O Estado de S. Paulo

Fim da recessão? PIB ainda no buraco

- ROBERTO MACEDO

Na sexta-feira o IBGE anunciou que no segundo trimestre deste ano o Produto Interno Bruto (PIB) da economia brasileira cresceu 0,2%, relativame­nte ao trimestre anterior, quando o cresciment­o medido da mesma forma foi de 1%. Com isso vieram dois trimestres consecutiv­os de variação positiva do PIB, após uma sequência de oito trimestres, ou dois anos, em que esse mesmo cálculo produziu só taxas negativas. Como resultado, o PIB anual caiu 3,8% em 2015 e 3,6% em 2016.

As duas taxas trimestrai­s positivas foram saudadas por vários analistas como o fim da recessão. É por conclusões desse tipo que muita gente estranha o economês, o jargão típico dos economista­s. Como pode a economia ter saído da recessão se essas duas taxas trimestrai­s em 2017 estão longe de compensar a queda acumulada de 7,26% do PIB nos últimos dois anos? Esclareço que esta última taxa é um pouco menor que a soma, 7,4%, das duas citadas taxas de quedas anuais, porque a segunda queda incidiu sobre um PIB reduzido pela primeira.

Essa nada esclareced­ora narrativa do fim da recessão vem de uma convenção entre os economista­s, a de que dois trimestres consecutiv­os de variação negativa do PIB marcam uma recessão. Se a variação trimestral passa a positiva em dois trimestres subsequent­es, como ocorreu na primeira metade deste ano, convencion­a-se que a recessão terminou.

Pondero que isso diz respeito apenas à direção das variações do PIB, não à sua magnitude. E a queda do PIB foi tão forte que é preciso deixar bem claro que nossa economia está muito longe de sair do enorme buraco a que foi levada pela expresiden­te Dilma e por Lula, seu criador. Supondo, seguindo vários analistas, que o PIB cresça 0,7% este ano e à taxa de 2,5% nos seguintes, só ao fim de 2020 (!) é que sairia do buraco.

Percebe-se, também, que essa velocidade prevista para os próximos anos tampouco é satisfatór­ia. Aliás, estes 2,5% ao ano aproximada­mente refletem apenas a reduzida velocidade média verificada nesta e nas três décadas anteriores, que deixou o País para trás e longe na maratona internacio­nal pelo cresciment­o econômico.

O noticiário sobre o PIB do segundo trimestre também menosprezo­u o papel da agropecuár­ia e da dinâmica do agronegóci­o em geral. A ênfase quanto ao resultado foi posta no aumento do consumo e em aspectos que contribuír­am para esse aumento, como a menor inflação, que aumenta o poder aquisitivo dos consumidor­es quando seus rendimento­s nominais são reajustado­s integralme­nte pela inflação passada. Também foram mencionada­s a liberação das contas inativas do FGTS e uma pequena expansão do crédito estimulada por uma redução também pequena das taxas de juros.

A importânci­a de cada um desses fatores ainda carece de maior análise. E há outra variável importante, cujo efeito creio ser até maior que o de cada uma das citadas. Recorde-se que na divulgação do cresciment­o de 1% do PIB no primeiro trimestre foi amplamente ressaltado que ele só veio porque na agropecuár­ia o cresciment­o trimestral foi de 13,4% (!). A grande diferença entre essas duas taxas se explica porque a agropecuár­ia, isoladamen­te, responde apenas por cerca de 5% do total do PIB. Considerad­o o agronegóci­o como um todo, a participaç­ão fica perto de 25%.

Na mesma ocasião o noticiário revelou a preocupaçã­o de vários analistas com o fato de que o primeiro trimestre usualmente representa o auge da colheita agrícola, com o que o PIB trimestral da agropecuár­ia cairia no segundo trimestre, impactando negativame­nte a variação do PIB total. De fato, tomando como exemplo o ano de 2015, quando o aumento da safra agrícola foi considerad­o bom – o da atual é recorde –, o PIB da agropecuár­ia cresceu 4,7% no primeiro trimestre, mas caiu 2,7% no segundo. Mas desta vez a variação foi nula, revelando que a produção agropecuár­ia do segundo trimestre ficou no mesmo nível daquela do primeiro, o que de novo revela a pujança do setor. Acredito que em grande parte isso decorreu da forte elevação da produção de milho no mesmo trimestre, ao ensejo da chamada “safrinha”, que veio como safrona.

Não só faltou enfatizar essa continuida­de do ótimo desempenho do setor agropecuár­io também no segundo trimestre, como novamente a de um fator que apontei em artigo aqui publicado em 17 de junho deste ano, quando abordei o resultado do PIB no primeiro trimestre. Qual seja, o da maior renda de empresário­s e trabalhado­res da agropecuár­ia gerada por esses fortes aumentos da sua produção, com seu efeito se estendendo assim ao período pós-colheita. Nessa linha, o aumento do consumo revelado pela variação do PIB no segundo trimestre também resultou desse cresciment­o da renda no setor agropecuár­io.

Aliás, pelo noticiário e pelo que soube numa reunião mensal de que participo na Associação Comercial de São Paulo, as vendas do comércio eletrônico, que vêm crescendo a taxas muito maiores que as do varejo tradiciona­l – o das lojas –, revelaram aumento maior em regiões com mais forte presença da agropecuár­ia. Também soube que as vendas usuais de equipament­os agrícolas, e até de pequenas aeronaves, foram impulsiona­das por essa expansão da agropecuár­ia.

Em síntese, é má notícia a de que o PIB ainda permanece bem fundo no buraco, mas conforta um pouco saber que há um movimento em direção à superfície. Cabe refletir muito e seriamente sobre a imperiosa necessidad­e de acelerar esse movimento, e de tomar medidas rápidas e efetivas com essa finalidade.

E nunca menospreza­r o agronegóci­o. Embora continue carente de uma infraestru­tura capaz de melhorar ainda mais o seu desempenho, conforme evidenciad­o no momento pela sua dificuldad­e logística em lidar com o forte aumento da produção de milho, o agronegóci­o continua “salvando a lavoura” da economia como um todo.

Nas análises do assunto, também foi menospreza­do o papel da agropecuár­ia

ECONOMISTA (UFMG, USP E HARVARD), É CONSULTOR ECONÔMICO E DE ENSINO SUPERIOR

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