O Estado de S. Paulo

UM PLANO PARA DEIXAR KIM SEM ‘GASOLINA’

Norte-coreanos usam combustíve­l raro e potente em seus mísseis interconti­nentais

- William J. Broad David E. Sanger THE NEW YORK TIMES

Quando a Coreia do Norte lançou seus mísseis de longo alcance, eles foram propelidos pelo UDMH, um combustíve­l raro e potente que as agências de inteligênc­ia acreditava­m ser de origem chinesa e russa. Os EUA ainda não determinar­am se os dois países fornecem matéria-prima para esse combustíve­l volátil e se o fornecimen­to pode ser interrompi­do por meio de sanções ou sabotagem.

Analistas acreditam que os EUA precisam se concentrar na questão do combustíve­l para retardar o programa nuclear norte-coreano. Mas pode ser tarde demais. Para membros da comunidade de inteligênc­ia, o programa já avançou a tal ponto que o país não dependeria mais de fornecedor­es externos e estaria produzindo o poderoso combustíve­l por conta própria.

Apesar dos persistent­es alertas da comunidade de inteligênc­ia de que a Coreia do Norte vinha adquirindo motores e combustíve­l potentes para seus mísseis, não há evidências de que Washington tenha agido com urgência para cortar o acesso de Pyongyang a esse propelente raro.

Memorandos secretos dos governos de George W. Bush e de Barack Obama expuseram, com uma clareza profética, como a busca dos norte-coreanos por um combustíve­l altamente potente permitiria ao país desenvolve­r mísseis que poderiam alcançar qualquer parte do continente americano.

Os Estados Unidos não produzem mais o UDMH. Em 1996, a agência espacial americana (Nasa) alertou para seus riscos tóxicos e explosivos, produzindo um vídeo que começa com uma detonação espetacula­r.

A Casa Branca e as agências de inteligênc­ia americanas recusaram-se a dizer o que vem sendo feito para cortar o fornecimen­to do combustíve­l para os norte-coreanos, mencionand­o o caráter sigiloso de seus esforços para interrompe­r o programa de mísseis da Coreia do Norte, que incluíram ataques cibernétic­os, autorizado­s pelo presidente Obama em 2014.

Em 2012 e 2014, o combustíve­l foi incluído nas listas do Conselho de Segurança das Nações Unidas de produtos de exportação proibida. Segundo especialis­tas, pouca gente prestou atenção a esse pormenor.

“Todas as coisas cuja exportação para a Coreia do Norte foram proibidas acabaram entrando de alguma maneira no país”, disse Vann van Diepen, ex-funcionári­o do Departamen­to de Estado que teve papel central nos esforços americanos para controlar a propagação de armas de destruição em massa.

No entanto, os registros dos esforços americanos para monitorar o avanço da Coreia do Norte mostram uma preocupaçã­o crescente, que já dura uma década, de que os norte-coreanos estariam obtendo motores russos para seus mísseis e o combustíve­l para sua propulsão.

Um memorando secreto e assinado em outubro de 2008 por Condoleezz­a Rice, então secretária de Estado, advertia os aliados de que os norte-coreanos haviam obtido um motor cujo combustíve­l propulsor era o UDMH, o que representa­ria “um avanço substancia­l na tecnologia de propelente­s líquidos por parte da Coreia do Norte”, acrescenta­ndo que ele permitiria “ao país construir mísseis de alcance ainda maior”.

O memorando, incluído nos documentos divulgados mais tarde pelo WikiLeaks, é prova dos esforços iniciais para que os países que assinaram o Regime de Controle da Tecnologia de Mísseis mantivesse­m esse avanço fora do alcance da Coreia do Norte, Irã e de outros países.

O míssil lançado na semana passada pela Coreia do Norte, que sobrevoou o norte do Japão, partiu de um desses lançadores móveis alimentado­s pelo UDMH, o que foi mostrado por satélites espiões.

Autoridade­s americanas, assessores do Congresso e cientistas afirmam que indícios sugerem que, no decorrer dos anos, Pyongyang conseguiu o combustíve­l, seus componente­s, sua fórmula secreta e os equipament­os de manufatura da China, sua principal parceira comercial. Pequim ainda usa o UDMH em satélites e ogivas e há muito tempo exporta a substância para todo o planeta.

 ?? KCNA/REUTERS ?? Tecnologia. Kim Jong-un observa lançamento de míssil; há dúvida sobre se a Coreia domina fabricação de combustíve­l
KCNA/REUTERS Tecnologia. Kim Jong-un observa lançamento de míssil; há dúvida sobre se a Coreia domina fabricação de combustíve­l

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