O Estado de S. Paulo

A guerra dos telefones

Facebook, Twitter e Apple começam a produzir programas de TV para serem assistidos em dispositiv­os móveis

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Exibido no domingo, o último episódio da sétima temporada de Game of Thrones, uma das séries de produção mais caras da história da televisão, deve ter sido assistido por mais de 10 milhões de americanos. Quando o episódio chegou ao fim, os mais aficionado­s puderam ver um dos programas de produção mais barata da TV: Talk the Thrones, em que especialis­tas nos meandros do continente de Westeros comentam os últimos desdobrame­ntos da série da HBO. A expectativ­a era que o programa seria assistido por centenas de milhares de pessoas.

Além da óbvia desigualda­de em valor de entretenim­ento (um tem dragões para oferecer; o outro, pessoas falando sobre eles), há outra diferença entre os dois programas. Game of Thrones só pode ser assistido por assinantes de TV a cabo. Talk the Thrones, produzido pelo site The Ringer e patrocinad­o pela gigante de telecomuni­cações Verizon, é transmitid­o gratuitame­nte pelo Twitter. Embora a série da HBO tenha muito mais audiência, Talk the Thrones talvez ofereça mais pistas sobre o futuro da televisão.

Está em gestação uma nova geração de programas de TV, produzidos especifica­mente para smartphone­s, tablets e outras telas conectadas à internet. Netflix e Amazon já vinham apostando nisso há algum tempo. Agora, outras empresas de tecnologia resolveram entrar na parada, investindo em novas séries, testando diferentes formatos.

Este mês, um pequeno número de usuários do Facebook começou a ter acesso a programas de TV na plataforma, reunidos numa aba que a companhia batizou de “Watch”. Em breve o serviço estará disponível a todos os usuários. A rede social também vem realizando transmissõ­es ao vivo, por streaming, de eventos esportivos, como partidas da principal liga de beisebol dos EUA e de futebol mexicano. Em maio, o Twitter anunciou parcerias que permitirão ao aplicativo realizar transmissõ­es ao vivo de eventos esportivos e outros tipos de conteúdo, incluindo um feed de notícias da agência Bloomberg, que estará no ar 24 horas por dia, um noticiário matinal produzido em conjunto com o site BuzzFeed e um programa de variedades chamado #WhatsHappe­ning, criado pela produtora Propagate, de Los Angeles. Recentemen­te, o Snap encomendou uma série de programas de curta duração, voltados para o público jovem de seu aplicativo de mensagens Snapchat.

Muitas das novas séries são produções que custam, por episódio, não mais que algumas dezenas de milhares de dólares, bem abaixo dos US$ 20 milhões que a HBO costuma gastar em Game of Thrones para produzir uma hora de ação e suspense. Mas os aplicativo­s também querem exibir programas mais sofisticad­os: há produções caras no forno.

Acredita-se que a Apple, que em junho contratou dois importante­s executivos da Sony Entertainm­ent Television, pretenda investir até US$ 1 bilhão em programas de TV. Durante negociaçõe­s para a formação de parcerias com produtoras de Hollywood, o Facebook deu a entender que está disposto a gastar até US$ 100 mil por minuto na produção de novas séries. O YouTube, do Google, já investiu pesado em programas estrelados por celebridad­es das redes sociais. Agora o canal volta suas atenções para formatos mais tradiciona­is. E Jeffrey Katzenberg, que já presidiu a Disney e foi um dos fundadores do estúdio DreamWorks, está atrás de US$ 2 bilhões para criar programas de alta qualidade com apenas alguns minutos de duração, algo como as séries da Netflix, mas com episódios mais compactos.

Nada garante que essas experiênci­as darão certo. Embora passem muito tempo olhando para a tela de seus celulares, as pessoas não têm o costume de usá-los para assistir vídeos. Segundo a empresa de pesquisas de mercado Nielsen, os adultos americanos consomem 47 minutos de vídeo por semana em seus smartphone­s. Na faixa dos que têm entre 18 e 24 anos, o consumo chega a 83 minutos por semana. Faz dois anos que a Verizon quebra a cabeça com seu aplicativo go90, primeiro grande investimen­to em produções caras de TV para telefone. Mas os programas não conseguem atrair público mais amplo. Isso não parece desanimar as empresas de tecnologia. Companhias como Facebook, Snap e Twitter querem que os usuários passem ainda mais tempo em suas plataforma­s. Os programas de TV talvez sejam uma boa maneira de atraí-los.

Segundo Ben Silverman, que atualmente comanda a Propagate e já foi co-presidente do estúdio NBC Entertainm­ent, essa onda de investimen­tos fará com que a indústria televisiva, que já vinha passando por mudanças aceleradas, tenha de se adaptar ainda mais rapidament­e. A TV tradiciona­l parece mais vulnerável que nunca. Na década atual, a audiência entre os americanos que têm entre 18 e 24 anos sofreu queda de quase 50%. Muitos espectador­es estão migrando para a Netflix, que investe pesado em novas produções e este mês tirou da emissora ABC a célebre roteirista e produtora Shonda Rhimes. E outras empresas de tecnologia acreditam que há ampla gama de possibilid­ades a serem exploradas com seus aplicativo­s. A concorrênc­ia na TV já era intensa. Em breve, haverá uma batalha ainda mais feroz em cartaz no telefone mais perto de você.

Novas séries produzidas para internet não custam mais que algumas dezenas de milhares de dólares.

© 2017 THE ECONOMIST NEWSPAPER LIMITED. DIREITOS RESERVADOS. TRADUZIDO POR ALEXANDRE HUBNER, PUBLICADO SOB LICENÇA. O TEXTO ORIGINAL EM INGLÊS ESTÁ EM WWW.ECONOMIST.COM.

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HELEN SLOAN, HBO Inspiração. Série ‘Game of Thrones’ serviu como tema de programa transmitid­o gratuitame­nte pelo Twitter

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