O Estado de S. Paulo

Sem mágicas contra a dívida

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O Brasil é um dos campeões da dívida pública e o endividame­nto crescerá por vários anos.

OBrasil é um dos c a mpeões d a dívida pública e seu endividame­nt o ainda crescerá por vários anos, mesmo com o esforço de arrumação das finanças federais, mas o governo pode anunciar algumas boas novidades. O mercado tem sido muito receptivo aos papéis emitidos pelo Tesouro Nacional. O primeiro semestre foi “muito positivo” e o volume de títulos postos em circulação superou o planejado, segundo o coordenado­r de operações da dívida, Leandro Secunho. A colocação tem sido fácil mesmo com a redução de juros pagos aos credores da União. O custo médio do estoque da dívida total passou de 10,89% ao ano em julho para 10,62% no mês seguinte. Em dezembro de 2016 os encargos estavam em 12,02%. O custo médio das emissões da dívida pública mobiliária federal interna diminuiu 0,28 ponto porcentual também entre julho e agosto, para 11,1%.

Os encargos dependem de vários fatores. O mais importante é a credibilid­ade do governo. Mesmo em situações difíceis a colocação de papéis no mercado pode ocorrer sem grandes problemas, se a operação for considerad­a segura pelos tomadores dos títulos. Houve melhora nesse quesito, a partir da mudança de governo, em 2016, mas o crédito soberano continua em nível especulati­vo, na classifica­ção das maiores agências especializ­adas.

O crédito brasileiro está dois níveis abaixo do limite do grau de investimen­to, reservado aos países considerad­os seguros. Esse rebaixamen­to foi uma das últimas façanhas da administra­ção da presidente Dilma Rousseff. Mas tem sido possível diminuir o custo do estoque da dívida e baratear a rolagem dos compromiss­os.

A redução tem sido facilitada pelo corte da taxa básica de juros, a Selic. O Banco Central (BC) começou a reduzir a taxa no fim de outubro do ano passado. A partir daí a Selic passou de 14,25% ao ano para 8,25%. Mas esse movimento só foi possível porque a inflação, depois de um longo período de alta, havia começado a ceder de modo inequívoco. A queda dos juros básicos produziu efeitos em todos ou quase todos os segmentos da atividade financeira. Também as operações da dívida pública foram beneficiad­as por essa mudança.

Cortar os juros dessa dívida é uma proposta repetida com frequência no discurso econômico autointitu­lado progressis­ta. Na versão extremada, e mais irresponsá­vel, esse discurso pode pregar o simples e direto calote. Pregações como essas confirmam a irracional­idade de algumas posições e a incapacida­de de alguns grupos de aprender com a experiênci­a.

Reduzir juros de forma voluntaris­ta é uma tolice particular­mente perigosa, como já se observou no Brasil – tão perigosa como a ilusão de conter a inflação por decreto ou pela me- ra falsificaç­ão dos dados. Nenhum brasileiro envolvido no debate de questões públicas deveria desconhece­r esses fatos ou esquecer as penosas lições da realidade.

Mas a melhora das condições de administra­ção da dívida pública propicia apenas um alívio limitado. A ambição do governo, apoiada por qualquer pessoa informada e responsáve­l, tem de ser mais ampla.

Um dos objetivos centrais da política econômica, desde o ano passado, é conter o avanço da dívida pública para em seguida reduzir o peso do endividame­nto. Para isso será necessário voltar a produzir superávits primários nas contas públicas – saldos positivos no balanço de receitas e despesas do dia a dia. Só com esse excedente será possível pagar pelo menos uma parte dos juros vencidos em cada exercício.

Desde os anos finais do governo anterior isso tem sido impossível. Sem dinheiro para a liquidação dos juros vencidos em cada exercício fiscal, a dívida continuará a crescer. Em dezembro de 2016 a dívida pública federal estava em R$ 3,11 trilhões. Em julho deste ano chegou a R$ 3,34 trilhões. Em agosto, a R$ 3,40 trilhões.

Pelas projeções correntes, dificilmen­te haverá superávit primário antes de 2022. Até lá, o governo, seja quem for o presidente, terá de batalhar pela recuperaçã­o das finanças públicas. Um ajuste efetivo dependerá de reformas e a mais urgente é a da Previdênci­a.

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