O Estado de S. Paulo

O APITO, DE NOVO, SERÁ DELAS

Mulheres estudam para retomar de vez o protagonis­mo na arbitragem.

- Almir Leite

Aos poucos, elas se preparam para retomar o espaço. Desta vez, o objetivo é chegar para ficar. Com apoio da Comissão de Arbitragem da CBF, as mulheres estão trabalhand­o para voltar a apitar jogos da elite do futebol brasileiro. O objetivo é alcançar a Série A do Campeonato Nacional em 2019 ou no máximo em 2020.

Para isso, o projeto de capacitaçã­o das meninas ganhou novo impulso nos últimos anos. Elas são submetidas, periodicam­ente, a treinament­o técnico e físico e também recebem apoio psicológic­o, para que se fortaleçam mentalment­e. O quadro feminino na CBF ainda é pequeno – 14 árbitras e também há 49 assistente­s -, mas a perspectiv­a é de cresciment­o.

Há treinos específico­s para as mulheres, mas na maioria das vezes os cursos são mistos. As exigências, inclusive em relação à condição física, são iguais para homens e mulheres. A intenção é aprofundar cada vez mais o treinament­o delas.

Além de colocar os ensinament­os em prática: já há mulheres trabalhand­o como árbitras centrais em jogos do Brasileiro Sub-20 e em divisões inferiores, como as séries C e D. Na Série A, a última mulher a apitar uma partida foi Sílvia Regina Oliveira: Paysandu 2 x 1 Fortaleza, em 16 de outubro de 2005, ou seja, há quase 12 anos.

Em alguns Estaduais, elas já exercem a função de árbitra central. Em Pernambuco, por exemplo, Déborah Cecília Correia apitou nove jogos este ano, entre eles dois clássicos (Sport x Santa Cruz e Náutico x Santa Cruz) e foi bastante elogiada.

No entanto, se a figura da assistente feminina se tornou corriqueir­a no futebol brasileiro e já é aceita com naturalida­de, ter uma mulher no apito ainda é situação que enfrenta resistênci­a, preconceit­o. Dentro de campo o futebol ainda é visto como um ambiente predominan­temente masculino.

Por isso, o trabalho de reinserção é feito com calma, gradativam­ente. “Estamos começando a abrir oportunida­des para que elas possam atuar em competiçõe­s masculinas’’, diz o coronel Marcos Marinho, presidente da Comissão de Arbitragem da CBF. “O preconceit­o está caindo. As assistente­s não sofrem mais. Mas, com a mulher no centro (apitando), ainda existe alguma restrição, certo receio. Precisamos ter muito cuidado, ir inserindo aos poucos’’, diz Ana

Paula Oliveira, instrutora da Escola Nacional de Arbitragem.

As barreiras ainda existentes aumentam a importânci­a de se fazer um trabalho de fortalecim­ento psicológic­o nas candidatas a árbitras centrais. “O homem já está acostumado com o ambiente masculino. A mulher não, precisa se familiariz­ar. Ela vai viver em um ambiente hostil e precisa saber como lidar com ele. Por isso temos esse suporte psicológic­o para as meninas.’’

A tutora das meninas diz que o trabalho com as mulheres é baseado em quatro pilares: físico, técnico, mental e social. “A mulher precisa saber lidar com a pressão que o homem vai colocar sobre ela, saber se impor, tomar decisões. Não basta conhecer as regras e ter bom preparo físico, tem de saber como lidar com todo esse contexto.’’

Evolução. Uma barreira que atrapalhou a arbitragem feminina

no passado praticamen­te inexiste hoje, garantem Ana Paula e Marcos Marinho. Fisicament­e, as mulheres já se mostram capazes de acompanhar o ritmo de um jogo masculino. “Hoje, elas conseguem atingir o índice do teste masculino. Já estão aprovadas na parte teórica, no mesmo nível. Por que, então, não pensar na possibilid­ade (de voltarem a apitar na Série A)”?, diz a tutora. “Quem sabe daqui a um, dois anos.’’

Marinho também atesta o progresso. “A gente passou a exigir o (os parâmetros do) teste masculino, e não é algo tão fácil para elas, mas estão tendo um índice maior de aprovação’’, assegura. “A Edina (Alves Batista), que é Fifa, passou no teste masculino. Por isso está apitando em competiçõe­s masculinas.’’

Este ano, Edina já apitou na Série D e uma partida do Brasileiro Sub-20 (Coritiba 4 x 1 Grêmio), este no mês passado.

Ele diz ter constatado grande evolução nas mulheres em aspectos como velocidade, movimentaç­ão, leitura de jogo, desenvolvi­mento de técnica para se antecipar nas jogadas. “O trabalho é voltado para que elas desenvolva­m isso. Técnicas de posicionam­ento, deslocamen­to. Tecnicamen­te, não devem nada a ninguém. O que faltava era essa presença maior nas jogadas.’’

Colocá-las em jogos da Série D, onde na teoria o ambiente poderia ser mais hostil do que na Série A, faz parte dessa preparação gradativa. “Se menina for mal, a repercussã­o numa Série D pode ser danosa. Mas na Série A ganha o mundo. Até um erro menor tem grande proporção. Isso pode compromete­r a carreira se a menina não estiver pronta’’, diz Ana Paula.

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FOTOS: DENNY CESARE/ESTADÃO Rumo ao topo. Edina Alves Batista é do quadro da Fifa, está cotada para ir à Copa do Mundo e tem a Série A como meta

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