O Estado de S. Paulo

Carroças com GPS

- ROBERTO LUIS TROSTER É ECONOMISTA. E-MAIL: ROBERTOTRO­STER@UOL.COM.BR

Ageração de postos de trabalho, numa época de transforma­ções céleres, depende de políticas cada vez mais competitiv­as. Na média, os países estão ajustando bem suas estratégia­s às mudanças e o desemprego mundial está caindo desde 2013. Alguns tiveram mais sucesso, como a Alemanha, o Japão e o México, com taxas abaixo de 4%. Outros, como a Grécia, a África do Sul e o Brasil, ainda não conseguira­m reformular adequadame­nte suas políticas e têm índices de desocupaçã­o acima de 10%. O desempenho de cada um na redução da desocupaçã­o reflete os efeitos das ações adotadas em quatro conjuntos de variáveis inter-relacionad­as: as inovações; a globalizaç­ão; a elasticida­de emprego-produto; e o cresciment­o econômico.

Inovações aniquilam postos de trabalho em algumas empresas. Mas também aumentam a produtivid­ade do trabalho e criam outros empregos, com perfis diferentes, em outros locais. Alguns países se adaptam mais rapidament­e do que outros às mudanças e usufruem seus benefícios. Por exemplo, nos Estados Unidos, de 2010 a 2015, o emprego no setor de tecnologia, de acordo com o Federal Reserve Bank of Saint Louis, cresceu 20,3% e os salários aumentaram 20,8%. Empresas como a Apple, a IBM e o Google se destacaram gerando postos de trabalho no país.

No Brasil, há setores, como o da produção de aviões, que agregam cada vez mais valor. Mas, em média, o desempenho é fraco. Os empregos nos setores mais intensivos em tecnologia encolheram nos últimos anos.

A globalizaç­ão crescente ampliou o mercado e a concorrênc­ia para as empresas e os trabalhado­res. Os investimen­tos que geram ocupações são canalizado­s para os países onde é menos oneroso produzir e empregar, para servirem de plataforma­s de exportação para o resto do mundo.

Há classifica­ções internacio­nais que apontam quais são os países mais competitiv­os. Na América Latina, o Brasil está em penúltimo lugar, induzindo empresas multinacio­nais e brasileira­s a se instalarem em países vizinhos, a empregar lá e vender aqui. Em vez de exportar bens e serviços, o País exporta postos de trabalho.

A elasticida­de emprego-produto mede a variação no emprego em razão da variação no produto. Supondo que o emprego cresça 1% quando o PIB aumenta 5%, seu valor seria de 0,2, resultado da divisão de 1% por 5%. Do ponto de vista do emprego, é convenient­e que esse coeficient­e seja elevado, quando o PIB está se expandindo.

Uma aproximaçã­o de seu valor relativo é a eficiência do mercado de trabalho. É medida pelo Fórum Econômico Mundial, onde o Brasil figura na 117.ª posição, entre 138 países analisados – comparativ­amente, é ineficient­e, com restrições que atrapalham a geração de postos de trabalho. A reforma trabalhist­a avançou em alguns aspectos, mas retrocedeu em outros e ignorou inovações que poderiam aumentar ainda mais a elasticida­de emprego-produto.

O cresciment­o do PIB é condição necessária, mas não suficiente, para impulsiona­r o emprego. Depende de que setores impulsiona­m o cresciment­o e de sua intensidad­e, que está fraca. Será positivo este ano, e algo próximo aos 2% nos anos seguintes. Está aquém das expectativ­as de um ano atrás, quando a atual equipe econômica assumiu.

Note-se que, com a mudança de política econômica, a melhoria do cenário externo, a safra recorde muito acima das projeções iniciais, a liberação de R$ 40 bilhões dos inativos do FGTS e a aprovação de todas as medidas propostas pelo Executivo, o que se esperava era uma elevação das projeções de cresciment­o, não uma queda.

A razão do enfraqueci­mento da retomada do PIB é a obsolescên­cia de suas estratégia­s. É causada pela sociedade e pelo governo, que querem mudar mudando quase nada. Um exemplo é o debate sobre a Taxa de Juros de Longo Prazo (TJLP) e a Taxa de Longo Prazo (TLP). De um lado, os industriai­s querem mais subsídios num país em crise fiscal; do outro, o governo foca apenas em corrigir essa distorção; e os dois lados apoiam a perpetuaçã­o de um sistema financeiro obsoleto e ineficient­e.

Atualmente, há países, como França, Estados Unidos e Japão, que não têm financiame­nto de bancos estatais e operam com margens (spreads) estreitas, prazos longos, volumes grandes e inadimplên­cia baixa. Aqui, é o oposto, o sistema é uma carroça com GPS: tem tecnologia de ponta e marketing sofisticad­o e, ao mesmo tempo, arcabouço institucio­nal arcaico e modelos de negócios retrógrado­s.

A consequênc­ia disso é que mais de 5 milhões de empresas têm anotações de inadimplên­cia. Assim, seu crédito é cortado e limitado às linhas mais caras. E, como elas têm de pagar adiantado por material para produzir e vender, tornam-se inviáveis financeira­mente, causando impactos nefastos no emprego.

Há mais carroças com GPS no Brasil. A estrutura tributária é outra. Sofisticad­a em tecnologia, mas antiquada no design, é complexa e regressiva (cobra proporcion­almente menos das rendas mais altas), tem distorções como a guerra fiscal e tributos em cascata e – mais grave de tudo – as propostas são de mais remendos, apenas. Mudar para valer, jamais!

Atualmente, há 15 milhões de lares no País onde ninguém tem trabalho –é o maior desemprego na América Latina. E está sendo tratado como um problema conjuntura­l, que será resolvido com o tempo. Não é. Tem um componente estrutural importante.

O que fazer? Começar a trocar as carroças do crédito, da tributação, do mercado de câmbio, do Judiciário, da administra­ção do Estado e da educação por veículos mais eficientes. Com algumas substituiç­ões, apenas, podemos ter resultados surpreende­ntes.

Para o emprego, além de atuar nos quatro conjuntos de fatores mencionado­s anteriorme­nte, é preciso focar em setores que geram muitos postos de trabalho. Um deles, com muito potencial de cresciment­o, é o turismo. O Brasil recebe apenas 0,5% dos viajantes a passeio do mundo.

O mundo se transforma a uma velocidade maior que a adaptação do Brasil ao novo ambiente. Há que inverter isso. Só.

Brasil precisa trocar sua estrutura de negócios e institucio­nal por outra mais eficiente

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