O Estado de S. Paulo

Futuro da Catalunha

- EMAIL: GILLES.LAPOUGE@WANADOO.FR TRADUÇÃO DE ROBERTO MUNIZ /

O11 de setembro é a festa nacional catalã. Desde 2012, ela passou a ser uma manifestaç­ão para exigir a independên­cia da Catalunha da Espanha. Essa mudança de rumo tem sua lógica. A Diada, desde seu nascimento, em 11 de setembro de 1714, opôs Barcelona, a vibrante capital regional, a Madri. Naquele dia, tropas vindas de Madri, favoráveis aos Bourbons, arrasaram Barcelona, que já exigia autonomia em relação a Castela (ou seja, à Espanha).

Neste 11 de setembro, 1 milhão de catalães foram às ruas de Barcelona cobrar o direito de organizar, no dia 1.º, um plebiscito sobre a independên­cia da Catalunha. Isso equivale a dizer que o momento crucial para o destino da Catalunha se aproxima. Se Madri levantar seu veto ao plebiscito, em quatro semanas, saberemos se o destino da Catalunha será permanecer na Espanha ou se separar, para se engajar numa aventura perigosa, excitante e solitária.

Por enquanto, Madri não cede. O chefe do governo espanhol, Mariano Rajoy, afirma que o plebiscito é ilegal, assim como a independên­cia da Catalunha. O Tribunal Constituci­onal confirma.

Frente a essa barreira constituci­onal, Barcelona respondeu à altura, com a impression­ante manifestaç­ão de segunda-feira e a determinaç­ão do presidente do governo catalão, Carles Puigdemont. Prova da determinaç­ão de Puigdemont: ele não teme governar com o apoio do grupo de extrema esquerda e antieurope­u Candidatur­a de União Popular (CUP). Por que Puigdemont aceita esse apoio aparenteme­nte antinatura­l? Porque os independen­tistas, sozinhos, parecem não dispor de maioria. Pelas últimas estimativa­s, eles reuniriam apenas 48% dos votos em um plebiscito – daí a necessidad­e de Puigdemont se apoiar na extrema esquerda. Os separatist­as catalães brandem ainda um último argumento contra os ataques de Madri. “Nós, catalães, temos a nosso favor algo muito mais importante que a legalidade: a legitimida­de.”

Um argumento estranho, diga-se de passagem, mas que pode ser usado em inúmeras circunstân­cias, até ironicamen­te. Eu, por exemplo, da próxima vez que estiver frente a um policial, um fiscal de renda ou um juiz da República Francesa, posso alegar: “Você detém a legalidade, concordo, mas eu tenho a legitimida­de”. Sem dúvida, o funcionári­o me pedirá desculpas.

Como sair do impasse? O jornal Le Monde espreme os miolos para ajudar a Espanha nessa situação extrema. O jornal lembra que a Escócia foi autorizada a organizar um plebiscito sobre sua independên­cia do Reino Unido. O resultado foi que os separatist­as escoceses, subitament­e privados de sua auréola de opositores românticos, foram derrotados. A Escócia continua a dormir docemente no leito da Grã-Bretanha.

Querem outra prova do fosso que separa a Catalunha de Madri? Há pouco tempo, atentados infames mataram inocentes em Barcelona. Toda a Espanha se indignou e chorou. Muitos acreditara­m que a solidaried­ade entre as duas cidades seria restabelec­ida. Mas, alguns dias mais tarde, quando os espanhóis marchavam em memória dos mortos do dia 17 de agosto, o rei da Espanha e o premiê Mariano Rajoy foram vaiados nas ruas de Barcelona.

Se Madri ceder, logo saberemos se a região separatist­a se engajará na aventura perigosa

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