fed, o banco central americano), e Raghuram Rajan, ex-presidente do BC da Índia e ex-economista-chefe do Fundo Monetário Internacio­nal (FMI). Outros nomes de destaque foram os de Yuliy Sannikov (de Stanford), Markus Brunnermey­er (de Princeton), e do brasileiro José Alexandre Scheinkman (de Columbia e Princeton).

Arminio foi incumbido de comentar a exposição de Fischer sobre as baixíssima­s taxas de juros globais por um longo período de tempo e acabou falando sobre as altíssimas taxas de juros reais brasileira­s, que perduram por mais tempo ainda.

Com Tiago Berriel, atual diretor de Assuntos Internacio­nais do Banco Central, Arminio, que vem retomando atividades de pesquisa, está fazendo uma ampla investigaç­ão sobre os altos juros no Brasil.

Ele aponta como possível causa inicial a introdução da correção monetária na década de 60, com o alto juro real de 6%, isento de imposto, pago pela caderneta de poupança. Mas a manutenção do juro real elevado por décadas é, para Arminio, “um fenômeno extraordin­ariamente complexo, que deve ter múltiplas explicaçõe­s”. Nesse rol de causas, ele vê até aspectos psíquicos ligados à moderna economia do comportame­nto e à falta de educação financeira.

Por outro lado, Arminio frisa que, “aos trancos e barrancos”, o juro real brasileiro veio caindo desde o Plano Real. Recentemen­te, porém, “a aventura Dilma, que empurrou de maneira voluntaris­ta o juro para baixo, deu errado, levou a congelamen­tos (de preços administra­dos) e depois foi preciso soltar”. Agora, com a nova gestão do Banco Central, o juro real voltou a cair, mas o desequilíb­rio fiscal permanece como um risco em horizonte mais longo.

Populismo. O economista Vinicius Carrasco, recém-saído do Banco Nacional de Desenvolvi­mento Econômico e Social (BNDES), e, com Tiago Berriel, um dos organizado­res do seminário em homenagem a Arminio, comentou durante o evento a apresentaç­ão de Rajan sobre a “era do descontent­amento”– a dificuldad­e de compensar os perdedores da globalizaç­ão, uma das causas da ascensão do populismo, em particular nos países ricos.

Carrasco notou que uma possibilid­ade trazida por Rajan, que apresentou dados preocupant­es sobre o aumento de mortes de homens americanos brancos de meia-idade por suicídio, alcoolismo e consumo de drogas, é que, mais do que compensaçã­o pura e simples (o que se pode fazer em teoria repartindo os ganhos derivados de reformas econômicas tradiciona­is), os perdedores da globalizaç­ão estejam em busca de algo que “devolva o sentido que viam na vida”.

Uma questão correlata, ligada a modelos de Brunnermey­er, é que, após um choque negativo, como o da crise de 2008, a forma certa de relançara e cono mia é de fato recapitali­zar os bancos, instituiçõ­es com mais capacidade de alocar capitais e gerir ativos de forma eficiente.

O problema, diz Carrasco, é que “é muito difícil justificar para o eleitor mediano a ‘redistribu­ição de riqueza para os mais ricos’, mesmo quando feita como parte de um seguro bem desenhado, cobrado de antemão – o que, aliás, não foi o caso na crise, aumentando a dificuldad­e”.

Arminio entra no assunto com uma entusiásti­ca recomendaç­ão do livro Justice: What’s the right thing to do (Justiça: O que é a coisa certa afazer ), de Michael Sandel, professor de Filosofia Política de Harvard, que trata dotem ad ajustiça, de Aristótele­s até os contemporâ­neos. Arminio aponta que ajustiça–e a percepção da sociedade sobre a sua vigência (ou não) – é extremamen­te importante no desenho das instituiçõ­es econômicas, assim como a eficiência.

“A aventura Dilma, que empurrou de maneira voluntaris­ta o juro para baixo, deu errado, levou a congelamen­to e depois foi preciso soltar.” Arminio Fraga

EX-PRESIDENTE DO BANCO CENTRAL

“É muito difícil justificar para o eleitor mediano a redistribu­ição de riqueza para os mais ricos.” Raghuram Rajan

EX-PRESIDENTE DO BC DA ÍNDIA

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FABIO MOTTA/ESTADÃO Jogo. Carrasco, ex-BNDES, avaliou avanço do populismo

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