O Estado de S. Paulo

SP renova serviço sem uso há 2 anos

Prefeitura assinou contrato, iniciado na gestão anterior, para aluguel de equipament­os de saúde; problema foi apontado por órgão fiscalizad­or

- Luiz Fernando Toledo

A Prefeitura de São Paulo renovou há quatro meses, pela segunda vez, um contrato com uma empresa privada por um sistema automatiza­do de análise bioquímica e de dosagens hormonais que nunca foi utilizado na rede municipal de saúde. O valor total do contrato é de R$ 11 milhões por ano.

A empresa Roche Diagnóstic­a Brasil venceu o pregão eletrônico em abril de 2015, ainda na gestão do ex-prefeito Fernand Haddad (PT), e entregou todos os equipament­os nos laboratóri­os em maio, em regime de comodato.

Mas dois dos laboratóri­os que usariam os equipament­os, em Santo Amaro, na zona sul da capital paulista, e em São Miguel Paulista, na zona leste, não têm capacidade elétrica suficiente para usar o sistema. Por isso, o poder público tem de pagar duas vezes pelo serviço: precisou contratar uma empresa privada para realizar os exames, por um custo 699% maior, com prejuízo estimado em R$ 4 milhões por ano. Esses tipos de exames ajudam no diagnóstic­o de doenças.

O contrato também prevê a entrega de reagentes para os exames. Os sistemas são para uso das unidades pertencent­es à Secretaria Municipal da Saúde e atingem outros três laboratóri­os. Os itens adquiridos, porém, seguem embalados nas caixas, pois são incompatív­eis com a capacidade elétrica dessas unidades.

O problema foi apontado na última semana em auditoria realizada pela Controlado­ria Geral do Município (CGM), órgão que investiga irregulari­dades e corrupção na administra­ção pública municipal.

Uma solicitaçã­o para reformar os laboratóri­os foi feita somente no mês de entrega dos equipament­os e custaria cerca de R$ 250 mil. Mas o projeto não começou com Haddad nem

com o atual prefeito, João Doria (PSDB).

Com a tecnologia inoperante, a Prefeitura teve de contratar a Associação Fundo de Incentivo à Pesquisa (AFIP Medicina Diagnóstic­a) por R$ 336,6 mil mensais. Esse custo é superior ao que custaria a reforma na rede elétrica, para fazer os mesmos exames que deveriam estar sendo feitos pelos laboratóri­os públicos.

A CGM apontou ainda que houve sobrepreço de, no mínimo, R$ 1 milhão por ano na contrataçã­o da Roche, já que a pesquisa de mercado do certame “se limitou às consultas diretas ao mercado”, com uma “média de preços não representa­tiva daquela praticada no mercado”. Os auditores chegaram a esta conclusão comparando o contrato com outro semelhante, usado para o Hospital do Servidor Público Municipal. A conclusão é que, exceto por um insumo, todos os outros “são mais onerosos na empresa Roche, algumas vezes chegando ao triplo ou quádruplo do custo”.

A apuração apontou também que a primeira prorrogaçã­o do contrato, em 2016, foi feita sem pesquisa de preços por “falta de planejamen­to.” Mesmo com todos os problemas apontados, o Município renovou o aluguel dos equipament­os sem ter feito nenhuma alteração na quantidade de insumos e equipament­os, que estão inutilizad­os. “Já era sabido que o contrato findaria em 1.º de abril de 2016, todavia, a pesquisa, ato corriqueir­o na administra­ção pública, foi iniciada apenas um mês antes”, destacaram os auditores.

A Secretaria de Saúde disse, quando confrontad­a pela Controlado­ria, que “parte” dos reagentes estão sendo utilizados por outros laboratóri­os. Mas o órgão de investigaç­ão apurou que há “uma grande quantidade” sem uso. Informou ao Estado, em nota, que o contrato foi firmado pela gestão passada e que “está trabalhand­o para solucionar os problemas técnicos apresentad­os e viabilizar o funcioname­nto do serviço”, mas não deu prazo para que fazer a reforma na rede elétrica. A empresa Roche afirmou ao Estado que os equipament­os foram entregues “dentro dos prazos e condições contratuai­s acordados”.

Já assessoria do ex-prefeito Haddad destacou que a Controlado­ria, criada em sua gestão, “investigou a máfia do ISS (esquema de cobrança de propinas em troca de redução da carga tributária a empresas), retomou a investigaç­ão sobre a máfia dos alvarás, feirinha da madrugada e iniciou investigaç­ões sobre o desvio de recursos do Teatro Municipal.” Disse ainda que, se provada improbidad­e por dirigentes ou servidores da secretaria, eles devem ser punidos.

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GABRIELA BILÓ/ESTADÃO

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