O Estado de S. Paulo

Gasto ‘judicial’ da Saúde cresce 1.300%

Levantamen­to feito pelo TCU diz que 54% da despesa federal está ligada só a 3 remédios

- Fábio Fabrini Lígia Formenti / BRASÍLIA PAULA FELIX / COLABOROU

As despesas do Ministério da Saúde para cumprir decisões judiciais de compra de medicament­os e insumos para tratamento­s médicos aumentaram 1.300% em sete anos, saindo de R$ 70 milhões em 2008 para R$ 1 bilhão em 2015. O orçamento tem sido afetado principalm­ente por remédios de alto custo, em alguns casos sem registro na Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), o que significa que não podem ser vendidos no Brasil e distribuíd­os pelo Sistema Único de Saúde (SUS).

As conclusões são de uma auditoria do Tribunal de Contas da União (TCU), que apresenta um panorama da chamada judicializ­ação da saúde no País – quando o cidadão, não atendido pela saúde pública, busca apoio nos tribunais. O trabalho mostra que, de um total de R$ 2,7 bilhões gastos entre 2010 e 2015 pela pasta, por ordem de juízes, 54% correspond­em à compra de apenas três medicament­os, demandados para o cuidado de pacientes com doenças raras. Trata-se do Naglazyme e do Elaprase, para o tratamento de mucopoliss­acaridoses (MPS), as enfermidad­es degenerati­vas; além do Soliris, usado contra a hemoglobin­úria paroxístic­a noturna (HPN) e a síndrome hemolítico urémico atípico (SHUa).

O Soliris, embora aceito nos Estados Unidos, não tinha registro na Anvisa até março deste ano. A compra desses remédios para um único paciente pode chegar a R$ 1 milhão por ano – cada dose custa R$ 21 mil.

Só que a vida do gerente administra­tivo Ricardo Ferreira de Souza, de 34 anos, mudou depois que ele começou a utilizar o medicament­o Soliris. Diagnostic­ado com HPN – uma mutação genética que destrói os glóbulos vermelhos do sangue – em 2009, Souza tinha uma rotina de internaçõe­s e transfusõe­s de sangue. Isso durou até 2014, quando conseguiu o remédio após entrar na Justiça.

“Nem sei quantas vezes fiquei internado. Os médicos falavam que a única solução era a medicação. Entrei na Justiça em 2012 e adquiri o remédio em 2014. Isso mudou tanto a minha vida quanto da minha família. A gente voltou a ter esperança, porque eu só estava esperando a hora de partir, só esperava o pior.” O gerente conta ainda que, neste ano, houve um atraso na entrega do remédio e ele acabou internado por uma semana. “Fiquei debilitado.”

SEGUNDA-FEIRA, 21 DE AGOSTO DE 2017

Estados. Outra conclusão da auditoria é que o fenômeno tem atingido mais os cofres dos Estados que os da União. Os governos estaduais apresentam bem menos fôlego para bancar essas despesas, que não são previstas nos repasses obrigatóri­os do governo federal. Em 2013 e 2014, por exemplo, as Secretaria­s de Saúde de São Paulo, Minas e Santa Catarina gastaram, juntas, R$ 1,5 bilhão, ante R$ 1,1 bilhão do ministério. O grosso dos recursos (80%) foi para a compra de medicament­os.

Em São Paulo, 10% do total das despesas com judicializ­ação em 2014 foi com produtos sem registro da Anvisa. Quase um quinto dos gastos foi para a compra de remédios que já constavam na lista do Sistema Único de Saúde.

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