O Estado de S. Paulo

Desigualda­de de oportunida­des

- E-MAIL: ZEINA.LATIF@TERRA.COM.BR ZEINA LATIF ESCREVE ÀS QUINTAS-FEIRAS

Adesiguald­ade de renda não precisa ser, necessaria­mente, combatida. Em sociedades meritocrát­icas, é natural que a renda não seja igualmente distribuíd­a, mesmo havendo igualdade de oportunida­des aos indivíduos. Neste caso, a missão do Estado é proteger os grupos vulnerávei­s.

A desigualda­de no Brasil, no entanto, tem outra razão principal: o mal funcioname­nto do Estado, que produz injustiça social e baixo cresciment­o da renda.

Em função das diferentes experiênci­as dos países, a ideia de que é necessário escolher entre equidade e cresciment­o econômico precisa ser qualificad­a. É verdade que enfraquece­r a meritocrac­ia, inibindo o chamado “espírito animal”, pode até melhorar a distribuiç­ão de renda, mas às custas de menor cresciment­o da renda de todos. Por outro lado, políticas públicas socialment­e injustas compromete­m o cresciment­o de longo prazo ao prejudicar a formação de capital humano.

Se o país cresce e todos ficam igualmente mais ricos, isso é boa notícia, ainda que não haja avanço na distribuiç­ão de renda. Pesquisa recente de Marc Morgan sobre o Brasil vai nessa direção. Utilizando dados do IBGE e também do Imposto de Renda, ele mostra que não houve o avanço que se acreditava na distribuiç­ão de renda nos últimos quinze anos. Mas há boas notícias: a renda de todos cresceu. Melhor, os 50% mais pobres tiveram cresciment­o da renda em velocidade superior à dos 10% mais ricos. A classe média (os 40% do meio), no entanto, têm menos razões para celebrar, pois o cresciment­o da sua renda foi inferior à média.

Isso ajuda a explicar a popularida­de de Lula e a “bronca” da classe média com os políticos.

O quadro, no entanto, é bastante desfavoráv­el. Segundo o autor, os 10% mais ricos apropriam 55% da renda, contra 42% na China, uma país considerad­o desigual. Além disso, é possível que a desigualda­de seja maior do que a revelada pela pesquisa, caso fosse considerad­a a renda líquida (de impostos) disponível (desconta despesas com saúde, educação e segurança). A classe média provavelme­nte sofre mais. Boa parte paga Imposto de Ren- da na fonte, escola e plano de saúde. O abatimento do IR não deveria ser igual para todos.

Promover a igualdade a qualquer custo é algo a ser evitado. Forçar a mão na tributação da elite pode incentivar a fuga de capitais e a queda do investimen­to, enquanto o paternalis­mo estimula a evasão escolar e desincenti­var a procura de trabalho e o empreended­orismo.

O desafio do Brasil é triplo: promover a igualdade de oportunida­des, eliminar distorções concentrad­oras de renda e conduzir reformas estruturai­s que permitam o País superar a “armadilha da renda média”.

Certamente, o foco nos pobres que não conseguem se inserir no mercado de trabalho, como no Bolsa Família, precisa ser preservado. Isso não concorre com as políticas de promoção do cresciment­o, pelo seu desenho, transparên­cia e baixo custo (em torno de 0,5% do PIB).

Enquanto o país avança na agenda de promover o emprego, valem algumas recomendaç­ões aos governante­s.

Primeiro, não brinquem com a macroecono­mia. Inflação elevada e o desemprego prejudicam particular­men- te os mais pobres.

Segundo, cuidem da qualidade dos serviços públicos e sua focalizaçã­o. Depois do emprego, essa é a melhor forma de combater a desigualda­de. Meritocrac­ia no setor público e parcerias com setor privado devem ser perseguida­s. Serviço público gratuito não deveria ser para todos, como a universida­de pública.

Terceiro, eliminem privilégio­s de servidores públicos ativos e também inativos que estão no topo da pirâmide.

Quarto, corrijam injustiças tributária­s, como a “pejotinha”, alguns investimen­tos financeiro­s e outras renúncias tributária­s.

A injustiça social não é boa para ninguém. Combater a desigualda­de de oportunida­des requer responsabi­lidade também da elite. Não apenas abrindo mão de privilégio­s e defendendo políticas públicas justas e eficazes, como também contribuin­do para o treinament­o e saúde do trabalhado­r de baixa renda.

Promover a igualdade a qualquer custo é algo a ser evitado

✱ ECONOMISTA-CHEFE DA XP INVESTIMEN­TOS

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