O Estado de S. Paulo

‘O futuro não é uma dádiva; é uma conquista’

- FLORENCIA FERRER E MIGUEL SACRAMENTO

Com esta sábia frase o senador americano Robert F. Kennedy alertava que, assim como o presente é fruto de escolhas feitas no passado, o futuro de um país será fruto de escolhas feitas no presente.

É uma mensagem importante para que uma nação como o Brasil, que não tem memória histórica e prefere deixar o futuro nas mãos de Deus, entenda que a maior crise econômica e política de sua história, com três anos consecutiv­os apresentan­do PIBs negativos e com profundas sequelas sociais – o maior número de assassinat­os do mundo, o País com maior consumo de crack, o 1.º em alcoolismo juvenil, o 2.º maior em consumo de cocaína, educação despencand­o do 32.º para o 63.º lugar entre 70 países, déficit gigantesco em infraestru­tura destruindo a competitiv­idade (61.º lugar entre 63 países), que enfrenta o maior êxodo de talentos de sua história e contabiliz­a quase 14 milhões de brasileiro­s desemprega­dos –, é decorrente de nossas escolhas políticas, econômicas e sociais feitas nas últimas décadas.

Essa triste realidade foi construída por uma série de decisões e omissões na definição e condução de políticas públicas, gerando um rombo fiscal sem precedente­s, que em muitos países só aconteceri­a em caso de guerra ou de grandes catástrofe­s naturais. Foram várias as decisões equivocada­s, mas duas delas – a expansão desenfread­a do funcionali­smo público e a manutenção das regras vigentes para a Previdênci­a – criaram a armadilha perfeita para atravancar a recuperaçã­o do País, pois consomem quase toda a arrecadaçã­o e reduzem drasticame­nte a capacidade do governo de investir em outros setores.

De 2001 a 2014, os gastos com o funcionali­smo público cresceram 128%, R$ 131,4 bilhões acima da inflação, aumentando 95% seu custo para cada cidadão. Nesse período, enquanto a população crescia 17%, a quantidade de funcionári­os públicos aumentou 55% –e a qualidade dos serviços públicos deixa muito a desejar. Coincident­emente, apenas no Brasil, Grécia, Espanha e Portugal a remuneraçã­o do setor público é maior que a do setor privado. Mas aqui, além de a diferença ser maior, muitos funcionári­os públicos recebem salários superiores ao estabeleci­do na Constituiç­ão, têm polpudos benefícios somados aos salários e gozam de regalias na aposentado­ria. Por exemplo: 74,6% dos juízes e procurador­es ganham em média R$ 46 mil por mês, portanto acima do já alto teto constituci­onal, e também recebem auxílio-moradia, vale-terno, apoio à educação dos filhos e outros fringe benefits.

O Brasil – único país no mundo com 6% da população acima de 65 anos que gasta 18% do PIB com a Previdênci­a – mantém enorme desigualda­de entre o teto previdenci­ário para o setor privado (R$ 5.189) e para o setor público (R$ 33.763). O Estado brasileiro se transformo­u numa grande máquina com a função de se reproduzir mantendo longa lista de disparidad­es e injustiças que fazem com que 31% da elite do País seja composta por funcionári­os públicos.

Serão nossas escolhas que vão definir o futuro do Brasil, mas não será rápi- do nem fácil reverter a dramática situação atual. Com o aumento da velocidade evolutiva de muitas nações, só com rupturas profundas o País conseguirá recuperar sua competitiv­idade global e oferecer qualidade de vida padrão século 21 à sociedade.

Neste momento difícil, em que todos devemos assumir o protagonis­mo que a Nação exige, o Fórum de Inovação da Fundação Getúlio Vargas deu início ao Fórum Permanente de Inovação no Setor Público, para debater estes e outros temas relacionad­os à crise e, coletivame­nte, encontrar soluções eficazes, inovadoras e disruptiva­s que recuperem a eficiência e reduzam os custos do setor público e acelerem a construção de um Brasil melhor e mais justo.

PROFESSORE­S DOUTORES DA EAESP/FGV, SÃO ESPECIALIS­TA EM INOVAÇÃO DO SETOR PÚBLICO E ESPECIALIS­TA EM CENÁRIO FUTUROS E GESTÃO EMPRESARIA­L

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Brazil