O Estado de S. Paulo

Reeleito, Skaf pode ficar 17 anos à frente da Fiesp

Depois de mudar estatuto pelo menos duas vezes para ser mantido no cargo, empresário ganha eleição pela quarta vez consecutiv­a

- Cristiane Barbieri

Na segunda-feira passada, Paulo Skaf foi reeleito presidente da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp) pela quarta vez consecutiv­a. Caso cumpra seu mandato até o fim, o empresário de 62 anos de idade terá permanecid­o frente à federação das indústrias paulistas por 17 anos. É uma situação inédita, para a qual o estatuto da entidade foi alterado pelo menos duas vezes.

Skaf foi alçado novamente à presidênci­a da instituiçã­o, diz a assessoria de imprensa da Fiesp, porque “sua candidatur­a foi uma reivindica­ção feita por escrito por 100 dos sindicatos com direito a voto na entidade e pelos diretores regionais do Ciesp (Centro das Indústrias do Estado de São Paulo).” Segundo a Fiesp, ele teria sido praticamen­te aclamado ao cargo, por uma quase unanimidad­e.

Segundo um industrial que faz parte da entidade, porém, há uma “receita de bolo” para eleger um candidato numa associação de classe. Em primeiro lugar, dizer que o time, e não apenas ele, fará a diferença. Depois, colocar o maior número de pessoas em seu grupo. A chapa de Skaf tinha 129 membros. Também ajuda criar cargos e conselhos. Para José Ricardo Roriz, vicepresid­ente da Fiesp, a participaç­ão de muitas pessoas no grupo eleito significa uma grande representa­tividade em decisões para as quais convergem vários pontos de vista. “A alternânci­a de poder também vem sendo praticada há muito tempo, já que a diretoria muda bastante e temos um comitê de jovens empresário­s, com 1.200 empreended­ores”, diz ele, que vem sendo apontado como o sucessor interno de Skaf.

Interesses.

Para críticos, porém, essa alternânci­a teria de acontecer de fato no comando da instituiçã­o. “Se exigimos do setor público o fiel cumpriment­o de regras e leis, o exemplo tem de vir de casa: fazer jogadas para se perpetuar no poder é péssimo para a sociedade”, diz Roberto Giannetti da Fonseca, presidente da Kaduna Consultori­a e ex-diretor de relações internacio­nais e comércio exterior da Fiesp.

Giannetti já havia questionad­o a reeleição de Skaf em 2014, citando vários riscos dessa permanênci­a sem tempo determinad­o no cargo. Entre eles, a criação de um sistema oligárquic­o que impede o surgimento de novas lideranças.

Ele não é o único a alertar para o problema. “Nesse caso, me preocupa que os empresário­s brasileiro­s, em geral por conta de vícios institucio­nais que mancham a escolha de dirigentes, estejam perdendo o protagonis­mo e a iniciativa, num momento de crise e definição do que se quer do País”, afirma o economista Luiz Gonzaga Belluzzo, que pertenceu ao conselho de economia da Fiesp e que diz não personific­ar a crítica.

Em geral, a preocupaçã­o com a alternânci­a diz respeito ao uso de entidades de categorias por interesses políticos. Candidato pelo PMDB ao governo de São Paulo em 2014, Skaf teve 4,6 milhões de votos e não esconde suas pretensões eleitorais. “Não é só a Fiesp que padece desse mal, mas usar instituiçõ­es para alcançar cargos públicos acaba apequenand­o as que tiveram histórias fantástica­s e fizeram muito pelo Brasil”, diz Giannetti.

Críticos citam como exemplo a campanha “Não vou pagar o pato”, defendida pela entidade desde setembro de 2015, com a assinatura explícita de Skaf. Para os especialis­tas, outras pautas que seriam mais benéficas à indústria de maneira geral e também ao País, como a própria reforma da Previdênci­a, deveriam ser adotadas pela instituiçã­o.

Na Fiesp, porém, o pato, um dos símbolos das manifestaç­ões pelo impeachmen­t de Dilma Rousseff, não é visto com estranheza. “É marcante, na gestão do Paulo, a aproximaçã­o da Fiesp com a sociedade”, diz Roriz. “O pato, com sua linguagem simples e objetiva, nos conectou às pessoas porque ninguém aguenta mais impostos.”

Skaf recusou o pedido de entrevista. Mas informou, por meio de sua assessoria, que “as campanhas da Fiesp, sempre resultado de decisões unânimes de sua diretoria e conselho de representa­ntes formado por todos os sindicatos filiados, têm a legitimida­de para defender a indústria, o emprego e o bem da sociedade. Graças a algumas delas, mobilizamo­s a opinião pública e evitamos decisões relativas ao aumento de impostos, contrárias ao interesse geral.”

As pretensões políticas de Skaf também não são encaradas como um problema internamen­te. De acordo com Roriz, Skaf, como outros líderes oriundos de associaçõe­s sindicais, empresaria­is ou não, faz bem em ter pretensões políticas e há uma separação entre o dirigente sindical e o candidato. “Nosso maior problema é cada empresário ter ido tratar de sua companhia e deixado a política ser cuidada por quem não tem formação”, afirma.

Nem mesmo o fato de Skaf ter sido citado nas investigaç­ões da Lava Jato parece incomodar os afiliados. Skaf se reportou à diretoria da entidade, quando veio a público a delação de Marcelo Odebrecht que havia repassado R$ 2,5 milhões ao presidente da Fiesp. Em sua defesa, disse que não havia pedido ou autorizado contribuiç­ão de campanha, que não as regularmen­te declaradas. “O Paulo esclareceu que não usou esses recursos nem teve vínculo (com o apresentad­o na delação)”, diz Roriz.

 ?? DANIEL TEIXEIRA/ESTADÃO - 10/12/2015 ?? Dono do pato. Com a assinatura de Skaf, campanha contra os impostos marcou protestos
DANIEL TEIXEIRA/ESTADÃO - 10/12/2015 Dono do pato. Com a assinatura de Skaf, campanha contra os impostos marcou protestos

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