Engajar vira palavra de ordem na SPFW
Causas sociais, compartilhamento e coletividade marcam terceiro dia
“Pedi muito para não acontecer nada. Se tivesse sido uma semana depois, eu não estaria aqui”, disse a estilista Lenny Niemeyer, após seu desfile no terceiro dia da São Paulo Fashion Week, sobre um aneurisma que sofreu há algumas semanas. “Fiquei uma semana no hospital. Mas sou movida a trabalho. A criação é o que gosto de fazer, então tenho que ir em frente. Foi um desafio, e estou feliz.”
Nome forte da moda praia nacional, Lenny apresentou uma coleção impecável inspirada nas artistas Hilma af Klint, da Suécia, e Emma Kunz, da Suíça, ambas pioneiras do abstracionismo geométrico. “Elas eram completamente místicas, trabalhavam com triângulos, esferas, a terra, a convergência..., queriam mostrar um universo maior, além da matéria”, contou Lenny. Na passarela, a dimensão espiritual foi transposta para peças cheias de camadas, tridimensionalidade e cor. “Minha coleção é uma homenagem à força feminina”, concluiu.
Temas sociais, aliás, deram o tom do dia. Quando Emicida entrou cantando o rap Avuá com tanta energia e magnetismo, para uma plateia majoritariamente negra, a expressão moda inclusiva finalmente ganhou sentido. Não é a primeira vez, que a LAB atrai um público ligado ao rap, ao funk e a movimentos ativistas negros. Mas, dessa vez, a trilha do desfile foi feita coletivamente, ao lado de Fióti, seu irmão e parceiro na marca, e outros rappers famosos, como Rael e Drik Barbosa. “Sempre conduzimos o processo criativo de maneira muito conjunta, todo mundo sempre deu pitaco. O que estamos fazendo é trazer essa raiz do coletivo”, afirmou Emicida. “Partimos de onde saímos, que é das calçadas, e tocamos o coração das pessoas, inspirando-as a alçar voos maiores.”
Depois de duas coleções contando com a direção criativa do consagrado estilista João Pimenta na marca LAB, Emicida assume as rédeas da criação nesta temporada. O desfile terminou com uma homenagem ao sambista Wilson das Neves, que estava na passarela da LAB na última temporada, que morreu na última segunda-feira, 26.
Seguindo a temática da inclusão, Giuliana Romanno apresentou um trabalho manual de tressê em parceria com a Casa Teçume, marca social de artesãs da floresta amazônica. Com técnicas que se aprimoram e sofisticam a cada coleção, a estilista apresentou um desfile enxuto no número de looks e na cartela de cores, mas com sofisticados recortes e assimetrias em peças de alfaiataria. A camisaria foi trabalhada de forma minimalista, mas sexy – tarefa que não é fácil, mas que exerce com maestria.
Patricia Bonaldi provou mais uma vez que sabe bem cativar uma audiência. Prova disso foi a primeira fileira de seu desfile, repleta de influencers vestindo seus looks mais instagramáveis. A estilista apostou em bordados lúdicos e surreais, e quebrou a feminilidade com peças esportivas com clima de streetstyle. “Acabamos de lançar nosso ecommerce nos EUA, e tenho planos de expansão por lá. É hora de levar o que Brasil tem de bom para fora”, disse ela.
Na era do compartilhamento, Vitorino Campos teve uma brilhante ideia: tornou disponível no site de sua marca o molde de boa parte dos 22 looks desfilados. “Eu me entusiasmei com a ideia de compartilhar minhas criações para que possam ser reproduzidas por quem quiser. A ideia é que a roupa funcione como uma tela em branco na qual cada um faça sua interpretação.” A coleção, toda em branco, é inspirada no disco Araçá
Azul, de Caetano Veloso. /