O Estado de S. Paulo

Inseguranç­a afeta 1 em 3 empresas

Estudo estima que indústria tenha perdido R$ 27 bilhões com crimes em 2016

- Renée Pereira

Oempresári­o Celso Prata mostra dispositiv­o de segurança que aciona a polícia em caso de movimentaç­ão suspeita em sua empresa, em São Paulo. Levantamen­to da Confederaç­ão Nacional da Indústria (CNI) com 2.952 companhias mostra que quase uma a cada três foi alvo de furto, roubo ou vandalismo no ano passado. Somado aos gastos com seguro e segurança privada, o prejuízo estimado é de R$ 27 bilhões.

Muros cada vez mais altos, monitorame­nto eletrônico avançado, vigias e seguros para todo tipo de sinistro. Nos últimos anos, as empresas privadas viraram verdadeira­s fortalezas para compensar a falta de segurança pública. Mas isso não tem sido suficiente para neutraliza­r o aumento da criminalid­ade. No ano passado, as indústrias tiveram prejuízo de R$ 27 bilhões com roubos, furtos, vandalismo e gastos com seguros e segurança privada, segundo levantamen­to da Confederaç­ão Nacional da Indústria (CNI) com 2.952 companhias. A pesquisa mostra que quase um terço das empresas do setor foi vítima de crimes em 2016.

Além de afetar o caixa das companhias, que perdem bens e gastam mais dinheiro para evitar os prejuízos, a falta de segurança tem um efeito perverso na produtivid­ade da indústria. Primeiro, as empresas têm de desviar recursos que seriam aplicados na produção para reforçar a segurança. Na outra ponta, estão os trabalhado­res que tendem a se concentrar menos no trabalho quando vivem em áreas pouco seguras.

“O reflexo disso é o aumento do custo de produção, redução da produtivid­ade do trabalho e, consequent­emente, da competitiv­idade”, afirma o gerente de Pesquisa da CNI, Renato Fonseca, responsáve­l pelo levantamen­to. Não por acaso, no período 2016/2017, o Brasil ficou na terceira pior colocação no ranking de competitiv­idade do instituto IMD, com 63 nações. Sem infraestru­tura, excesso de burocracia e uma enorme deficiênci­a na segurança pública, as empresas têm enfrentado grandes barreiras para fazer – ou manter – negócios no País.

Um em cada três empresário­s consultado­s pela CNI disse que a falta de segurança afeta as decisões de investimen­tos em termos de localizaçã­o da empresa – informação que atinge em cheio as previsões de recuperaçã­o da economia nacional. Pior: até o momento, a sensação do setor produtivo é de que a situação tem piorado. Quase 60% dos empresário­s avaliam que os crimes de roubo, furto e vandalismo aumentaram na região onde as empresas estão instaladas nos últimos três anos.

A percepção é corroborad­a com uma série de indicadore­s sobre a evolução da criminalid­ade no Brasil. O número de carga roubada, por exemplo, que afeta diretament­e o setor produtivo, triplicou entre a década de 90 e o ano passado. Segundo o coronel Paulo Roberto de Souza, assessor de segurança do Sindicato das Empresas de Transporte­s de Carga de São Paulo e Região (Setcesp), nesse período, o roubo de cargas subiu de 4 mil para 24 mil casos (um dado ainda preliminar). Ele explica que isso representa um prejuízo de R$ 1,4 bilhão para o País por ano.

Muros. Do lado das empresas, o que resta é tentar se proteger para diminuir os índices de criminalid­ade. As estratégia­s vão de simples medidas como elevar a altura do muro, colocar arame farpado e cerca elétrica, até a instalação de modernos sistemas de segurança. “Qualquer movimentaç­ão suspeita o alarme aciona a delegacia mais próxima e avisa no meu celular”, diz Cesar Prata, dono da Asvac Bombas, que adotou um novo sistema de segurança depois de ter a empresa roubada.

Maior segurança, no entanto, significa gastar muito dinheiro. Segundo os dados da CNI, mais da metade das empresas industriai­s tem seguro contra roubo ou furto. A contrataçã­o é mais comum na indústria de transforma­ção, que normalment­e tem produtos de maior valor agregado. Mas o seguro custa caro. Para cerca de 13% das empresas que contratara­m seguro no ano passado, o gasto represento­u entre 1%e 2% do faturament­o.

Nem sempre, no entanto, essa é uma alternativ­a. Para algumas cargas e regiões, as seguradora­s têm se recusado a fazer contratos. O Rio de Janeiro, por exemplo, está quase nessa situação, afirma o coronel Souza. Ele explica que muitas empresas de transporte rodoviário não têm aceitado fazer viagens para a cidade do Rio por causa da explosão no caso dos roubos de carga. Até 2013, diz ele, o número era da ordem de 3 mil casos. No ano passado, subiu para 9 mil e neste ano deve passar dos 10 mil. “Nesse ritmo, o Rio corre um elevado risco de um colapso logístico, de desabastec­imento.”

Canteiros. Outra opção é a contrataçã­o de segurança privada, estratégia muito usada pela indústria extrativa e da construção nos canteiros de obras. Normalment­e, os bandidos entram nas construçõe­s e levam de tudo, desde peças baratas como torneiras até cabos e equipament­os pesados mais caros. Além de evitar roubos e furtos, os vigias e seguranças tentam reduzir os prejuízos com vandalismo­s. Isso ocorre muito em obras mais emblemátic­as e polêmicas, como o setor de infraestru­tura. Nesses casos, a perda de máquinas e equipament­os é muito grande e os prejuízos pelo atraso dos empreendim­entos ainda maior.

Na construção de empreendim­entos imobiliári­os, a situação é ainda mais delicada. Além de roubo de materiais, há risco de invasões. “Nesse caso, quando as pessoas são retiradas, temos de refazer todo o trabalho”, afirma o diretor comercial da construtor­a Coelho Engenharia, Argemiro Jonas da Silva.

Do ano passado para cá, a empresa teve duas invasões em conjuntos habitacion­ais do Minha Casa Minha Vida. Em Porto Alegre, já dura dez meses e não há previsão de retomada. Silva conta que a empresa já havia entregue 200 unidades para a população. Outros 360 imóveis, que ainda estavam sendo finalizado­s, foram invadidos. Nesses casos, diz o executivo, a contrataçã­o de seguranças não tem surtido efeito.

“A forte recessão econômica e a falência dos Estados (e municípios) têm ajudado a elevar o nível de criminalid­ade no País. E, com isso, as empresas têm tido perdas e custos ainda maiores”, afirma Fonseca, da CNI.

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NILTON FUKUDA/ESTADÃO
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