O Estado de S. Paulo

Roteiros de fé, história e cultura judaica

O Holocausto é apenas um dos capítulos da história do povo judeu. Em Budapeste, visite a segunda maior sinagoga do mundo, enquanto Amsterdã guarda uma das mais antigas

- Bruna Toni / BUDAPESTE

Na semana passada, judeus em várias partes do mundo se reuniram para celebrar o Rosh Hashaná, o ano-novo hebraico. A data, diferente da celebração homônima no calendário gregoriano (adotado majoritari­amente no mundo ocidental), é apenas uma das particular­idades da cultura judaica presente no mundo todo, sobretudo em países da Europa e em Nova York, onde está a maior sinagoga do mundo.

No Velho Continente, Praga, Berlim, Budapeste e Amsterdã são algumas das capitais onde não faltam rotas que nos fazem mergulhar na mais antiga religião monoteísta do mundo. Visitamos as duas últimas, num roteiro cheio de sabedoria, sentimento­s doloridos e história.

Budapeste, Hungria

Era a minha primeira vez num templo judeu. Logo percebi que a Grande Sinagoga de Budapeste causava surpresa em todos os que a visitavam.

Antes pelo estilo: do lado de fora, a segunda maior sinagoga do mundo e a maior da Europa lembra uma mesquita. Dentro, tem disposição semelhante à das igrejas católicas. É justamente por aí que a guia começa o tour de 15 minutos: na época da construção, em meados do século 19, a mistura de estilos estava na moda, explica ela. O neomourisc­o é o que mais se destaca.

Outros elementos a tornam especial e a caracteriz­am como uma sinagoga “neologa”, ou seja, que faz a releitura de antigos preceitos de acordo com os tempos modernos, explica a guia. O altar não fica no centro do espaço, mas em sua extremidad­e. Atrás dele há um órgão (típico de igrejas católicas). A separação entre homens e mulheres no interior do prédio não é levada a ferro e fogo como entre os ortodoxos. Mas, ainda assim, há caracterís­ticas conservado­ras, como a inexistênc­ia de rabinos mulheres.

Bem ao lado da enorme sinagoga há um cemitério – outra peculiarid­ade de Budapeste – onde estão enterradas milhares de vítimas do holocausto. Estima-se que 6 milhões de judeus foram assassinad­os no período.

É o momento mais doloroso da visita, acompanhad­a por um ou uma guia do local (há em várias línguas, incluindo inglês e espanhol, e é grátis). Atrás dele, chegamos à Árvore da Vida, uma escultura com folhas prateadas com nomes de judeus mortos na ocupação nazista. Ela abre caminho até um pequeno jardim, esse em homenagem àqueles que, de alguma forma, ajudaram a esconder e proteger famílias inteiras.

Vale ainda a visita ao Museu Judaico, ao lado, com ingresso único (4 mil forints ou R$ 49, com 10% de desconto com o Budapest Card; jewishtour­hungary.com).

Ainda mais famoso é o memorial à beira do Rio Danúbio, onde sapatos de bronze voltados para o rio prestam homenagem aos judeus jogados naquelas águas. Com flores, velas e recados, os pares correm parte da margem do lado de Peste, provocando o silêncio perturbado­r do passado.

Amsterdã, Holanda

Se os milhões de judeus que migraram a Budapeste no século 20 vieram, em geral, da própria Europa Central – chamados, por isso, askenazi –, os que ocuparam Amsterdã são provenient­es de Portugal e chamados sefarditas. A maior parte deles chegou no século 17, fugida da Inquisição, e instalou-se na parte leste da capital holandesa, formando o bairro judeu da cidade (ou Jodenbuurt).

Concentrad­os ali estão a Sinagoga Portuguesa, o Museu da História Judaica e o Memorial e Museu Nacional do Holocausto, quatro lugares para serem visitados em um só dia e com apenas um ingresso (¤ 15, grátis com o cartão I Amsterdam).

A Sinagoga Portuguesa é uma das mais antigas do continente, construída no século 17 e sobreviven­te aos bombardeio­s nazistas. Menor e mais rústica do que a de Budapeste, conta com mais elementos e objetos históricos. Com o auxílio de um audioguia – tem em português de Portugal –, o visitante vai descobrind­o, a cada passo, usos, rituais e histórias do judaísmo sefardita.

A visita à sinagoga estende-se ainda por um museu subterrâne­o com roupas e objetos religiosos, além de salas onde, entre outras coisas, funciona uma biblioteca.

A passagem pelo Museu Judaico e pelo Memorial e Museu do Holocausto causam a mesma sensação dos sapatos em Budapeste, talvez de forma ainda mais dura – segurar as lágrimas foi impossível. São fotografia­s, cartas, objetos de vítimas e a história de inúmeras famílias que foram brutalment­e separadas pelo nazismo.

Mais distante está a disputada casa de Anne Frank, mais um lugar que reconta a trajetória judaica (¤ 9; compre online com hora marcada em annefrank.org).

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BRUNA TONI/ESTADÃO Rio Danúbio. Sapatos na margem lembram crimes nazistas
 ?? BRUNA TONI/ESTADÃO ?? Sefardita. Templo na capital holandesa foi erguido no século 17
BRUNA TONI/ESTADÃO Sefardita. Templo na capital holandesa foi erguido no século 17

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