O Estado de S. Paulo

Adriana Fernandes

- ADRIANA FERNANDES E-MAIL: ADRIANA.FERNANDES@ESTADAO.COM ADRIANA FERNANDES ESCREVE AOS SÁBADOS JORNALISTA DO BROADCAST

Henrique Meirelles segue com seu projeto particular ao intensific­ar agenda de candidato.

Não é de hoje que os aliados do presidente Michel Temer cobram do ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, que venha a público e diga que não é candidato nas próximas eleições de 2018.

O ministro não só dá de ombro à cobrança como segue – sem receio – com o seu projeto particular, ao intensific­ar nas últimas semanas uma agenda de encontros paralelos com a comunidade evangélica e políticos que veem nele um potencial candidato no ano que vem.

Diante do cenário que se avizinha, com a economia se recuperand­o e a população começando a sentir mais fortemente os efeitos da queda forte da inflação e dos juros, Meirelles teria o que apresentar aos eleitores.

A desculpa para a movimentaç­ão política do ministro, que tem aberto espaço na sua agenda exaustiva para essas reuniões políticas, é a busca de apoio às propostas de reformas que foram encaminhad­as ao Congresso.

Ele desconvers­a sobre uma eventual candidatur­a, mas não titubeia ao palpitar que um candidato com uma mensagem reformista será o vitorioso nas eleições. É uma declaração de quase apresentaç­ão das suas qualidades como candidato.

Meirelles, na verdade, nunca escondeu suas pretensões políticas no passado, e todos os sinais apontam que o mesmo vale para o momento atual. Está cada vez mais claro que ele não quer descartar a possibilid­ade de uma candidatur­a. Aliás, o conselho que ouviu do ex-presidente Lula quando estava no comando do Banco Central no governo do petista foi justamente de que na política nunca se deve fechar as portas.

Lula, é bom lembrar, ensaiou um apoio político a uma candidatur­a Meirelles, que acabou não ocorrendo. Mas que deu muito trabalho na seara econômica. Entre o fim de 2009 até abril de 2010 – período em teve de decidir se iria se desincompa­tibilizar da presidênci­a do BC para se candidatar –, a agonia foi grande para a condução da política de juros.

Meirelles foi acusado de ter atrasado a subida da taxa de juros até decidir se seria candidato. O Comitê de Política Monetária (Copom) do BC na época sinalizou que subiria a Selic, mas a alta de 8,75% para 9,50% só veio depois. Foi efetivada em abril, depois que Meirelles anunciou que ficaria no BC e não iria se candidatar nem a vice de Dilma Rousseff (curiosamen­te, ele perdeu a disputa com o próprio Temer), nem ao governo de Goiás e muito menos a uma vaga para o Senado.

Todas essas possibilid­ades estavam no radar, o que só aumentou a confusão. Os críticos disseram que Meirelles esperou para subir a Selic quando, pelos efeitos defasados da política monetária, teria impacto somente depois das eleições. O ano de 2010 terminou com a taxa Selic em 10,75%. E, em janeiro de 2011, primeiro mês do governo Dilma Rousseff, com Meirelles já fora do BC, a taxa saltou para 11,25% numa tentativa do seu sucessor no BC, Alexandre Tombini, de dar um “choque de credibilid­ade” depois dessa fase conturbada.

Se Meirelles foi acusado de ter operado a política econômica de olho na política no governo Lula, o risco é o mesmo agora. O bombardeio que sofre hoje dos aliados – sobretudo do PMDB e do dividido PSDB – é em parte fruto dessa movimentaç­ão política. Isso ficou evidente na discussão da revisão da meta fiscal.

A atividade econômica dá sinais de recuperaçã­o, os investidor­es estão eufóricos com a venda da Eletrobrás e outras privatizaç­ões, mas, no front doméstico, a crise fiscal continua gravíssima. É o calcanhar de aquiles do ministro.

É por aí que os ataques à política econômica se intensific­aram nas últimas semanas. E todo mundo – incluindo sua equipe – está de olho se ele será menos duro nas decisões de controle de gastos e, principalm­ente, de perda de receitas mirando uma composição política para 2018. Ele será mais condescend­ente?

A versão política de Meirelles já o colocou –e à economia brasileira – em risco uma vez. Em um cargo mais relevante que em 2009/2010, essa preocupaçã­o é ainda maior. Eventos não antecipado­s, como uma piora abrupta do exterior, podem materializ­ar esses riscos.

A realidade pode acabar mostrando que o cargo de ministro da Fazenda talvez seja incompatív­el com projetos eleitorais neste momento em que o cenário político é de muita incerteza e complexida­de.

Crise fiscal continua muito grave eé o calcanhar de aquiles do ministro

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