O Estado de S. Paulo

‘Para alcançar um bom acordo, é preciso confiança’

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Depois de uma longa e espinhosa negociação para fechar o acordo de paz entre o governo colombiano e as Forças Armadas Revolucion­árias da Colômbia (Farc), o professor de negociaçõe­s de Harvard William Ury faz parte da equipe que tenta encontrar uma solução para o conflito entre o governo da Venezuela e a oposição. A seguir, trechos da entrevista.

Qual seu papel nas negociaçõe­s que envolvem o governo da Venezuela e a oposição?

Faço parte de uma equipe envolvida em tentar reunir, nos últimos dois anos, representa­ntes do governo e dos opositores. Tentamos ver se há uma maneira negociável de resolver esse conflito. Neste momento, a Venezuela está à beira de uma guerra civil. As consequênc­ias podem ser terríveis para os venezuelan­os. Até mesmo para os brasileiro­s, porque há muitos refugiados cruzando a fronteira. E, para o mundo, um colapso de um país como esse, rico em petróleo, poderia ser catastrófi­co. E, quando se fala de conflito, o fator principal é como evitá-lo. A única saída para a Venezuela é por meio da negociação.

Mas o sr. acredita que o presidente Nicolás Maduro poderia ser flexível nessa negociação? Eu me encontrei com Maduro na fase inicial. Acredito que eles podem ser flexíveis nas circunstân­cias certas. Do jeito que está ambos os lados vão sair perdendo. Na verdade, vai ser perder, perder e perder porque os maiores perdedores são os venezuelan­os. Não há remédio, não há comida, há tanto sofrimento no país. E agora o nível de violência está crescendo. Então, a única escolha nessas negociaçõe­s ou é perder, perder e perder ou vencer, vencer e vencer. E vencer não significa que todo mundo está muito feliz, mas que todo mundo tenha suas necessidad­es básicas alcançadas.

O sr. acredita em um possível desfecho positivo?

Acredito num acordo. Mas você precisa ver as necessidad­es dos opositores, do governo, das pessoas e a de outros jogadores, como Cuba, que tem dependido da Venezuela. Os EUA também são um jogador. Precisa levar isso em consideraç­ão e organizar a negociação com todos eles para chegar a uma solução. É por meio da negociação, por eleições, por democracia. A única pergunta é quanto tempo e quantas pessoas vão ter de morrer antes de eles chegarem lá.

É mais fácil negociar com governos, rebeldes ou fazer parte de conflitos com empresário­s? As negociaçõe­s de guerra são obviamente mais intensas porque as pessoas sofrem, há vidas perdidas. Trabalhei para o governo da Colômbia nos últimos seis anos. Mas ambos podem ser bem difíceis.

Qual foi a parte mais delicada com as Farc e a Colômbia?

Uma das grandes dificuldad­es é como construir confiança. Quando não há confiança, você tem de construir devagar. As Farc tiveram de confiar ao governo suas vidas porque o governo ajudou a transporta­r os negociador­es para Havana. Eu acho que confiança é uma das maiores barreiras para alcançar um bom acordo.

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