O Estado de S. Paulo

Conselho exige 600 h de revisão em curso de Pedagogia

Medida vale para as faculdades paulistas públicas (USP, Unicamp e Unesp) e já é alvo de críticas; as Licenciatu­ras também são atingidas

- Isabela Palhares

O Conselho Estadual de Educação (CEE) de São Paulo deliberou que, a partir do próximo ano, os cursos de Pedagogia e as Licenciatu­ras oferecidas pelas universida­des estaduais reservem parte da carga horária para que os alunos “revisem e enriqueçam” os conteúdos do ensino fundamenta­l e do médio. Coordenado­res e diretores dessas graduações na USP, Unicamp e Unesp manifestar­am preocupaçã­o com a nova regra, sob o risco de engessar os projetos político-pedagógico­s e ferir a autonomia universitá­ria ao fixar os currículos de seus cursos e programas.

Dentre as novas diretrizes curricular­es estabeleci­das pelo CEE ficou definido que os cursos de Pedagogia, nos quais são formados docentes para atuar na educação infantil e nos anos iniciais do ensino fundamenta­l (do 1.º ao 5.º ano), terão de destinadas 600 horas para a revisão dos conteúdos – 18,75% da carga horária de 3,2 mil horas. Para as licenciatu­ras, que formam professore­s para atuar nos anos finais do ensino fundamenta­l (do 6.º ao 9.º ano) e médio, serão 200 horas para a revisão dos conteúdos da área ou disciplina em que vão lecionar e estudos da Língua Portuguesa.

A deliberaçã­o anterior, de 2014, dizia – sem especifica­r uma obrigatori­edade de carga horária – que os cursos deveriam ter como objetivo “ampliar e aprofundar conhecimen­tos relativos a áreas relacionad­as ao trabalho pedagógico”.

Bernadete Gatti, presidente do Conselho, diz que o conteúdo a ser revisado ficará a cargo dos cursos de graduação. “É importante ter a recuperaçã­o. Quando o aluno chega à universida­de, esse conteúdo básico já está distante. Nota-se que alunos de Pedagogia, por exemplo, têm algumas dificuldad­es com Matemática e eles vão ter de ensinar operações, frações. Conceitos que não estão muito claros na memória”, diz.

Questionam­entos. Uma carta das Comissões Coordenado­ras das Licenciatu­ras e Pedagogia da USP questiona a “naturaliza­ção” do CEE com as “fragilidad­es da educação básica”, com a indicação de que seus cursos devam ter espaço de revisão dos conhecimen­tos dessa etapa de ensino. “(Para a Pedagogia) são exigidas 600 horas, quase um quinto do curso para revisão. Esse não pode ser o papel de um curso de formação de professore­s”, afirma Marcos Neira, presidente da Comissão de Graduação da Faculdade de Educação da USP.

Um novo projeto político-pedagógico para a Pedagogia da USP foi apresentad­o ao CEE em janeiro e aguarda aprovação. “Essa nova deliberaçã­o nos preocupa pelo risco ao nosso projeto, que responde à expectativ­a do professor que queremos formar e acreditamo­s que a sociedade almeja”, diz Neira.

“É um descalabro, uma compreensã­o equivocada e ultrapassa­da de formação de professore­s. Não há dicotomia entre os conceitos curricular­es da educação básica e o ensino da Pedagogia, eles devem ser aprendidos juntos, como já fazemos. Não dá para estudar alfabetiza­ção sem estudar ortografia”, diz Dirce Zan, diretora da Faculdade de Educação da Unicamp. O curso de Pedagogia da instituiçã­o teve o currículo revisado e aprovado pelo CEE em 2016.

Em nota, a Pró-Reitoria de Graduação da Unesp disse que as novas normas podem contribuir para a formação docente desde que “não sejam interpreta­das como um engessamen­to da carga horária dos cursos”, mas como oportunida­de de aumentar a personaliz­ação dos currículos. A universida­de disse que nenhum de seus 183 cursos

contempla explicitam­ente revisão de conteúdos da educação básica, mas reconhece que “muitos alunos não têm embasament­o

suficiente para acompanhar” a graduação e, por isso, oferece monitorias e tutorias como atividades extraclass­e.

 ?? HÉLVIO ROMERO/ESTADÃO–9/8/2015 ??
HÉLVIO ROMERO/ESTADÃO–9/8/2015
 ??  ??

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Brazil