O Estado de S. Paulo

Febre de abacate

Tradição em países latino-americanos e moda dos EUA à Austrália, a torrada com avocado, que já foi culpada até pela crise financeira dos millennial­s, invade cafés e restaurant­es de SP unindo crocância, untuosidad­e e sabor

- Isabelle Moreira Lima

Qual a melhor companhia para um café da tarde? Um pão de queijo ou... uma torrada de abacate? Acredite, a segunda opção anda ganhando a disputa em muitos cafés paulistano­s. O pão tostado, crocante e sequinho, recebe uma camada do untuoso avocado, que vem em pasta ou em fatias e faz as vezes de uma manteiga, em um casamento escrito nas estrelas.

Os dois se bastam, mas também são generosos e inclusivos: sempre cabe mais um (ingredient­e). Vale ovo, salmão, beterraba, rabanete, queijo, morango, camarão, tomate, ervas, folhas… O resultado, além de delicioso, costuma ser visualment­e impactante, o que explica também as milhares de postagens em redes sociais como o Instagram. É a tostada do zeitgeist.

Uma tradição de países latino-americanos e uma febre consolidad­a dos Estados Unidos à Austrália, a torrada de abacate finalmente desembarca em São Paulo. Nos últimos meses ela tem sido uma espécie de invasora em cardápios dos quatro cantos da cidade. Se o café é descolado ela passa o dia desfilando em bandejas. E se não está no menu hoje, estará no de amanhã.

É o caso do novo Petí instalado na cobertura da Escola Panamerica­na de Arte e Design, um espelho do que ocorre no High Line nova-iorquino tanto no ambiente quanto no cardápio. Em seu brunch servido aos sábados, das 11h às 17h, o chef Victor Dimitrow vende bem suas torradas de pão miche com fatias de abacate, ovo mexido e bacon, “que deixa o prato bem potente”, explica. “Apesar do abacate ser gorduroso, ele traz um frescor ao prato”, diz.

O café Takko, na Vila Buarque, foi um dos últimos a aderir à moda. Não por falta de entusiasmo, mas porque são poucas as comidinhas preparadas ali. Quando resolveram improvisar uma cozinha, o avocado, um hit nas casas dos sócios, foi acionado. Na versão de Flávio Seixlack, ele é servido em cima de uma torrada de focaccia cheia de azeite da padeira Flavia Maculan, com fatias de avocado, de rabanete (que dá uma deliciosa crocância) e de cebola, coentro, gotas de limão, sal e pimenta e mais azeite. Apesar de não vir com pasta, a versão lembra o “primo” guacamole.

Na opinião de Seixlack, a difusão da torrada de abacate em cafés, tendência forte na Austrália, país que está sempre na vanguarda das cafeterias, tem a ver com a praticidad­e (pode ser preparada em cima de qualquer superfície) e com seu alto potencial de harmonizaç­ão com o café coado. Veio da Austrália também a declaração mais forte sobre a torrada de abacate. O magnata do mercado imobiliári­o Tim Gurner sugeriu que, se a geração dos millennial­s quer parar de sofrer com dívidas e adquirir casa própria, devia parar de gastar seu dinheiro com torradas de abacate de US$ 19 (cerca de R$ 53). Em Nova York, uma delas no Café Gitane, restaurant­e campeão invicto da hashtag #avocadotoa­st e pioneiro na iguaria, preparada minimalist­icamente com azeite, gotas de limão, pimenta calabresa sobre um pão multigrãos desde os anos 1990, custa US$ 7,25 (R$ 23). A versão do Takko custa R$ 15. Nascido no Chipre e ex-proprietár­io de um café em Sidney, Arman Beyazgul, sócio e chef do Habitual, prepara sua avocado toast à la australian­a com um toque turco. “Só pão e abacate seria entediante. Então uso um zaatar caseiro feito com sumac, gotas de limão, hortelã, azeite de oliva e, como toque final, sementes de abóbora para que fique crocante.”

Na Padoca do Maní, além da torrada, o avocado entra no queijo quente. Talvez porque a padeira Papoula Ribeiro seja uma viciada. “Passei 15 dias de férias na Califórnia e comi abacate todos os dias. Em cada lugar vi algo mais legal. Ele é muito permissivo e junta muita coisa bacana: a cor, a textura, o perfume e a gordura, que é rica e acrescenta sabor a qualquer prato.” Na Padoca, a torrada vem com pão rústico ou de grãos, pesto de manjericão, mussarela de búfala e folhas (leia receita no site do Paladar). Seu sucesso, ela afirma, é estrondoso. Tanto que hoje a casa compra abacate aos montes, para servir do café ao jantar.

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